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Car Culture

20 anos do Mercedes Classe A: a história do Baby-Benz

Há exatos 20 anos a Mercedes-Benz deu um passo tão surpreendente quanto ousado durante o Salão de Genebra de 1997: a marca apresentou um modelo subcompacto, diferente de tudo o que havia feito nos últimos 50 anos. Era o Classe A, um dos modelos mais controversos a receber a estrela de três pontas. Esta é sua história.

 

Apenas uma ideia futurista

A história do Classe A começa em 1982, com o conceito NAFA, um subcompacto urbano com dois lugares e um motor de três cilindros e 40 cv. Seu nome era a abreviação do termo alemão para “veículo de curtas distâncias” e, ainda que sua descrição pareça mais com a de um smart ForTwo, foi ali que surgiu a ideia de desenvolver um compacto para as cidades do futuro.

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Sim, nos anos 1980 e 1990 havia uma certa noção de que no futuro o público desejaria carros compactos para lidar com o trânsito e a falta de espaço das grandes cidades. Ironicamente hoje andamos com compactos gigantes e SUVs, mas isso não vem ao caso agora. O fato é que a Mercedes acreditava que precisaria de um compacto para o futuro, e que ele precisaria ser confiável, confortável e seguro como todos os seus modelos até então. O problema é que conforto e segurança e desempenho demandam espaço, algo escasso em um subcompacto.

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A solução? A mesma adotada pelas grandes cidades nas quais o compacto da Mercedes iria circular: verticalização. Da mesma forma que nós empilhamos casas, a Mercedes empilhou os componentes de seu compacto: motor, câmbio, bateria, suspensão traseira, tanque de combustível e escape ficaram no nível inferior. Acima deles restou espaço para um assoalho totalmente plano, sem túneis e reentrâncias para roubar espaço interno. O resultado deste layout foi o chamado “chassi sanduíche”, que era a base do conceito Vision A 93, o precursor do Classe A.

 

“Um Mercedes popular? Quero, por que não?”

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O Vision A 93 foi apresentado no Salão de Frankfurt no final de 1993. Ao apresentá-lo a Mercedes deixou claro que aquele conceito poderia se tornar um veículo de produção se o público o recebesse positivamente. E foi exatamente o que aconteceu: segundo a fabricante, 80% do público aprovou o carrinho, que até então tentava manter elementos estéticos da nova Classe C (W202) em vez de adotar um visual próprio.

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O conceito foi apresentado em três versões: duas delas equipadas com um motor de três cilindros inclinados (uma espécie de slant-3 transversal), um deles a diesel (com 60 cv) e outro a gasolina (com 75 cv). A outra era uma versão elétrica, com um motor de indução de 40 cv e um conjunto de baterias no “andar” de baixo do assoalho que lhe davam uma autonomia de 150 km.

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No ano seguinte o modelo recebeu algumas modificações e um novo nome, Studie A, e foi levado ao Salão de Genebra. A aceitação do público foi mais uma vez majoritariamente positiva e o conselho administrativo da Daimler AG deu o sinal verde para a produção do compacto.

 

O nascimento da Classe A

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A plataforma estava pronta, mas por ser diferente de qualquer outro carro fabricado pela marca, nenhum componente do novo modelo poderia ser compartilhado com os demais modelos produzidos na época — incluindo o motor e o câmbio. Os Mercedes tinham todos tração traseira ou integral, mas o novo modelo teria tração dianteira. O menor motor da Mercedes na época, o M111 de quatro cilindros, ainda era grande demais para o pequeno cofre do compacto.

Por isso a fabricante desenvolveu um motor inédito, o M166. Ele era inspirado nos motores de três cilindros do Vision A 93, porém a versão de produção teria quatro cilindros e deslocamento de 1,4 e 1,6 litro em vez de 1,2. Tal como os motores do conceito, o novo M166 era um “slant” transversal, com inclinação de 59 graus para a frente. Ele era todo feito de alumínio, com virabrequim forjado e bielas fraturadas e pesava apenas 91 kg. O câmbio também usava carcaça de alumínio e pesava apenas 30 kg.

