Olá, pessoal! É com muito prazer que continuo a contar a história de preparação da Mitsubishi TR4R para o Rali dos Sertões. Fiquei muito feliz por todos os comentários de apoio e toda a receptividade que recebi no FlatOut, principalmente depois de compartilhar com vocês a minha história (nada fácil) para chegar até aqui! Muito obrigado!
No primeiro post falei de como havia chegado na decisão de comprar a TR4 R para o desafio que é o Rali dos Sertões, então vamos começar falando um pouco sobre o carro em si…
A PajeroTR4 R
A Pajero TR4 R foi criada com o intuito de oferecer uma modalidade mais agressiva para os os participantes da Mitsubishi Motorsports (núcleo de competição interno da marca), que na época já contava com pilotos graduados que já haviam passado por diversas provas e achavam que era a hora de subir de degrau. Portanto, originalmente o carro foi criado com um objetivo em mente: correr em provas de rali de velocidade e servir de plataforma para pilotos mais graduados destas categorias.
A grande vantagem da Mit TR4 R é que a sua preparação é feita diretamente na fábrica (diferente de algumas categorias em que o carro é entregue para preparadores), e traz consigo itens essenciais, que nos deixam na “metade” do caminho da preparação completa para o Sertões, além de ser um carro que já sai de fábrica homologado pela CBA.
As principais diferenças deste carro para uma TR4 “comum” são: Estepe interno, respirador ou “snorkel’ de série, portas traseiras “lacradas” que não abrem, portas dianteiras feitas em fibra para diminuição de peso, janelas em acrílico que contam somente com a abertura do tipo “correr” e portanto não abrem normalmente. Dentro do carro não há nenhum tipo de acabamento interno a não ser pelo painel de instrumentos, de série, o carro vem com bancos concha e gaiola de proteção homologada.
Tratando de motor o carro não vem com qualquer tipo de alteração, é original, já a caixa de câmbio e a relação da transmissão é encurtada de fábrica. A suspensão do carro por sua vez foi bastante trabalhada, eas TR4 R tem um ajuste mais duro, e possuem elementos mais robustos, com amortecedores de competição da marca ohlins. Na dianteira o carro tem um ajuste de cáster diferente, os pneus são próprios de competição.
Como dá pra notar, já é um excelente começo, mas pra encarar o Sertões, algumas alterações precisam ser feitas….
Preparando para Sertões
A preparação de um carro de rali é cuidadosa, estamos sempre buscando chegar ao final, sem quebras e de forma consistente, por isso tomamos bastante cuidado na preparação. Dividi em partes para ficar melhor, vamos lá!
Motor
A categoria que Production T2 na qual eu corro, não permite mudanças no motor, portanto a parte mecânica fica intacta como vem de fábrica, assim como o câmbio. Algumas coisas que podemos fazer dentro do regulamento é tomar alguns cuidados extras, adicionando um óleo melhor (no nosso caso o MOTUL) e sempre trocando o filtro de ar (que costuma ficar bem sujo) entre etapas.
Falando em filtro de ar, a admissão dos carros do rali possuem uma restrição dependendo da categoria, na nossa, estamos falando de 35mm de diâmetro no tubo de admissão que leva ar ao motor. Para aproveitar ao máximo a potência disponível é importante que o tubo que leva ar ao motor não encontre arestas ou curvas, e um polimento do tubo ajuda na admissão de ar pelo motor, garantindo o aproveitamento máximo. Todo detalhe é importante.
Dentro do carro, a gente precisa saber todo o tempo o que está acontecendo, quando a gente demora pra perceber um problema isso pode custar um dia de competição, um pódio ou até mesmo a prova inteira! Por isso, dentro do carro instalamos um manômetro de pressão de combustível, do qual eu sempre consultava, caso algo estivesse fora do normal, já tínhamos como parar imediatamente evitando danos. Uma coisa interessante e que mostra como rali é muito mais do que só sentar e acelerar o carro e que você também precisa pensar em tudo que pode acontecer.
Um exemplo disso é que optamos por não colocar o manômetro de pressão de óleo, já que uma simples a instalação necessitava de algumas mangueiras extras e a cada mangueira extra, maior a chance de danos causados por galhos e pedras que costumam entrar com tudo no motor, o que poderia colocar tudo a perder. Outros cuidados que tomamos é a troca de correias entre etapas, evitando quebras, além disso instalamos um voltímetro para ficar sempre atento a qualquer diminuição de rendimento também na parte elétrica.
Um fato interessante é que durante o rali também temos a opção de desconectar o snorkel, quando a gente faz isso ganha mais alguns hps extras, porém se uma passagem de água não identificada surgir, temos que arriscar “afogar” o carro, isso tem que ser decidido também antes de cada etapa, e a gente sempre toma essa decisão sabendo dos riscos.
Dentro de um rali, outra coisa que pode te afetar é a qualidade do combustível. Tento sempre correr com gasolina podium, e a nossa equipe leva o máximo de combustível aditivado possível entre as etapas no nosso caminhão de apoio, isso costuma fazer uma diferença enorme, cada hp que a gente consegue manter no motor, faz a diferença. Mas nem sempre conseguimos, faz parte!
Em relação ao arrefecimento, nós sempre trocamos os mangotes antes do rali e depois não mexemos, nunca tive problema com essa parte, eu sempre me preocupei de colocar a mistura certa de aditivo e água conforme especificações da Mitsubishi e nunca me deu dor de cabeça. Então falando de motor, o resumo é: manter tudo limpo, organizado e sempre extrair o máximo de potência onde der. A verdade é que tem que desmontar tudo pra poder começar a preparar.
