O Dodge Dart é o muscle car* americano mais brasileiro que existe. Lá fora ele era o irmão menor e mais barato do full size Charger (plataforma B-Body contra a mais compacta A-Body do Dart), mas no Brasil ele foi a base para todos os modelos de Dodge V8 encontrados no nosso mercado. É um carro carismático e que marcou a história de nossa indústria, sem dúvida.
Vendido de 1969 a 1981, o Dodge Dart deu origem ao esportivo Charger R/T e aos requintados Magnum, Gran Sedan e Gran Coupé, mas também conquistou muita gente em sua forma original. E foi simplesmente como uma homenagem ao Dart e sua bem sucedida trajetória por aqui que decidimos relembrar algumas de suas versões mais bacanas, especialmente nos Estados Unidos.
Mas vamos começar com algo bem brasileiro, pode ser?
* antes que se comece o “é pony car!”, leia nosso dicionário muscle car, por gentileza 🙂
Dodge Dart SE
Não havia como o primeiro representante desta lista não ser “nosso”. Lançado em 1971 como modelo 1972, o Dodge Dart SE foi uma maneira esperta de transformar um carro barato e depenado em um carro descolado e desejável. O essencial, ele tinha: um V8 318 LA, o coração americano do qual os dojeiros se orgulham (com razão) até hoje. O resto era perfumaria.
A ideia era atrair os jovens solteiros, que não tinham grana para um Charger R/T. A ideia era simples: lavador de para-brisa? Acabamento cromado? Câmbio automático? Isso é para quem já passou dos trinta, cara. Ar-condicionado é para gente fresca: o interior tinha bancos xadrez com encosto elevado, volante de três raios e câmbio no assoalho. Freios a disco na dianteira eram opcionais – quem quisesse adrenalina de verdade (e não tivesse grana) teria de domar só com freios a tambor os 198 cv brutos do V8. Brutos como o Dart SE.
Foto: Juliano Barata
E deu certo – o pessoal comprava o Dart SE por um preço mais em conta e deixava para equipá-lo quando tivesse mais dinheiro. E é por isso que os exemplares originais são tão raros e valiosos hoje em dia. De vez em quando um felizardo topa com um Dart supostamente De Luxo e descobre em sua plaqueta que se trata de um SE: hoje, o mais simples virou o mais cobiçado.
Dodge Dart Hang 10
Nos Estados Unidos o Dart era o compacto da Dodge nos anos 70, e sempre recebia versões com apelo jovial. O Dodge Dart Hang 10, de 1973, segmentava ainda mais a coisa toda ao ser feito para agradar os surfistas.
O termo hang ten vem do surfe, como você deve ter deduzido, e é o nome de uma manobra na qual o surfista posiciona a prancha de modo a conseguir se equilibrar (hang) com os dez dedos dos pés no nariz da prancha. Normalmente esta manobra é realizada com um longboard, uma prancha mais longa e pesada.
Apresentado primeiro no Salão de Chicago em 1973, o Dart Hang 10 era pintado de branco com adesivos de um carinha surfando nas laterais, interior com carpete laranja avermelhado e bancos de vinil branco com listras coloridas, assim como os revestimentos de porta. O banco traseiro era rebatível, e assim era possível acomodar uma prancha de surf curta, ou shortboard, mais um cooler e cadeiras de praia. Ironicamente, não se costuma fazer o hang ten em uma prancha curta…
O motor era o mesmo V8 de 318 pol³ (5,2 litro) usado pelo Dart nacional, acoplado a uma caixa automática de três marchas. Fizeram cerca de 700 exemplares do Dart Hang 10 entre 1974 e 1975.
Dodge Dart Convertriple
Da mesma safra “criativa” da Dodge vinha o Dart Convertriple, anunciado como “três carros em um”: um compacto barato, uma alternativa aos conversíveis por causa do teto solar de metal, e uma alternativa às peruas graças ao amplo porta-malas e ao banco traseiro rebatível. Sim, era exagero – para começar, ele sequer era um conversível…
Mod Tops
Já falamos dos Mod Tops aqui no FlatOut, no Dicionário Muscle Car Parte 2, mas não custa relembrar. Inspirados pelo espírito do flower power, os Mod Tops eram revestimentos de vinil com padrões florais psicodélicos em cores vibrantes, disponíveis como opcionais para alguns modelos da Chrysler em 1969 e 1970.
O mesmo revestimento do Dart, visto em um Plymouth Superbird
Entre eles estava o Dodge Dart. Equipado com o Mod Top, ele recebia vinil com estampa floral verde, carroceria verde “Rallye Green” e interior de vinil preto. E ele era igualzinho ao Dart vendido no Brasil – aí vai uma ideia de customização para quem tem saudade da geração paz-e-amor…
Havia três opções de cores (amarelo pastel, verde e azul berrante, verde e azul em tons pastéis). Se no Dart a estampa ficava restrita à capota externa, em alguns outros modelos, como o Plymouth Barracuda, o vinil revestia o teto, os painéis internos das portas e a seção central dos bancos, acompanhado de um adesivo com a grafia “MOD TOP” em cada uma das janelas laterais traseiras.
