Olá pessoal, meu nome é Thiago Moreno, jornalista e morador de São Paulo/SP. Sim, foi dessa maneira que eu conheci a galera do FlatOut e não, não foi por causa disso que meu carro entrou no Project Cars. Quando abriram-se as vagas, eu me candidatei no maior espírito da zoeira sem limites e com muito mais ideias na cabeça do que meios para completá-las.
Pré-história
Se você põe a mão na graxa, evita carro prata e não pensa e revender seu veículo a cada dois anos, além de ser erroneamente mal visto pela sociedade consumista (PCdoB curtiu isso), parabéns antes de mais nada. E provavelmente todos nós temos um início de “carreira” automotiva comum: veio de nossos pais, parentes, vizinhos, qualquer um que já gostava de carro antes de nós. Comigo não foi diferente e meu pai teve de tudo: Fusca, Kombi, Brasília (duas!), Passat, Voyage, Escort XR3 (saudades), Chevette, Gol batedeira e Escort Zetec (1.6 e 1.8). Isso sem contar as motos, que ele poderia ter aberto uma concessionária de tantos modelos que teve. E como meu pai é daqueles que desmonta o carro e faz a limpeza com pincel, não dava pra não curtir carros, não é mesmo?
Eu particularmente comecei com motos: aprendi a andar numa RD 135 1989 do meu pai (essa sim, saudades mesmo), mas quis comprar uma própria, pra trabalhar e estudar. Acabei optando por uma Suzuki Intruder 125 (doravante chamada de PC 204b) que recomendo a qualquer um que esteja aprendendo. Manutenção simples e motor econômico. Pouco depois, com o dinheiro que herdei de um tio que faleceu num acidente de moto (é, foda…) comprei uma Harley Sportster 883 R (PC 204c).
Entre uma moto e outra, fiz o que muitos classificaram como a pior cagada da minha vida: comprei meu primeiro carro e ele era um Fiat Tempra. Mas pensem comigo: 1995, 2.0 8V com injeção monoponto; 110.000 km rodados na mão de um tio-avô, o primeiro dono; ar, direção e trio elétrico; e… R$ 7 mil reais. Nem pensei na fama de bomba dele. Foram quatro anos de pura alegria com carro, mesmo tendo gastado mais que o valor de compra entre retífica e funilaria.
Era 2011, eu mal tinha sido efetivado no trabalho e já tinha a 204b, a 204c, o Tempra e uma Caloi 10. Mas comecei a pegar gosto pela história da Gurgel e decidi que iria ter um, e tinha que ser um BR-800. Um belo dia meu pai me liga falando que tinha visto um à venda e, apesar dos gritos da minha mãe no fundo dizendo o contrário, comprei o 204d. Mais R$ 7 mil para o ralo.
2012, resolvi que, enquanto jornalista automotivo, era uma enorme falha de caráter e falta de ética profissional nunca ter dirigido um Fusca na vida. Comprei, claro. Um 1975 STD 1300 na maldita cor Bege Alabastro, mas, ei, por R$ 4 mil você não escolhe a cor, não é mesmo? E esse é o PC 204e, codinome Ninho. Qualquer referência à marca de leite em pó é mera intenção.
Aí, com três carros, duas motos e uma namorada alguém tinha que sair, até porque tínhamos comprado um apartamento que, além da dívida, tinha só duas vagas de carro. E não foi o maior Burnout que ela viu na vida. O Tempra tinha que ir, afinal, como faz parte do meu emprego avaliar carros novos quase que semanalmente, não iria sentir falta de um automóvel moderno. O Temprão foi até estrela do Achados Meio Perdidos no finado Jalopnik BR. Vendi o carro a muito contragosto e pesar, mas foi para um amigo da namorada, que aceitou dar R$ 9 mil pelo carro numa ação que considerei ser um milagre direto do Deus da Velocidade.
Moral da história: não aguentei três meses antes de querer outro carro. De mudança, praticamente casado e com filhos nos planos, pensei em algo que milhares de famílias não pensam: “vou comprar uma perua”, e não “vou comprar um SUV de $90 mil”.
A história tá longa? Ainda nem começou.
Eu queria uma Escort SW, mas como diabos acabei com uma Parati?
Os dois Escort que meu pai teve (um 1998 GL 1.8 duas portas e outro 2002 GL 1.6 quatro portas verdefolhalindomaravilhoso) foram os melhores carros que ele já teve na vida, sem dúvida. Então minha perua logicamente seria uma Escort SW. Mais de 50 anúncios clicados, 15 que chamaram mais a atenção, oito visitados pessoalmente e uma certeza: estava na roça.
