Carlos Sainz fez história novamente. Depois de quebrar o recorde de largadas no WRC, de vencer dois títulos mundiais e participar de cinco campanhas de títulos de construtores, ele agora também é o terceiro piloto com mais vitórias no Rally Dakar e o terceiro com mais vitórias em estágios do Dakar. E ele ainda segue na ativa, com uma carreira que já se estende por quase 45 anos — e parece estar longe de terminar, considerando que ele acaba de vencer o Dakar 2024.
O início
Carlos Sainz Cenamor nasceu em Madrid, na Espanha, em 12 de abril de 1962, e começou a disputar ralis em 1980, aos dezoito anos de idade. Mas foi por pouco: em sua adolescência, Sainz também foi jogador de futebol e de squash. E ele mandava bem em ambos, chegando a fazer um teste com o Real Madrid e conquistando o título no Campeonato Espanhol de Squash aos dezesseis anos de idade.
Por sorte, a paixão de Sainz pelos ralis falou mais alto – a ponto de fazê-lo largar a faculdade de Direito após dois anos de curso e dar início a sua carreira como piloto em 1980. Uma carreira que ainda não acabou, diga-se.
O primeiro rali disputado por Carlos Sainz, ainda como amador, foi o Rally Shalymar, ali mesmo, em Madrid. Sainz conduziu um Renault 5 TS, versão esportiva do hatch francês movida por um quatro-cilindros de 1,3 litro e 64 cv.
Ele foi o 23º colocado entre 52 inscritos – não era exatamente um resultado brilhante, mas seu desempenho foi bom o bastante para mantê-lo motivado. No ano seguinte, 1981, Sainz inscreveu-se na categoria que alavancou sua carreira: a Copa Panda, competição monomarca criada pela Seat como incentivo a pilotos jovens e talentosos.
Como o nome dizia, a competição era disputada por exemplares idênticos do Seat Panda – versão rebatizada do Fiat Panda, o compacto mais básico e frugal da fabricante italiana na época –, todos movidos por um quatro-cilindros de 903 cm³ e 65 cv. Sainz foi o campeão da Copa Panda em 1981 e 1982, conseguindo reconhecimento o bastante para, em 1983, fechar um contrato com a Renault.
Em 1983, Carlos Sainz voltou a apostar no Renault 5 – desta vez em sua versão Turbo, homologado tanto pelo Grupo 4 quanto pelo Grupo B. Já na temporada de 1983 ele conquistou sua primeira vitória, no Rallye de Verano, como parte do Campeonato Espanhol de Rali. Foi o bastante para que ele seguisse firme com a Renault até 1986, ano em que foi o segundo colocado na competição.
O bom desempenho de Carlos Sainz no Campeonato Espanhol não apenas lhe rendeu o apelido El Matador, como também chamou a atenção da Ford, que lhe ofereceu um contrato para acelerar o Sierra RS Cosworth – um dos últimos representantes da tração traseira nos alto escalão dos ralis. Embora seu principal objetivo fosse o título no Campeonato Espanhol de Rali – que obteve, aliás, com sete vitórias –, Sainz também disputou etapas o ERC (o Campeonato Europeu de Rali) e do WRC. Seus melhores resultados no Mundial foram dois quintos lugares, no Rallye Sanremo na Itália e no RAC Rally britânico.
O grande problema é que, em parte por causa do próprio Sierra, que não conseguia acompanhar rivais de tração integral como o Lancia Delta HF Integrale, o Audi Quattro e o Toyota Celica GT-Four, a Ford não estava em sua melhor fase no WRC. Assim, após uma temporada sem brilho em 1988, tanto Carlos Sainz quanto seu colega de equipe, Didier Auriol, decidiram migrar para outras equipes. Auriol escolheu a Lancia, enquanto Sainz optou por juntar-se à Toyota.
Foi uma excelente escolha: a Toyota tinha no Celica GT-Four um excelente carro, mas até a chegada de Sainz não tinha pilotos à sua altura. Com o espanhol no posto de piloto principal, a Toyota quase conquistou seu primeiro título em 1989 – logo de cara Carlos Sainz foi o segundo colocado no RAC Rally, e manteve boas posições nas etapas seguintes, incluindo dois pódios no Rallye Sanremo e no Rali da Finlândia. Relatos da época diziam que, caso não tivesse abandonado as três últimas etapas da competição por problemas mecânicos e acidentes, Sainz poderia muito bem ter sido o vencedor naquele ano.
Consagração na Toyota
O triunfo não demorou muito, porém. O Celica GT-Four mostrou-se bem mais confiável em 1990 e Carlos Sainz conseguiu vencer quatro provas no WRC: o Rali da Acrópole, na Grécia; o Rali da Nova Zelândia, o RAC Rally do Reino Unido e o Rali da Finlândia. Detalhe: ele foi o primeiro piloto não escandinavo a vencer na etapa finlandesa do Campeonato Mundial em toda a história, superando os finns em sua própria casa. O título de Carlos Sainz também interrompeu a sequência de títulos de pilotos da Lancia que vinha acontecendo desde o início do Grupo A em 1987.
