A quase exatamente um ano atrás, dos escombros do Jalopnik, começava uma história apaixonada sobre carros e pessoas, que de tão aouca e improvável, me fez querer de alguma forma participar. O FlatOut me conquistou logo de cara, eu tinha que apoiar aquela iniciativa e o crowdfunding foi a maneira que encontrei. Mas quando o Juliano apresentou a ideia do Project Cars não tive dúvidas, mesmo a Susie estando mais para “projeto de vida” do que “project car”, acabou sendo escolhida e tornou-se o PC#82, o “Diário de um Subaru”.
O “Diário de um Subaru” é meio diferente, mas gosto de pensar que mantém a essência de um PC, um relato pessoal e cândido sobre a convivência com a Susie, tentando combinar as histórias com aspectos técnicos do carro. Assim, no post 1 contei a história dos WRX e como a nossa história (minha e da Susie…) começou; o post 2 foi sobre a preparação e a convivência diária; no post 3 foi a vez de contar os micos, e quebrar os mitos sobre o WRX; chegando ao post 4 sobre os ajustes e experiências em Trackdays.
Tenho consciência de que os temas e o formato do “Diário de Subaru” fogem do que muitos esperam de um Project Car, mas as vésperas de completar 15 anos juntos, já não é tão simples separar as revisões das reflexões. Neste quinto capitulo vou falar sobre a revisão de 15 anos, mas também de algo estranho e desconexo, algo que na prática é a razão original para que eu goste tanto de carros.
A minha esposa se irrita só de eu tentar explicar essa coisa que tenho com carros. Eu admito que minha explicação é tão etérea que parece loucura, e talvez seja. Com certeza é. Mas em poucas palavras, minha relação com carros é mais ou menos como o “Kwan” do Rod Tidwell (love, respect, community, and money) só que com endorfina no lugar do money. Eu chamo de Kwar : Amor, respeito, comunidade e endorfina, tudo junto em um único pacote. *Se não tem ideia do que estou falando, procure por Jerry Maguire no YT.
Quando alguém não concorda ou não entende, não adianta tentar explicar. Especialmente a “heresia” de chamar de amor o sentimento por um carro. Mas como Groucho Marx dizia (outra referência pré-histórica), a relação com carros é no mínimo uma metáfora sobre relações amorosas — o motorista sendo o homem e o carro uma garota (“Lizzie” era o nome que ele usava…), que se encontram, se apaixonam, se juntam, se casam, tem seus momentos de paixão, e, claro, os inevitáveis percalços. Seria mais fácil de explicar se não fosse tão piegas, mas o amor é piegas mesmo…
O fato é que todo mundo, inclusive aqueles que mais amamos, tem um ponto crítico, e nos WRX, especialmente entre 2000 e 2002, é a transmissão. Na Susie nunca tive problemas muito sérios, e a favor dela vale mencionar que a embreagem nunca foi trocada, mas é extremamente irritante como ela arranha a 2ª e a 3ª marchas em trocas mais agressivas… a troca dos fluídos da transmissão e diferencial está prevista aos 100.000 km, e decidi usar o Motul Gear 300, que embora seja ótimo, só justifica seu preço em um carro de rua a base de muito amor…
A parte do respeito talvez seja mais fácil de explicar, primeiro pelo fato de a Susie ter feito comigo tantas viagens seguras, à trabalho e lazer, para maternidades, escolas e, claro, trackdays. Mas também por todas as vezes que tomei decisões importantes enquanto a dirigia. Há quem reflita sobre a vida ou decisões importantes tomando banho, ou fazendo Yoga. Eu faço isso dirigindo, e a Susie fez parte de algumas das decisões mais importantes que já tomei, e se tornou tão próxima e familiar quanto alguém pode ser.
O respeito só aumenta com o tempo, mas o mesmo não se pode dizer sobre bobinas e bombas de combustível. Embora a Susie funcionasse sem falhas até o momento da revisão, quando a colocamos no dinamômetro pareceu que havia um problema após 5000 giros. Fosse ainda totalmente original, provavelmente não haveria nenhum risco ou problema, mas decidi que era hora de bobinas novas do modelo original (a do STI tem a mesma especificação), e de uma nova bomba STI, cuja capacidade é ligeiramente superior a original do WRX.
A dica sobre a bomba veio de um amigo do NASIOC, possivelmente a mais antiga comunidade Subaru fora do Japão. Bom exemplo de como tantos amigos, próximos ou distantes, diferentes de tantas formas, tenham em comum alguma coisa relacionada aos seus carros, gente disposta a ajudar, compartilhar experiências e se reunir em torno deles! Isso pode soar fútil para alguns, mas os laços e amizades formados ao longo dos anos, pelo menos no meu caso, são prova dessa capacidade de um carro aproximar pessoas.
Para fechar o Kwar falta apenas a endorfina, um hormônio associado ao prazer, cujos efeitos incluem aumento da resistência imunológica, melhora do humor e alívio de dores. É um fato. Depois de um dia ruim ou durante um período complicado, o melhor remédio pra mim é dirigir. Me lembro que meu pai, no final de um tratamento difícil (e afinal inútil) não conseguia mais alívio com remédios, mas algumas horas dirigindo eram suficientes para que ele esquecesse a dor e se divertisse um pouco.
A Susie foi o último carro em que meu pai andou. Ele já não podia mais dirigir, ainda assim o efeito foi o mesmo. Ele não era um cara impressionável, e meio blasé me perguntou quantos cavalos tinha, mas eu não sabia exatamente. Não que o Kwar tenha a ver com o quão rápido, caro, novo, velho, original ou modificado é um carro, o Kwar é simplesmente o que acontece toda vez que um carro proporciona situações assim.
Antes da revisão havíamos medido cerca de 250cv nas rodas, e agora, trocados óleo do motor, fluído da transmissão, bobinas, bomba de combustível, velas e cabos, colocamos o carro no dinamômetro novamente, e com uma nova programação chegamos a 286 cavalos. Não que isso faça alguma diferença. Mas agora sabemos.
Um abraço, até o próximo post (provavelmente sobre a Frida…) e um pouco mais de Kwar, que não faz mal a ninguém!
Por Marcelo R., Project Cars #82