Neste mês de julho o Plano Real comemora 30 anos de existência. Instituído em 1º de julho de 1994, a nova moeda foi o ponto de partida para a almejada estabilidade econômica brasileira e pelo fim dos tempos de hiperinflação, que passou de 2.700% em 1993.
Nessa época, os carros usados eram mais caros que os zero-quilômetro devido ao ágio, e era praticamente impossível qualquer possibilidade de financiamento ou compra a longo prazo. Logo, qualquer bem de alto valor, mesmo que fosse um carro zero-quilômetro, era uma forma de investimento.
Por isso, a nova moeda ajudou também a impulsionar a venda de automóveis e a modernizar a frota brasileira — muita gente comprou seu primeiro carro, zero ou usado, depois de 1994. O gráfico histórico da Anfavea deixa isso claro: há um “boom” entre 1993 e 1999. Também foi o que atraiu novas fabricantes para o Brasil. Eles primeiro chegaram como importados para conhecer o mercado, e no fim da década decidiram que valia a pena se instalar por aqui.
Naturalmente, muita coisa mudou nesses 30 anos — o valor do próprio Real, inclusive. Por isso, vamos lembrar como era o mercado brasileiro naquele distante julho de 1994, ver os modelos mais vendidos, quanto eles custavam na época e quanto eles custam em Reais de 2024.
Os mais vendidos
Antes de falarmos dos mais vendidos, vamos relembrar o mercado nacional da época. Havia apenas quatro grandes fabricantes produzindo no Brasil — Fiat, Ford, GM e Volkswagen — e a opção de modelos não era tão variada como hoje. Eram basicamente duas famílias de modelos e uma linha de utilitários. Por isso, a lista dos 20 mais vendidos incluía praticamente todos os modelos produzidos no Brasil. Do popular VW Gol 1000 ao luxuoso Chevrolet Omega CD.
Mas naquele mês de julho de 1994, as versões populares dominaram o topo da tabela, ajudando a engrossar o número de vendas de seus modelos. Isso por que em 1993 o presidente Itamar Franco havia criado um programa especial para carros populares, que pagavam apenas 0,1 % de IPI e deveriam custar, no máximo, US$ 7.200 (US$ 15.650 em valores atualizados).
Assim, o carro mais vendido no primeiro mês do real foi o Volkswagen Gol, com 18.318 unidades, sendo 11.727 unidas apenas da versão 1000, que custava R$ 7.243 — o que dá R$ 58.524 em dinheiro de 2024.
O Fusca custava exatamente o mesmo, e apesar do projeto antiquado ele emplacou 1.709 unidades que o colocaram na 11ª posição do ranking geral e em quinto entre os populares. Apenas como comparação, o Voyage, que havia ganhado a versão quatro portas e a cultuada Sport, vendeu 841 unidades — menos da metade do Fusca.
O segundo carro mais vendido naquele mês foi o Fiat Uno, com 17.169 unidades das quais 15.822 eram as versões populares Electronic, de R$ 7.253 e ELX, de R$ 7.938. Quanto vale isso hoje em dia? R$ 58.605 e R$ 64.140.
Logo atrás veio o Ford Escort. Na época a Ford decidiu usar a geração anterior do modelo para fazer uma versão popular, o Escort Hobby. A versão correspondia a mais da metade das vendas do hatch médio da Ford: das 8.679 unidades vendidas, 4.399 eram Hobby, que custava R$ 7.386 com motor 1.0 e R$ 12.067 com motor 1.6 a gasolina. Em dinheiro de hoje, são R$ 59.680 e R$ 97.503, respectivamente.
O Chevrolet Omega Suprema CD era o mais caro dos nacionais com seu motor 3.0 e acabamento de importado. Sem opcionais ele custava R$ 48.076, mas podia chegar aos R$ 54.000. Isso significa que era preciso desembolsar o equivalente a R$ 388.464 para colocar o modelo básico na garagem, ou R$ 435.330 com o pacote de opcionais completo.
O sedã era um pouco mais barato — ou menos caro — e partia de R$ 26.712 (R$ 215.840 atualizado) na versão GL 2.0 a álcool, e podia chegar a R$ 46.739 (R$ 377.660) na versão CD 3.0.
Os importados
Os primeiros anos do Plano Real foram marcados pela valorização da moeda em relação ao dólar, resultado do câmbio controlado. No primeiro mês do real, a cotação do dólar ficou a R$ 0,93, em média. Com o nosso dinheiro valendo mais que o dólar — e uma pequena ajuda da redução do imposto de importação nos anos anteriores — os produtos importados inundaram o mercado brasileiro. Os carros, é claro, não ficaram de fora.
Em julho de 1994 o importado mais vendido foi o Fiat Tipo (ele só se tornaria nacional em 1996), oferecido inicialmente no Brasil somente com motor 1.6 injetado e nas versões de duas e quatro portas. Em julho de 1994 foram vendidas 2.736 unidades do Fiat, e ele não era exatamente barato: o modelo de duas portas custava R$ 17.000 e o de quatro portas saía por R$ 18.000 — mais que o dobro de um modelo popular. Em valores atualizados, são R$ 137.363 e R$ 145.445, respectivamente.
Outro importado que ficou com cara de nacional de tanto que vendeu foi o Golf GTI. Ele começou a ser trazido em 1993, ainda na época do Cruzeiro Real e da hiperinflação que chegou a mais de 2.700% naquele ano. Mas em 1994, custando R$ 27.900 (ou R$ 225.440 em valores de julho de 2024) ele se tornou o terceiro importado mais vendido, com 352 unidades vendidas.
