Os últimos três anos foram muito loucos no mercado automobilístico global – e isso vale para carros novos, usados ou clássicos. A paralisação da indústria, a quebra da cadeia de suprimentos, o aumento do custo do frete e dos insumos, tudo mudou muito e bagunçou a inflação, as estratégias comerciais e, consequentemente, os preços dos carros.
Isso, claro, sem contar as mudanças na legislação e o anseio ansioso pela transição para os carros elétricos. No fim das contas, os carros mudaram muito nos últimos dez anos e, estes três últimos, em especial, parecem ser um futuro “ponto de virada” na história do automóvel. Veremos em alguns anos.
A consequência prática disso é que o carro popular está prestes a desparecer de vez, os carros ficaram mais caros, mais parecidos e a oferta é menos variada, apesar de mais numerosa. Os preços dos carros novos subiram, puxando para cima os preços dos carros usados. A passagem do tempo transformou carros modernos em carros clássicos. Um carro de 20 anos, por exemplo, já tem um padrão atualmente aceitável de desempenho, conforto e segurança. Se você reduzir a idade para 10 anos, verá que esse prazo – outrora considerado “velho demais” – é mais aceitável atualmente.
E isso afetou também o preço dos carros antigos. Na prática, a janela dos 30 anos acabou diminuída para 20 anos – ou até menos, em alguns casos. Quando carros de 10 anos ainda são considerados para uso diário devido à alta dos preços dos carros novos e semi-novos, é natural que eles acabem custando mais caro. E é natural que os antigos ou “quase-antigos” acabem um pouco mais caros. Sendo direto: o carro “velhinho” ou “usadinho” será cada vez mais raro.
17 carros que você deveria pensar em comprar antes que valorizem
Isso significa que encontrar um modelo/versão que ainda não se tornou objeto de especulação está ficando cada vez mais difícil. Por outro lado, nenhuma especulação resiste à realidade dos anúncios empoeirados fazendo aniversário sem interessados, muito menos a dinheiro parado na forma de carro antigo.
Infelizmente esta é a realidade do mercado atualmente: a bagunça causada pela pandemia refletiu nos preços muito rapidamente na hora de subir por causa dos carros novos. O aumento dos novos refletiu rapidamente nos semi-novos, mas os usados demoraram um pouco mais para subir, assim como os clássicos.
Os preços já estão se ajustando à realidade do mercado — já dá para dizer que a bolha estourou na maioria dos segmentos. No caso dos clássicos, tudo ainda está muito caótico porque, de repente, tudo o que é relativamente antigo é encarado como algo que tem potencial de valorização. E assim até mesmo carros mundanos como o Chevette “quadrado” entraram em situação de especulação — daí veio o papo dos “pseudo-colecionáveis” no Podcast 94.
Isso já aconteceu antes, no primeiro boom dos carros clássicos, quando até mesmo os Fusca de séries regulares eram anunciados como “relíquias”, apesar das mais de três milhões de unidades produzidas no Brasil. Com a alta generalizada dos preços dos novos e semi-novos, os antigos entraram na onda, mas nem sempre com lastro na realidade. Ou seja: os preços subiram mais que a inflação, mesmo sem ter um aumento real na demanda ou uma diminuição da oferta.
Se antes da pandemia era possível encontrar carros antigos partindo dos R$ 15.000 ou R$ 20.000, agora, os clássicos mais aceitáveis partem dos R$ 30.000, o que é um aumento superior aos cerca de 20% da inflação acumulada nestes três anos (multiplique por 1,21 e você terá a atualização dos valores).
Não encare como malandragem dos vendedores. As coisas estão confusas mesmo. Pouca gente sabe o valor real do seu carro usado e o único jeito de descobrir é como todo preço é definido: você coloca o preço desejado e espera a reação do público. Se o carro estiver caro demais, ninguém vai se interessar. Se o carro estiver barato demais, haverá disputa — e foi por isso que eu acompanhei o leilão de clássicos no último final de semana: para ver preços que foram realmente pagos por carros clássicos, no mundo real. Até quanto os compradores estão dispostos a gastar por um determinado modelo?
Por que os preços dos carros usados não caíram se as vendas diminuíram?
Muitos anúncios ainda estão especulativos, então mesmo que pareçam fora do seu orçamento ou muito mais caros do que no passado, certamente haverá margens para negociação. Um indicativo de que um determinado modelo pode estar no alvo da especulação é a existência de muitos anúncios a preços muito próximos. Carros de grande volume tendem a ser menos valiosos — basta comparar os preços do Fusca dos anos 1970 aos do Fusca 1600S “Bizorrão”.
Para não endossar os valores anunciados, esta lista não irá mencionar os preços dos carros — no máximo uma faixa de preços médios que servem de referência para iniciar uma negociação. Dito isso, a seleção dos carros levou em conta todas as faixas de preços, uma análise da evolução do valor ao longo dos anos e, claro, apuração com o pessoal do mercado de clássicos. Aqui estão 7 modelos que você deveria dar uma olhada antes que eles valorizem:
Mercedes-Benz SLK R170 e R171
Sim. Eles estavam em nossa última lista e, felizmente, ainda não teve seus preços disparados no mercado de usados. Ainda é possível comprar um SLK de primeira geração em boas condições por menos de R$ 100.000, o que já não se pode mais dizer do BMW Z3 ou Audi TT (ou mesmo do Mazda Miata!).
Guia de Compra: Mercedes-Benz SLK R170 – o que saber antes de comprar?