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Depois havia a questão do visual do conceito. Inspirado na linguagem adotada no início dos anos 1990, ele já estaria envelhecido quando o carro chegasse às ruas em 1997. Por isso o gerente de design do grupo, Steve Mattin, se encarregou de traçar as novas linhas do compacto, que afastaram o modelo do visual de minivan altinha e lhe deram uma postura mais assentada — seu vão livre do solo era de apenas 15 cm. Além disso, com a dianteira mais baixa e o fundo parcialmente plano e um spoiler integrado à tampa traseira, o coeficiente aerodinâmico era apenas 0,31. Nada mau para um carro de 1,59 m de altura.

A Mercedes havia anunciado em 1993 que pretendia revolucionar o segmento dos compactos, e levou a sério a promessa. O monobloco do carro adotou materiais de alta resistência para obter a nota máxima de segurança nos testes da época. A direção usava assistência eletro-hidráulica para reduzir a carga sobre o motor. A carroceria usava policarbonato na tampa traseira e nos para-lamas dianteiros, o que ajudou a manter o peso baixo e bem distribuído. O câmbio dispensava o pedal de embreagem, usando atuadores eletro-hidáulicos. As versões mais luxuosas tinham teto solar panorâmico opcional e até catálogo de personalização Designo, com os mesmos materiais oferecidos para as classes C, E e S.

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Com tudo pronto, bastou oficializar o nome, que circulava na imprensa europeia desde 1995: Classe A.

No outono de 1997 o Mercedes-Benz Classe A foi levado ao Salão de Frankfurt e apresentado ao público pela primeira vez. Como já dissemos anteriormente, ele era diferente de tudo o que a Mercedes havia feito até então: foi o primeiro Mercedes com motor transversal, o primeiro Mercedes com tração dianteira, e o primeiro hatchback da Mercedes. Com tantas quebras de tradições, ele não poderia decepcionar na hora de enfrentar a realidade do Mercado.

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O visual agradou: a revista britânica Autocar concedeu a Steve Mattin o prêmio de designer do ano pelo desenho do Classe A. Os motores 1.4 de 82 cv e 1.6 de 102 cv se mostraram adequados para os 1.085 kg do carro. O acabamento agradou a imprensa europeia e o conforto era condizente para um carro com 2,42 metros de entre-eixos. Tudo parecia correr bem para o novo Baby Benz. Até que ele caiu nas mãos da revista sueca Teknikens Värld.

 

O fiasco do Alce e a volta por cima

Os suecos, como você sabe, têm problemas com alces e outros cervídeos atravessando suas estradas repentinamente e, por isso, a imprensa local desenvolveu um teste que simula a manobra de desvio emergencial. Como todo carro avaliado por lá, a revista Teknikens Värld submeteu o Classe A ao teste e… capotou o carro.

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Inicialmente a Mercedes afirmou que o problema era a calibragem dos pneus, mas o teste foi repetido na Alemanha e o Mercedes capotou mais uma vez. Diante do evidente problema, a Mercedes recomprou os 2.600 carros vendidos até então e suspendeu as vendas por três meses enquanto desenvolvia a solução.

Qual foi a solução? Reduzir o curso dos amortecedores e aumentar a carga da suspensão. Mas para reverter o marketing negativo causado pelo fracasso nos testes, a Mercedes ainda equipou o Classe A com toda a suíte de assistências eletrônicas ativas do Classe S — algo que normalmente aconteceria primeiro com o Classe E, depois com o Classe C e por último com o A. O pacote incluía controle eletrônico de tração e estabilidade (ASR e ESP), ABS com distribuição eletrônica da força de frenagem (EBD) e assistente de frenagem de emergência (BAS). De vítima fácil dos desvios, o Classe A se tornou o hatchback mais seguro de sua época, e o primeiro compacto a receber todas estas assistências eletrônicas.

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As três versões iniciais: Elegance, Avantgarde e Classic

A primazia, contudo, não veio de graça: a recalibragem da suspensão deixou o carro mais duro, algo que se tornou o principal alvo de críticas da imprensa na época.