Câmbio
Com restrições de regulamento, o que nós realmente fazemos em relação ao câmbio é uma manutenção completa, com troca de óleo (também usamos MOTUL) e todas as peças originais mitsubishi. Eu sempre insisto que não podemos “inventar” nessa parte, tem que ser tudo de qualidade.
A TR4 R de fábrica possui uma relação de câmbio menor que a TR4 original, dando mais torque na reduzida e na 4×4. No rali não necessariamente precisamos andar a 180 km/h todo tempo, então isso ajuda bastante, pois nos dá torque em rotações mais baixas.
Na parte de transmissão dianteira e traseira é preciso cuidado. Eu troco toda a corrida as cruzetas e sempre verifico se o eixo cardã está bem balanceado, um problema que tive quando precisei trocar a engrenagem que se liga aos eixos traseiros e dianteiros, foi que por conta da relação mais curta eu não encontraria essa peça facilmente no mercado. Cogitei a troca dos eixos traseiro e dianteiro pelo da TR4 “civil” (era a única forma de instalar a peça que eu encontrava no mercado), mas ligando na fábrica, eu consegui o original da TR4 R e instalei.
Suspensão
Aqui também temos restrições de regulamento, por isso os amortecedores precisam ser originais. A TR4 R conta com os amortecedores ohlins que já são excelentes! Aqui o importante é fazer a manutenção corretamente, por que um jogo de amortecedores como este pode facilmente chegar na casa dos 5 dígitos! Por isso eu sempre troco as buchas, o rings, o óleo e o gás dos amortecedores para encarar o rali.
Segurança
Um carro para participar dos Sertões, precisa de algumas adaptações, uma das mais importantes é a instalação de uma parede “corta-fogo”, isso serve como o nome já diz, para prevenir que um incêndio atinja a área onde ficam os pilotos. Essa adaptação não é feita à toa, para participar do rali levamos dentro do carro (na parte traseira), um tanque extra de combustível, o que torna este equipamento obrigatório.
Nosso bancos são sparco, considero esses bancos confortáveis e gosto também porque são reguláveis. Tudo tem que ser homologado e precisa estar na validade. Os bancos são escolhidos de acordo com o nosso tamanho (tipo uma calça que se compra), assim não temos muito movimento lateral, afinal precisamos estar seguros dentro do carro. Falando disso, os cintos que antes eram de 5 pontos, agora são de 6 pontos e são presos no assoalho ou na gaiola.
Um fato curioso é que nós temos 2 bolsas dentro do carro, elas são fechadas e presas diretamente na porta, lá que colocamos comida, água, carteira etc. Nosso vidro quase não abre e é todo de acrílico. Dentro do carro nada fica solto e é tudo lata e ferro. O extintor de incêndio possui 3 tubulações, uma para a parte de dentro do carro, outra que joga para o capô, e outra que joga para a parte traseira, então na hora que a gente puxa a alavanca o gás já é liberado no carro todo.
Uma coisa bastante interessante é que o extintor também pode ser acionado pelo lado de fora. Em caso de acidente em que a gente possa ficar preso, alguém de fora pode liberar o gás e apagador qualquer incêndio. A mesmo coisa serve para o “corta corrente” que fica no nosso painel e do lado de fora sinalizado com um seta vermelha.
Parte elétrica
Outra coisa que a gente se preocupa muito é a parte elétrica, por isso sempre colocamos uma bateria nova antes do rali (no meu caso Moura) que sempre durou bem. Sempre trocamos todas as lâmpadas antes da prova, dentro do carro separamos todos os componentes eletrônicos com fusíveis de forma simples, tudo de fácil acesso. Levamos fusíveis extras dentro do carro, e caso alguma coisa venha a falhar já resolvemos na hora. Não pode haver nenhum tipo de “emenda” nos fios, sempre ligamos tudo a conectores e procuramos manter tudo bem organizado. Essa preocupação toda é principalmente por conta dos nosso equipamentos de navegação que não podem falhar. Já que estes equipamentos são ligados diretamente na bateria, fusíveis e sondas podem colocar tudo a perder ou atrapalhar a nossa navegação.
Ar condicionado até podemos ter, mas se pra reduzir peso e é claro, evitar perda de potência, decidmos por remover. Faz falta? Sim muita! Mas a gente precisa ser rápido. A gente tem que dar um jeito.
Lembra que eu falei de ter tudo organizado? Pois é, mas isso não previne algumas coisas, um detalhe que já me incomodou bastante foi que o desembaçador do vidro dianteiro. Quando entra água no nosso carro, os vidros acabam ficando embaçados e já aconteceu de eu perceber que isso não tava funcionando exatamente quando mais precisei, no meio da prova.
Detalhes
Uma coisa que pouca gente sabe é o quanto os retrovisores de carros de Rali são ruins. No nosso carro não é diferente. O espaço para olhar para fora é mínimo e a janela quase não abre. Então instalamos um espelho convexo para poder ver mais. Só que, outra coisa complicada que pouca gente sabe é que custa muito tempo sair do carro para verificar se o pneu está furado (o que pode acontecer em muitas vezes durante um Rali), e foi aí que a ideia do espelho convexo mais uma vez ajudou. Ao invés de sair do carro e desamarrar o cinto, instalamos outro espelho na porta de forma que para checar se o pneu está furado, basta abrir a porta e olhar por ele, salvando um tempo enorme!
A preparação continua… mas isso fica para o próximo post, lá vou mostrar a pintura do carro nas minhas duas participações com ele até agora, também vou falar um pouco da inspiração para o visual do carro e os ajustes finais para encarar o Sertões. Vou trazer um resumo da minha última participação contando algumas situações interessantes! Espero vocês lá! Um abraço e até a próxima!
Por Fábio Cadasso, Project Cars #396