Vi de tudo: carros com sinais acidente, funilaria mal feita, acabamento interno em mal estado, marcha lenta instável, comando de válvulas com pedido de aposentadoria atrasado. Sem brincadeira, o melhor que eu vi foi uma 1998 parada há dois anos – com teia de aranha embaixo e mofo dentro – e foi a única que tinha um motor minimamente aceitável. Eu não sei por que nenhuma Escort SW estava decente, mas foi o que eu enfrentei.
Nesse meio tempo, meu mecânico de confiança (aquele que levou meus R$ 4 mil para retificar o motor do Tempra — mas o serviço ficou muito bom) avisou meu pai que ele tinha uma Parati quadrada a venda. Ela não tinha nada do que eu realmente queria, nominalmente ar-condicionado e cinto de três pontos na traseira, e estava no limite do meu orçamento (R$ 10 mil).
E pela foto do nosso primeiro encontro, eu devia ter virado as costas naquela hora. Devia, devia mesmo, meu deus porque eu não fiz isso?!
E assim nasceu a Valquíria, a Parati preta do crime
Walkyrie, crime’s black Fox Estate / Valquíria, la Gol Country preta de la criminalidad
Disclaimer: Eu conhecia a fama vileira manolizada dos AP quadrado, só não achei que aconteceria comigo
Após ter feito a cag… digo, a compra, chegou a hora de começar a deixar a PC 204a do jeito que eu queria. Naquela época significava totalmente original. Só que naquela época eu achava que quem decidia isso era eu, não o carro. Ledo engano.
Só para explicar, fiz um pouco de arqueologia porque algo sempre me intrigou na Valquíria. Apesar de ela ser 1995/96, com nota fiscal assinada em fevereiro de 1996, ela era quadrada e foi vendida numa época em que já havia a bolinha. Além disso, ela é modelo CL (pelada) de documento, mas saiu de fábrica com direção hidráulica, ar-quente, limpador e desembaçador traseiro, regulagem interna dos espelhos, racks de teto, parabrisa degradê e banco traseiro bipartido. Então o fulano foi de vontade própria na VW e pegou de propósito uma quadrada ao invés de uma bolinha bem mais moderna e ticou todos os opcionais possíveis. Por quê?
Uma conversa com um camarada que trabalha na Volkswagen depois me elucidou: naquela época era bem comum as últimas unidades de um determinado produto saírem extremamente equipadas para limpar os estoques e eram oferecidas a preços mais em conta, o que pode explicar a escolha. Só podia ser algo melhor de cor que esse “Preto Universal”, mas ok.
Hora de botar a mão na massa: troquei os limpadores de parabrisa tirei as cansadas calotas substituindo-as por novas, mais condizentes com um carro de família, e tirei aquelas aberrações que chamam de insul-film. Também troquei os piscas dianteiros que estavam trincados. Aí veio a primeira surpresa boa que só dono de carro (bem) velho conhece: o pisca é preso na carcaça do farol. No caso do meu carro, um era Cibié e o outro Arteb. Os dois têm o mesmo encaixe? Nããão. Eu sabia disso? Nãããão. Tive que fazer duas viagens? Siiiiim. Foi assim que eu aprendi a tirar a peça velha antes de comprar uma nova.
Aí finalmente o carro estava pronto pra começar a andar. E ainda tinha a promessa do ex-dono mecânico de que “se der qualquer problema traz aqui que eu arrumo”, coitado. Vamos à lista: o excelentíssimo carburador Weber TLDZ (corpo duplo, afogador automático) estava ruim de partida a frio, TODAS as buchas de suspensão estavam sem condições de rodagem e, da pior maneira possível*, descobri que havia um vazamento no atuador do freio traseiro direito.
No final deu tudo certo e o mecânico deixou tudo zeradinho pra mim a um preço baixo (cobrou só as peças) e finalmente poderia andar com a paratosa. Primeiro passeio na estrada e eu condenei voluntariamente os ótimos pneus remold de origem chinesa que vieram no carro e os substitui por pneus de uma ex-anunciante do FlatOut que não está mais presente então não citarei. Mais fácil que medida 175/70 R13 não tem, e paguei R$ 129.90 em cada pneu. No próximo post falarei das vantagens da roda 13 sobre as orbitais manolas 20”. NADA DE ORBITAL, MEU CARRO MINHAS REGRAS.
Após quase um mês pra deixar a Parati aceitável eu comecei a perceber coisas estranhas: algo como aproveitar que você encontrou seu pai na rua e dar um pulo no cemitério para visitar o túmulo do seu tio (WTF?!). E também eu percebi que só conseguia andar de dois jeitos nela: devagar quase parando ou tocando o terror.