A temporada de 1991 foi extremamente disputada entre Sainz e o finlandês Juha Kankkunen, da Lancia: ambos venceram cinco provas e estavam tecnicamente empatados na etapa final, o RAC Rally. Sainz liderava por um ponto, mas não conseguiu garantir a vitória, ficando em terceiro lugar.
No ano seguinte a Toyota estreou a nova geração do Celica – um carro mais robusto e veloz que o anterior. Aquela seria a última temporada da Lancia no WRC, e a equipe italiana fez questão de oferecer um desafio à altura com Juha Kankkunen e Didier Auriol.
Foi uma briga extremamente equilibrada – embora Auriol tenha vencido seis etapas, contra três de Sainz e uma de Kankkunen, o número de pódios conquistados pelo espanhol foi suficiente para que ele conseguisse liderar o campeonato até a última prova, que mais uma vez foi disputada no Reino Unido. Sainz venceu com dois minutos de vantagem sobre Ari Vatanen, o segundo colocado, e com isso conquistou seu segundo e último título na carreira.
Um piloto maduro
O patrocinador pessoal de Carlos Sainz por boa parte de sua carreira foi a fabricante de lubrificantes Repsol. Por conta disso, ele acabou saindo da Toyota no fim de 1992 – a equipe japonesa seria patrocinada pela rival Castrol a partir de 1993.
Sainz foi contratado pela Lancia para pilotar o Delta HF Integrale, mas não se deu bem – o hatchback italiano havia conquistado seis títulos consecutivos no WRC entre 1987 e 1992, mas já não era tão competitivo diante de projetos mais modernos e eficientes. Sainz conseguiu apenas um pódio na temporada, na Grécia, e depois disso foi procurar outra equipe.
A Subaru lhe ofereceu um contrato de dois anos, para 1994 e 1995. Àquela altura, já com 15 anos de carreira, Sainz mostrou-se tão importante quanto o astro Colin McRae para o desempenho da marca das Plêiades no WRC – sua experiência e seu feedback em relação ao carro ajudaram a equipe a acertar o carro de forma mais eficiente.
Em 1994 Sainz foi o segundo colocado no mundial dos pilotos, perdendo seu terceiro título para Didier Auriol, seu sucessor na Toyota, na última etapa. Em 1995 o confronto foi interno – Sainz e McRae duelaram ponto a ponto até o fim da temporada, com o escocês levando a melhor no RAC Rally por apenas 36 segundos.
Carlos Sainz era bastante requisitado pelas equipes por seu estilo de pilotagem preciso, suave e sem espaço para erros – algo que era incomum na década de 1990, quando ainda se favorecia uma condução mais espetacular e acrobática.
Assim, pelos anos que se seguiram, Sainz passou pela Ford, com o Escort RS Cosworth e com o Focus RS WRC; retornou à Toyota para ajudar os japoneses a aperfeiçoar o recém-chegado Corolla hatchback; e por fim foi contratado pela Citroën, onde competiu entre 2003 e 2005 com a versão de rali do Xsara.
Embora não tenha conquistado mais títulos, Carlos Sainz permaneceu como um dos destaques da competição com uma consistência invejável, sendo vice-campeão em 1994 e 1995 pela Subaru, e em 1998 pela Toyota. Ele também conquistou cinco terceiros lugares – quatro vezes com a Ford (1996, 1997, 2000 e 2002) e uma vez com a Citroën (2002).
Ao longo de sua carreira no WRC, Carlos Sainz conquistou o recorde de largadas no campeonato – foram 196 no total — uma marca que só foi superada em 2019 pelo finlandês Jari-Matti Latvala, o atual recordista com 210 largadas.
Carlos Sainz deixou o Mundial de Rali em 2005, depois de 26 temporadas, dois títulos de pilotos, quatro vice-campeonatos e cinco terceiros lugares, além de participar da campanha de cinco títulos de construtores (Toyota, Subaru e Citroën).
E se você acha que ele se aposentou e foi cuidar da carreira do filho, Carlos Sainz Jr., está redondamente enganado: em 2006 mesmo ele ingressou na equipe da Volkswagen para disputar o Rali Dakar, iniciando uma sequência de 19 participações quase consecutivas — ele ficou fora em 2012, somente. E de um campeão do WRC não poderíamos esperar nada menos que múltiplas vitórias nos carros do Dakar: Sainz venceu em 2008 e 2010 pela Volkswagen, em 2018 pela Peugeot, em 2019 pela Mini e agora, em 2024, pela Audi — prestes a completar 62 anos. O que poderá parar Carlos Sainz?
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