Dodge Dart GTS 440
Em 1967, o recém lançado Dodge Dart de quarta geração tinha tudo para ser sucesso nas arrancadas e nas ruas, pois era compacto (reforçando: para os padrões americanos), estiloso e barato. Só lhe faltava uma coisa: um motor grande de verdade. A Dodge percebeu que havia cometido um pequeno engano ao jamais preparar o cofre do Dart para receber motores big block, e decidiu dar uma forcinha a quem andava colocando o motor Magnum 440, um monstro de 7,2 litros e 380 cv. Como? Fazendo eles mesmos o swap.
Ou melhor, mandando fazer. Os carros eram enviados para a Hurst sem motor, e o pessoal da preparadora realizava a conversão. Os carros tinham o cofre reforçado e parte do cofre retrabalhada para acomodar o motorzão – e perdiam a garantia de fábrica.
Isto porque na verdade o Dart GTS 440, como a versão foi chamada, jamais foi criada para uso nas ruas. A ideia era que eles fossem da concessionária direto para a pista, ajudando o modelo a ficar reconhecido como monstro dos quartos-de-milha. Dizem que a potência de 380 cv era uma estimativa conservadora, sendo na prática ainda mais próxima dos 400 cv. Com transmissão automática de três marchas TorqueFlite 727, o Dart GTS era capaz de cumprir o quarto-de-milha em menos de 14 segundos a 173 km/h sem qualquer modificação.
No total, estima-se que 650 carros tenham sido feitos pela Hurst até 1969. Destes, 80 tiveram a honra de se tornar algo ainda mais especial.
Hemi Dart
O Hemi Dart foi uma série especial concebida pela Dodge em 1968, especialmente para pilotos de arrancada. Naquele tempo os muscle cars estavam em seu auge, e seu desempenho no quarto-de-milha influenciava diretamente o desempenho no showroom das concessionárias – o famoso win on Sunday, sell on Monday. O carro foi feito em parceria com a Hurst, e a ideia era encaixá-lo no regulamento das categorias SS/A e SS/B (“SS” quer dizer “Super Stock”) da NHRA, a National Hot Rod Association, responsável por organizar a maioria dos campeonatos de arrancada americanos.
A estratégia da Dodge era simples: vender a pilotos e equipes independentes um Dodge Dart praticamente pronto para disputar arrancadas a um preço acessível. Os carros vinham sem pintura, tinham para-lamas e capô de fibra de vidro, sendo que a parte interna dos para-lamas traseiros era cortada. As portas não tinham as máquinas dos vidros e o revestimento era uma simples chapa de metal. Os bancos dianteiros eram mais leves, e o banco traseiro foi eliminado. Até mesmo os vidros eram mais finos, fabricados pela Corning Glass – a mesma que faz as telas do iPhone.
A dieta deu resultado, e o Hemi Dart se tornou um peso-pena entre os muscle cars, com cerca de 1.360 kg. Para se ter uma ideia, um Dart GTS, carro no qual o Hemi Dart era baseado, pesava mais de 1.600 kg.
Não tão leve assim era o motor: o V8 de 426 pol³ pesava 382 kg quando totalmente seco. E não foi fácil instalá-lo no cofre: os suportes e a travessa tiveram de ser reprojetados, a face interna do para-lama do passageiro era rebatido (em bom português, vinha amassado de fábrica, pois o trabalho era feito à moda antiga) e o capô não fechava. Daí veio a ideia para o scoop, que também melhorava a admissão de ar fresco para os carburadores. A vista sinistra que você tinha ao encarar um Hemi Dart de frente era quase uma consequência.
O V8 ainda era acoplado a uma transmissão reforçada TorqueFlite, automática, ou a uma caixa Hurst manual de quatro marchas. O diferencial (um Dana 9 3/4) tinha relação final encurtada para 4,88:1, priorizando arrancadas, e o resultado era um desempenho intoxicante: o quarto-de-milha era cumprido em apenas 11 segundos, a mais de 210 km/h. Com pneus drag de época!
Dodge Dart GSS 440
Enquanto a Dodge não disponibilizava um motor grande de verdade no Dart, um dos caras que fizeram tudo por conta foi Norman Kraus, proprietário da concessionária Grand Spaulding Dodge, que ficava em Chicago e era conhecida por também atuar como preparadora. Para se ter uma ideia, a Grand Spaulding Dodge foi uma das primeiras concessionárias a ter seu próprio dinamômetro, que era usado para demonstrar a potência extra que seus serviços davam aos carros dos clientes — normalmente Mr. Norm testava o carro no dinamômetro junto com o dono antes e depois das modificações. Por esse tipo de coisa, ele ficou conhecido como King of Hi Performance.