No terceiro dia das calotas novas uma nos deixou e tive que voltar para as rodas pretas, que deixaram a aparência dela como a de um carro mais velho. E depois percebi que eu não precisava dar seta pra pedir passagem, nem buzinar. Bastava uma bombada no acelerador que o carro da frente literalmente se jogava para a faixa do lado em busca de sobrevivência.
Foi aí que um amigo meu, manjador desses paranauê de mitologia nórdica veio com o apelido de Valquíria, figura mítica que levava os guerreiros que morriam com honra no campo de batalha para o Valhalla, o céu desses caras. Não faz muito sentido, mas o nome é bacana. A segunda parte veio só da (má) fama dos VW quadrados. Sonoro, não é mesmo?
Mas foi a partir de então que eu aceitei o fato de que a ordem do que seria feito no carro partiria dela, não de mim.
A invasão dos adesivos mutantes de Júpiter
Assim como eu não sei explicar como eu comprei uma Parati, eu também não sei explicar o que aconteceu para tantos adesivos aparecerem no carro. Foi uma maratona de semanas em que eu via um adesivo engraçado na internet e comprava.
Não tem uma motivação específica: alguns eram pela zoeira (This sticker adds 5 HP, The closer you get The slower I go), outros foram pela inspiração nas corridas (faixa da Martini, numeração no vidro, fita preta em X nos faróis). Só sei que eles já somam uns 20 no carro inteiro. De longe, o meu favorito é o que está no rack do teto: “Because Family Car”, porque ele é meio que literal.
Depois de terem chamado a Valquíria de carro alegórico resolvi que era hora de parar. Aí começaram as loucuras de modificações.
V.E.B? OEM+? BRDM? LOL? WTF? BBQ?
Eu demorei muito pra perceber o que eu queria para o carro e o estalo só veio quando o FlatOut abriu mais vagas para o Project Cars. Foram cinco minutos de frenesi descontrolado no teclado e o que saiu foi meio Race Car, ¾ de Velha Escola Brasil (customização nacional típica de época) e ⅔ OEM+ (alteração com peças da mesma fabricante). Na minha cabeça o projeto se finaliza quando a minha Parati CL 1.8 virar uma Parati GTS 1.8S. Com direito a frisos largos, garrinhas no parachoque e milhas.
Nesse meio tempo eu posso ter feito qualquer coisa com ela, menos o que eu tinha escrito na minha inscrição (crianças, nunca confiem em jornalistas, eles não sabem o que dizem). E quando eu falo tudo é tudo mesmo. Cumpri cota de Saveiro transportando entulho, levei cachorro (um singelo Fila) pro veterinário, dei carona para diversas pessoas que, a essa altura, queriam dar uma passeio apenas pela fama do carro nas redes sociais.
Comando 49G? Nope. Bancos Recaro? Esquece. Eu não sabia nem o que eu queria fazer mais depois de um tempo. Fiz o que meu deu na telha e no bolso e não liguei para rótulos, pois essa é a pior besteira que você pode fazer.
Tudo o que consegui do ano passado para cá foi trocar as rodas 13 por um conjunto 14 original do Gol GT com pneus 185/60 R14, colocar o volante do Passat TS (cumpri a cota VEB com um volante herdado de um carro do meu vô) e instalar o Kit Trend (alarme, vidros e travas elétricas). A parte técnica dessas alterações virá nas próximas oportunidades.
E com isso chegamos a situação atual e – finalmente – o encerramento da primeira parte. Se você ligou o modo Sonic e pulou do primeiro parágrafo para cá (TL;DR), a Valquíria veio do nada, negou minhas vontades e me ensinou que se você não curte o seu carro do jeito que ele está, deveria ter comprado outro.
Ela nunca estará completa e, pra mim, esse é o mais legal: eu não sei o que vai ser dela daqui pra frente, só sei que não vai ser o que eu espero. Projeto completo pra mim é o carro que você tem dó de guardar na garagem no final da noite de domingo sem saber quando irá encontrar com ele de novo; é o carro que desconhecidos te param na rua para comentar; é o carro que te define, não o contrário.
O que você verá nos próximos episódios:
Desempenho da Valquíria, antes e depois das modificações; Valquíria nas pistas (Parte I) e surpresas desagradáveis; as vantagens das rodas e pneus de 13 polegadas; como administrar amadoramente uma pequena frota For Dummies; detalhes dos PCs 204b, 204c, 204d, 204e e 204f (é, amigo… apareceu uma ruiva no caminho); o dia em que eu tinha cinco veículos parados, quebrei o sexto e precisei pedir um scooter emprestado.
Até a próxima!
Por Thiago Moreno, Project Cars #204