 

A chegada ao Brasil

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No final de 1998 o Classe A desembarcou em São Paulo para ser apresentado no Salão do Automóvel. O modelo estava com sua produção confirmada em uma nova fábrica da Mercedes-Benz em Juiz de Fora/MG e seria vendido a partir de 1999 em duas versões: Classic e Elegance. A primeira, Classic, com acabamento de tecido nos bancos e portas e couro sintético e plástico no painel, rodas de aço com calotas, além de câmbio manual de cinco marchas. A Elegance, com intenções mais luxuosas, oferecia painel e volante com revestimento de couro, rodas de liga leve, rádio toca-fitas com disqueteira, câmbio semi-automático e bancos de couro opcionais.

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Interior da versão Elegance. O modelo brasileiro não tinha CD player no painel, e sim um toca-fitas com disqueteira

Ambos eram equipados com o motor 1.6 de 99 cv declarados — na época o IPI era definido por faixas de potência e carros com 100 cv ou mais pagavam uma alíquota maior. Quando a alíquota do IPI passou a ser baseada no deslocamento do motor do carro, em 2003, a potência subiu para 102 cv.

Um dos comerciais de lançamento no Brasil. O mote da campanha era “Você de Mercedes”, uma tentativa de mostrar que você não precisava ter a conta bancária da Classe A para ter um Classe A

Diferentemente do que aconteceu na Europa, no Brasil o Classe A dividiu opiniões. Por seu porte compacto — com 3,57 m ele era 5 cm menor que o Ford Ka de primeira geração! — o público esperava que ele custasse menos que os cerca de R$ 35.500 cobrados na época, equivalentes a R$ 91.000 em dinheiro de hoje.

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A Mercedes até se esforçou para emplacar o carro no Brasil. Além oferecê-lo nas concessionárias de carros de passeio ao lado dos importados, a fabricante também qualificou sua equipe para vendê-lo em algumas concessionárias de caminhões da marca, ampliando sua rede autorizada no Brasil sem precisar construir novas lojas.

Contudo, nem mesmo o pacote tecnológico, nem o motor 1.9 de 125 cv lançado em 2001 (que deu ao Mercedinho de 1.095 kg um desempenho digno de gente grande), ou a ideia de ter um Mercedes convenceu o público. A fabrica de Juiz de Fora tinha capacidade para construir até 70.000 veículos por ano, mas entre 17 de fevereiro de 1998 e 15 de agosto de 2005 foram fabricados exatamente 63.402 unidades do Classe A.

 

O sucesso na Europa

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No outro lado da Grande Lagoa, contudo, a história do Classe A foi diferente. Depois do fiasco do Alce o modelo decolou e até ganhou um facelift completo em 2002, que lhe deu novos para-choques, novos modelos de rodas e um acabamento interno mais refinado, com os mesmos materiais do Classe C da época (W203).

Naquele ano o Classe A também ganhou uma versão com entre-eixos alongado, que proporcionava mais espaço para os ocupantes do banco traseiro — e daria origem à Classe B em 2005 —, além de uma versão esportiva com motor 2.1 de 140 cv desenvolvida com ajuda da AMG (uma história que contamos aqui): a A210 Evolution.

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As duas carrocerias do Classe A oferecidas a partir de 2002

 

Cresceu e fez família

A produção europeia do Classe A foi encerrada em 2004, cerca de um ano antes da brasileira, e o Classe A ganhou uma segunda geração, a W169 e um irmão maior, o Classe B W245 para substituir o Classe A de chassi longo. Ambos mantiveram a estrutura “sanduíche” no chassi, e ganharam uma evolução do motor M166 batizada M266.

A família de motores incluía um 1.5, um 1.7, um 2.0 aspirado e um 2.0 turbo de 193 cv que podia ser combinado a um câmbio manual de seis marchas. O Classe A também ganhou uma versão de duas portas, o que reforçou a ideia de que ele era, de fato, um hatchback e não um monovolume ou uma minivan.

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Esta segunda geração também chegou ao Brasil, porém importada. A Mercedes trouxe 60 exemplares do A200 Elegance, todos equipados com câmbio CVT, e depois mudou o foco para o Classe B, mais adequado à demanda brasileira.

Em 2012 a Mercedes anunciou a segunda geração do Classe B e, dois anos mais tarde, o lançamento da terceira geração do Classe A. Desta vez como um hatchback convencional, com chassi simples, motor em linha sem inclinação e com direito a uma verdadeira versão esportiva assinada pela AMG. Mas essa parte da história você já conhece.