Claro, ele não tem as qualidades dinâmicas do Z3, e tem um visual muito mais conservador, mas ele também envelheceu bem e ainda é acessível: por cerca de R$ 80.000 é possível comprar exemplares automáticos com quilometragem condizente com a idade e o tipo de uso. Os modelos manuais podem ser encontrados por algo nessa faixa, mas espere pagar um pouco mais de R$ 100.000 por eles.
Se você pretende passar dos R$ 100.000, pode ser uma boa dar uma olhada na segunda geração, a R171. Ela começou a ser oferecida em 2004 como modelo 2005, e parte dos R$ 120.000 nos modelos SLK200 Kompressor. A versão mais interessante, contudo, é a SLK350, que tem 272 cv e é anunciada por entre R$ 140.000 e R$ 180.000.
Audi A3 8L
A primeira geração do Audi A3 teve seu auge como usado no fim dos anos 2000 e início dos anos 2010. Depois disso ele foi relegado e deixado de lado por ter sido muito “sambado”, como diz a gíria paulista. Depois de ser extremamente popular e figurinha fácil nas ruas enquanto foi produzido no Brasil juntamente do Golf, ele acabou esquecido no mercado, desejado apenas pelos poucos fãs do modelo.
Audi A3/S3 Mk1: tudo o que você precisa saber antes de comprar | Guia de Compra FlatOut
Agora, passados quase 20 anos desde o fim de sua produção, dê uma boa olhada para ele e você verá que ele envelheceu bem (ao menos esteticamente) e pode ser um velhinho interessante de se ter para curtir –, sem contar que ele foi o primeiro Audi fabricado no Brasil, o que talvez ganhe algum valor histórico futuramente.
Não sobraram muitos em bom estado, mas você os encontra anunciados por entre R$ 30.000 e R$ 45.000 com câmbio manual e o compartilhamento de peças com o Golf Mk4 e outros Audi da época significa que ele não é impossível de se manter.
Dodge Dakota V6
As Dakota V8 já escalaram a montanha dos preços há algum tempo — tanto que elas sequer aparecem na lista dos carros de 2020. O histórico do mercado deixa claro: quando uma versão se torna muito desejada e valorizada, o mercado passa a voltar sua atenção para uma outra versão interessante daquele modelo. Se a Dakota R/T já bate os R$ 100.000, a Dakota Sport, com o motor V6, é o carro que já está entrando no radar de quem quer uma picape com potencial clássico.
Uma olhada rápida nos anúncios irá indicar carros na faixa dos R$ 50.000 — um valor bem mais alto do que há três anos, quando ainda se encontrava uma destas por R$ 30.000. São carros com pouca demanda devido ao consumo elevado — a manual até roda 7 km/l vazia, em percurso misto, mas a automática gosta de entornar gasolina com vontade. Além disso, picapes são mesmo menos valiosas que modelos de passeio da mesma marca e período — vide as Chevrolet C10 e C14 comparadas aos Opala cupê.
Chevrolet Chevette
O Chevette, que já teve três guias de compra aqui no FlatOut, é outro modelo acessível: esqueça o S/R, os GP e os modelos da primeira geração, que todos querem, e você encontrará dezenas de exemplares em bom estado anunciados por preços razoáveis. Lembre-se: o Chevette foi um carro extremamente popular nesta fase, então seu preço é naturalmente mais baixo que o dos anteriores. Eles servirão de referência para negociação, inclusive.
Nesta faixa de preço poucos carros oferecem uma experiência de condução mais purista que um exemplar bem-cuidado desta última fase do Chevette, já com o motor 1.6 S de 73 cv e o câmbio manual de cinco marchas.
Chevette “quadrado” 1983-1993: tudo o que você precisa saber na hora de comprar o seu
A culpa disso é do arranjo mecânico: um motor OHC longitudinal sobre o eixo dianteiro, tração traseira, duas portas, suspensão dianteira por braços sobrepostos e traseira com eixo rígido e molas helicoidais. Para completar um peso na casa dos 900 kg. Você já viu isso nos Alfa Romeo 105, não?
Chevrolet Caravan
A Chevrolet Caravan da segunda fase, com o facelift que a deixou com o visual dos anos 1980 — faróis retangulares, grade retangular, lanternas mais envolventes na traseira, interior de veludo e volante de borracha — pode ser encontrada por preços bem mais módicos que os
Encontrei exemplares em estado aceitável, com o motor 2.5 a álcool e a gasolina, na faixa dos R$ 30.000. Nessa faixa a maioria tem pequenos reparos a serem feitos, mas já te permitem voltar para casa rodando e dar os primeiros passos no mundo dos Project Cars corrigindo os itens não-originais.
Chevrolet Opala cupê 1980 -1988: tudo o que você precisa saber antes de comprar
Mas não são elas o foco por aqui, e sim os carros da faixa de R$ 40.000, que é onde você encontra exemplares com mais originalidade e melhor conservação — pintura ainda com brilho, motores com bom funcionamento, interior íntegro e conjunto óptico alinhado e bem conservado.
Volkswagen Passat
Esqueça as versões especiais e esportivas do Passat. O negócio aqui é focar nos LS de 1979 a 1982 — ou até mesmo no GTS 1982. Estes exemplares são os menos desejados e, por isso, tendem a ser o alvo de quem não quer pagar a valorização dos Passat mais antigos ou esportivos.
Guia de Compra Passat TS: o que saber antes de comprar o seu?
O preço subiu um pouco desde a última lista, mas ainda está longe dos mais valorizados. Você encontra bons exemplares na casa dos R$ 25.000, se não exigir muito da originalidade. Com um pouco mais de dinheiro dá para encontrar também os LSE em cores menos desejadas, ou ainda o GTS 1983, que não tinha quase nada do que faria os GTS famosos — começando pelo motor 1.6 — e, por isso, é menos valioso.