Mas o importado que talvez melhor simboliza aquela época é o BMW Série 3 E36. Ele apareceu no Brasil nos primeiros anos após a abertura das importações pelo presidente Collor, mas foi a partir de 1994 que ele se tornou um sucesso de vendas — como qualquer busca em sites de usados pode confirmar.
Naquele primeiro mês da nova moeda, ele vendeu 202 unidades, o que pode parecer pouco hoje, mas lembre-se que estamos falando de um Brasil de 30 anos atrás. O modelo mais barato era o 318i Compact, que saía por R$ 47.770 (R$ 385.990 em 2024) e chegava aos R$ 87.400 (R$ 706.210) do 325i coupê automático. E se você tivesse grana de verdade, por R$ 117.000 (R$ 945.385) era possível levar para casa o M3.
Uma curiosidade: o mais caro dos importados oferecidos por aqui era o Rolls-Royce Corniche conversível, que custava nada menos que R$ 438.625, um número expressivo mesmo hoje em dia. Corrigido pelo IPCA-E, o valor equivale a R$ 3.544.180 em dinheiro de 2024.
Os esportivos
Em 1994 houve uma certa transição no mercado de esportivos. Os modelos consagrados como Gol GTi, Escort XR3 e Kadett GSi estavam na reta final de suas carreiras, e o mercado nacional começava a receber os importados por preços semelhantes, além de modelos com novas tecnologias como o Fiat Tempra Turbo de R$ 32.692 (R$ 264.160 em 2024) e o Fiat Uno Turbo de R$ 22.500 (R$ 181.800 em 2024), e o Vectra GSi, com seu motor 16v, de R$ 37.334 (R$ 301.660).
Mesmo assim, o Gol GTi saía por R$ 23.117 (R$ 186.790) — você podia levar o GTS por R$ 19.556 (R$ 158.016 — curiosamente próximo do valor do Polo GTS em 2024, que custa até R$ 155.440), mas não teria injeção eletrônica. O XR3 custava R$ 28.148 (R$ 227.441), ou R$ 39.474 (R$ 318.960) na versão conversível e era o rival direto do Kadett GSi.
O esportivo da GM era mais caro que o Ford na versão fechada — R$ 29.505 (R$ 238.400) —, porém mais barato na versão conversível, que tinha carroceria Bertone e custava R$ 38.614 (R$ 312.000).
E as picapes?
Em julho de 1994 tínhamos apenas dois segmentos de picapes novas no Brasil: as picapes pesadas, com carroceria sobre chassi, e as picapes compactas, feitas em monobloco e derivadas de carros de passeio — nossa especialidade.
Na época apenas duas fabricantes faziam picapes pesadas: a Ford, com a F-1000 e a Chevrolet com as linhas 10 e 20. Começando pelas versões diesel, no caso da Chevrolet, a D-20, que partia de R$ 34.261, equivalente a R$ 276.835 em 2024. Sua rival, a F-1000 diesel, era um pouco mais barata, e partia de R$ 32.190 (R$ 260.101).
No caso dos motores de ciclo Otto, os preços eram mais amistosos: uma Chevrolet C20 saía por R$ 22.100 (R$ 178.575) enquanto sua versão a álcool, a A20, custava R$ 21.608 (R$ 174.600). Mesmo a versão a álcool era mais cara que a F-1000 a gasolina (a única opção ao diesel na Ford), que partia de R$ 20.978 (R$ 169.500).
Já entre as compactas, as opções eram Fiat Fiorino Pick-up, Volkswagen Saveiro, Ford Pampa e Chevrolet Chevy. A mais barata delas era a Fiorino com o motor 1.0. Ela custava apenas R$ 8.969, que corresponde a atuais R$ 72.471. Depois dela vinha sua versão mais potente, a Fiorino 1.5 de R$ 10.300 (R$ 83.226). Logo acima estava a Pampa L 1.6, que saía R$ 10.427 (R$ 84.252).
A Chevy, apesar da idade do projeto, ainda custava R$ 11.000 na versão DL 1.6/S (correspondente a R$ 88.882 em 2024), o que a colocava exatamente entre a Pampa e a Saveiro, que partia de R$ 11.500 (R$ 92.922).
Os valores foram consultados em tabelas de veículos novos de julho de 1994 e foram corrigidos pelos índices IPC-A e IPCA-E do IBGE. Entre vários fatores, os índices estudam a relação entre renda média familiar mensal, o custo de vida e o gasto médio familiar mensal, portanto o valor dos carros corrigido acaba pareando o poder de compra das diferentes épocas.
Esta matéria é uma amostra do nosso conteúdo diário exclusivo para assinantes, e foi publicada sem restrições de acesso a caráter de degustação.
A sua assinatura é fundamental para continuarmos produzindo, tanto aqui no site quanto no YouTube, nas redes sociais e podcasts. Escolha seu plano abaixo e torne-se um assinante! Além das matérias exclusivas, você também ganha um convite para o grupo secreto (exclusivo do plano FlatOuter), onde poderá interagir diretamente com a equipe, ganha descontos com empresas parceiras (de lojas como a Interlakes a serviços de detailing e pastilhas TecPads), e ainda receberá convites exclusivos aos eventos para FlatOuters.