Descontente com a falta de um motorzão no Dart, Mr. Norm decidiu encomendar 50 exemplares do Dodge Dart GTS com motor 383 e instalar nele o motor Magnum 440, com todos os seus 380 cv. Mr. Norm e sua equipe desenvolveram todas as adaptações necessárias. Foi preciso reduzir o tamanho do cárter, modificar a travessa inferior (K-member) e dar algumas marteladas na parte de dentro dos para-lamas.
A cereja do bolo era rebatizar o carro como Dart GSS, de Grand Spaulding Special. O carro ganhava emblemas especiais mas, no mais, tinha visual externo idêntico ao de qualquer outro Dart GTS, certamente deixando muita gente enfurecida nos pegas de semáforo. A receita ficou tão boa que a própria Dodge decidiu lançar o Dart GTS com motor 440 em 1969. Hoje, os GSS são carros valiosíssimos.
Dodge Dart sedã duas-portas
A quarta geração do Dodge Dart nos EUA foi a que veio para o Brasil em 1968. Por lá, ela foi lançada um ano antes, em 1967, com uma opção de carroceria inusitada: sedã de duas portas.
Claro, sabemos que no Brasil os sedãs de duas portas foram mais populares que os de quatro portas até meados dos anos 90. Mas nos EUA esta opção não fazia tanto sentido. O Dart sedã de duas portas era 90% igual ao cupê, porém com o caimento do teto um pouco menos suave e com uma coluna “B”, algo que o cupê não tinha.
Talvez o motivo fosse a tradição. O primeiro Dodge Dart era um carro grande, lançado nos Estados Unidos em 1959, e na época os sedãs de duas portas eram carros bem comuns por lá. De qualquer forma, o fato é que a presença da coluna B deixava o monobloco do Dart mais rígido, e por isso muita gente gosta de usar os sedãs de duas portas para aplicações de arrancada. Curiosamente, o ano de 1967 foi o último da carroceria sedã duas-portas, que deixou de ser oferecida para 1968.
Dodge Dart Demon
Antes do Challenger SRT Demon, veio o Dart Demon. Ele era, na prática, uma versão rebatizada do Plymouth Duster. Duster, por sua vez, era o nome que a Plymouth havia escolhido para o Valiant com carroceria cupê fastback, que estreou em 1970. E o Valiant, que foi lançado em 1967, era o Dodge Dart (que havia sido lançado um ano antes) rebatizado como Plymouth.
O Dodge Demon se diferenciava do Plymouth Duster basicamente pelos para-lamas e grade dianteiros e pelas lanternas traseiras, que traziam seis elementos verticais em vez de dois elementos horizontais. Em relação às outras versões de carroceria do Dart, ele tinha entre-eixos mais curto, com 2,74 m em vez de 2,82 m; e o caimento do teto mais suave (afinal, era um fastback).
Ele era oferecido em duas versões. A básica podia ser equipada com dois motores diferentes: um seis-em-linha Slant-6 (parecido com aquele encontrado nos curiosos Dodge argentinos) de 198 pol³ (3,2 litros) e 125 cv (potência bruta, sempre), ou um V8 318 de 230 cv muito semelhante ao que foi oferecido no Brasil.
Já o Dodge Demon 340 era a versão que interessava: o motor era um V8 de… 340 pol³ (5,6 litros) com carburador de corpo quádruplo e 275 cv. Era, em essência, um 318 com diâmetro ampliado de 99 mm para 102,6 mm, enquanto o curso dos pistões permanecia em 84 mm. Os cabeçotes também eram muito melhores e o comando de válvulas mais bravo. Com isto, conseguia-se um motor mais girador e de funcionamento mais suave.
Com o 340, o Dodge Demon era capaz de chegar aos 100 km/h em 6,9 segundos declarados, com máxima de 208 km/h. Era o suficiente para que a companhia o anunciasse como seu muscle car mais acessível. Na prática, testes da época atingiram os 100 km/h em pouco menos de oito segundos. O quarto-de-milha era cumprido em 14,56 segundos a 154,5 km/h.
O Dodge Demon 340 também tinha outros diferenciais. A suspensão era batizada Rallye, com barras de torção, barra estabilizadora, molas traseiras e amortecedores reforçados. De série, o câmbio era manual de três marchas com alavanca no assoalho, com opção por um câmbio manual de quatro marchas ou uma automático Torque Flite, também de três marchas. Já os freios usavam tambores maiores (10×2,25 polegadas na dianteira e 10×1,75 polegadas na traseira) e as rodas eram de 14×5,5 polegadas.
A ideia era que o Demon fosse uma versão barata e de apelo esportivo. Por isto, eram oferecidos opcionais como teto revestido com vinil, console capô preto e scoop para o motor. De início, o Dodge Demon seria chamado de “Beaver”, mas a Chrysler desistiu do nome quando descobriu que beaver era uma gíria para “vagina” entre os entusiastas do rádio amador (PX, como se conhece no Brasil).
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