O que você faz quando não concorda com as decisões das autoridades em relação aos carros, ao trânsito e ao automobilismo? Vai pro Facebook reclamar que eles deveriam prender bandidos em vez de multar carros, ou faz alguma coisa para mudar? Esses australianos escolheram a segunda opção e deram uma lição de cidadania e uma prova imensa de amor pela cultura automotiva.
O que eles fizeram foi reunir o maior número de fãs de carros e automobilismo possível e simplesmente fundaram um partido político. Sério. Aqui no Brasil costumamos pensar em partidos políticos somente como instituições tradicionais movidas por ideologias sociais ou econômicas de esquerda ou direita, mas no restante do mundo – especialmente nos países desenvolvidos, é comum que movimentos sociais se registrem como partidos políticos e disputem eleições para atingir seus objetivos.
Tudo começou quando os estados australianos instituíram leis rígidas anti-hooning. Até aí tudo bem, é uma forma de controlar motoristas sem limites. O problema é que as leis foram ficando cada vez mais restritivas e abrangentes a ponto de permitir a apreensão de carros que “praticassem velocidade ou ruído excessivo” (como esticar uma marcha em um carro com escape modificado e/ou esportivo) e até mesmo simples modificações, como a alteração das rodas originais. Em , é possível encontrar casos de carros originais que foram apreendidos pois “pareciam” modificados.
Como bons cidadãos todos aceitaram imposição da lei, mas em vez de atacar policiais e reclamar que o país é uma porcaria, eles se uniram para criar um partido político. Segundo os fundadores do partido “os direitos e as liberdades civis dos cidadãos australianos vinham erodindo em níveis cada vez maiores por meio de leis que afetam diretamente a cultura automotiva, sem que a comunidade fosse consultada a respeito dessas mudanças”. Um argumento bem fundamentado, uma vez que os governantes democráticos devem trabalhar para o povo, em benefício da sociedade, e naturalmente isso envolve ouvir os apelos dos cidadãos. A intenção é clara: mostrar aos governantes que os entusiastas não são uma “minoria” como poderia parecer.
Assim, em 11 de maio de 2013 (AMEP, algo como “Partido Australiano Entusiasta do Automobilismo”) foi registrado no órgão análogo ao nosso Tribunal Superior Eleitoral, com direito a comitês em cada um dos seis estados do país. Com a representatividade política oficializada em forma de partido, os entusiastas ganharam força para negociar diretamente com os legisladores, agregar afiliados para influenciar nas eleições e até lançar candidatos a cargos eletivos.
Foi exatamente o que eles fizeram logo ao final de seu primeiro ano: nas eleições federais de 2013, o AMEP negociou seu apoio com candidatos em cinco dos seis estados da Austrália — New South Wales, South Australia, Queensland, Victoria e Western Australia — além de lançaram um candidato próprio a uma das 76 cadeiras do Senado australiano.
Surpreendentemente, o candidato do partido, Ricky Muir — um tapeceiro automotivo e customizador de carros —, foi eleito senador e assumiu o cargo em 1º de julho de 2014. Agora, com um representante no senado, o partido também formou coligações com outros partidos menores.
Obviamente o partido não trabalha para legalizar o hooning e abolir os limites de velocidade e obrigar o aprendizado de burnouts nas auto escolas. O partido se envolve em temas que vão da preservação do automobilismo à segurança viária, passando pela indústria automotiva e questões de trânsito e transportes.
Mas muito além da representatividade dos fãs de carros, o maior feito do partido até agora talvez tenha sido elevar a debate político a discussão sobre carros, trânsito, transportes e a cultua automotiva em geral, para que ela seja tratada com a seriedade necessária.