Você pode não simpatizar muito com a Ferrari, pode achar a Lamborghini ou a Porsche ou a McLaren (ou a Pagani e a Koenigsegg) mais legais. Ou talvez até tenha uma certa bronca por conta de certas atitudes da equipe na Fórmula 1 da década passada. O que você não pode é negar a importância e a grandiosidade da Ferrari na história do automóvel.
Ela não foi a primeira marca nascida nas pistas, nem a primeira a transferir suas tecnologias de corrida para seus carros de rua. Mas ela foi, sem dúvida, quem melhor colocou o espírito do automobilismo nas ruas. E uma das poucas nascidas da paixão de um homem pela velocidade e por suas máquinas.
Esse tipo de noção às vezes é um pouco perturbado pela quantidade de supercarros e superlativos que se vê por aí — especialmente aqueles criados com o único objetivo de ser um objeto caro e opulento para ser exibido nos bairros chiques de Londres ou em Monte Carlo.
Em seu novo vídeo de lançamento da LaFerrari Aperta, o modelo que comemora os 70 anos da marca, a Ferrari aproveitou para homenagear sua própria história e, de quebra, lembrar o mundo de onde ela veio e como ela chegou até aqui. E você perceberá isso não pela análise racional do vídeo, mas sim pelas sensações que ele causará na sua cabeça de gasolina.
Se você não esboçou ao menos um sorriso ou é incapaz de reverenciar essa história, você certamente não tem coração e talvez prefira um Lifan 620 prata, com interior cinza e rodas de aço com calotas.
A jornada de Vettel começa com o reflexo da 125S, o segundo carro fabricado por Enzo Ferrari, porém o primeiro a ostentar orgulhosamente seu sobrenome no topo do capô. Era um esportivo de rua e pista feito sobre chassi tubular, e usava suspensão de braços triangulares sobrepostos com mola semi-elíptica na dianteira e eixo rígido na traseira. Seu motor era um V12 de 1,5 litro desenvolvido pelo lendário Gioacchino Colombo, e produzia 118 cv a 6.800 rpm.
Logo em seguida o filme relembra a Ferrari 375F1, que no vídeo aparece rapidamente com o argentino José Froilán González. Foi apenas o segundo Fórmula 1 da Ferrari, porém foi o primeiro carro da Scuderia a vencer na categoria, quando Alberto Ascari faturou o GP da França de 1951.
O modelo seguinte, refletido em uma fachada, é a 250 Testa Rossa de 1957, um esportivo desenhado por Scaglietti e equipado com belo o V12 de três litros de Colombo, com suas tampas de válvulas vermelhas, que foi desenvolvido para competir na classe de três litros do Mundial de Carros Esporte (WSC).
Depois temos uma das 39 250 GTO produzidas entre 1962 e 1964, aparentemente o chassi 3851GT. O modelo dispensa apresentações: foi uma das Ferrari mais vitoriosas de sua época, tendo sido pilotada por caras como Phil Hill e Stirling Moss — e atualmente é o carro mais caro do planeta.
A próxima é a lendária 330 P4, que venceu as 24 Horas de Daytona de 1967 com Lorenzo Bandini e Chris Amon, seguida por outras duas 330 P4. Ela não tinha um motor de sete litros como os Ford GT40; mas a Ferrari apostou no refinamento mecânico de seus carros para compensar a diferença de mais de 3.000 cm³. Um desses refinamentos era a injeção de combustível, que ajudava a produzir 450 cv, chegando a uma potência específica de 114 cv/l, enquanto o Ford GT40 deslocava sete litros para gerar 500 cv (pouco mais de 70 cv/l) com seus carburadores Holley.
Mais adiante, Vettel ultrapassa o caminhão tanque e vê o reflexo da 312T5 de Gilles Villeneuve, o modelo usado na temporada de 1980 da Fórmula 1. Foi uma bela homenagem ao canadense, embora o carro tenha sido o pior de sua carreira.
Ao chegar no circuito de Barcelona, mais uma homenagem a um herói da Scuderia — e do próprio Vettel: a Ferrari F2004 de Michael Schumacher e seu motor V10, com a qual o alemão conquistou seu sétimo título mundial e a Ferrari faturou o mundial de construtores daquele ano.
Nos anos 1950, quando a Ferrari alinhou sua 315F1 pela primeira vez, os demais carros eram produzidos por fabricantes que abandonaram a Fórmula 1 há décadas — ou até mesmo desapareceram. Em 1961 a Lamborghini ainda nem sonhava em fazer carros, mas a Ferrari já estava conquistando seu primeiro título de construtores. Em 1975 a Mercedes completava vinte anos longe das pistas, mas a Ferrari continuava lá, faturando um título de pilotos e outro de construtores. Quando a McLaren lançou seu primeiro carro de rua, a Ferrari já tinha quase 50 anos de estrada. A Lancia já havia sido reduzida a quase nada em 1996, enquanto a Ferrari estava contratando a maior promessa da Fórmula 1 de sua época.
Em 70 anos, fabricantes foram e voltaram, cresceram e desapareceram. E nestas sete décadas a Ferrari foi a constante, a inspiração para todas elas — afinal, a Ferrari era a marca a ser batida. E ela realmente foi em diversas situações. Mas é exatamente daí que vem a grandeza Ferrari — e de todos os que ousaram desafiá-la e vencê-la. Você não entra para a história fazendo o que qualquer um faz.