Uma Ferrari de mais de 600 cv, capaz de acelerar até os 100 km/h em menos de três segundos e chegar perto dos 310 km/h. Belos números, não? E se dissermos que a Ferrari em questão tem 20 anos de idade? Pois estamos falando de uma 348 Challenge 1994 que, graças a dois turbos, é mais rápida do que uma 458 Italia — e mais visceral, também.
Recentemente, a Ferrari lançou a California T, atualização turbinada de seu modelo mais barato. Há alguns dias, também começaram a surgir boatos de que a 458 vai ganhar turbocompressores no ano que vem. Tem gente torcendo o nariz e chamando de downsizing, mas o fato é que Ferrari e turbos dão uma combinação matadora, e você sabe disso — ou você esqueceu da F40?
Dito isso, a Ferrari 348 não tem o mesmo status de uma F40, mas ambas têm algo em comum: o motor V8 derivado daquele usado na 288 GTO. Para a 348, a Ferrari aumentou a cilindrada de 2,9 para 3,4 litros e, sem indução forçada, extraiu dele 300 cv — suficientes para um 0-100 km/h de 5,6 segundos e máxima de 275 km/h. Parecem bons números para 1989 (o ano do lançamento), mas os testes da época não conseguiam reproduzir estes números.
Para piorar a situação, a Ferrari tinha um problema vindo do Japão: o Honda NSX, que tinha um motor V6 de 280 cv, andava mais do que a 348 (0-100 km/h em 4,8 segundos e máxima de 280 km/h), tinha uma dinâmica mais dócil e refinada, e era mais confortável e mais barato.
Não nos surpreendemos, portanto, com o fato de ninguém responder “348!” quando indagado sobre sua Ferrari favorita. Depois a marca lançou a 355 — esta sim, potente na medida certa, com melhor dinâmica, visual mais atraente e, assim, querida por todos. Mas, antes, veio a 348 Challenge.
A 348 Challenge foi feita especialmente para competir na categoria monomarca Ferrari Challenge, criada em 1993 para donos de Ferrari que queriam se envolver no automobilismo. Os carros tinham motor ligeiramente mais potente, com 320 cv, novo sistema de escape, freios maiores, aerodinâmica aprimorada e estavam prontos para competir, trazendo até mesmo gaiola de proteção de seis pontos e pneus slick. Mas eram 100% legalizadas para as ruas — bastava trocar os pneus.
Stacey Slead é o dono de uma 348 Challenge 1994. Ele a comprou de seu amigo e mecânico Steve Maxwell, que por sua vez, achou o carro na internet. O carro estava íntegro, mas cheio de detalhes para consertar — alguns amassados, pintura gasta, acelerador que travava e outras coisas chatas que fazem as pessoas venderem um carro. No fim das contas, o carro continuou sob os cuidados de Maxwell, que ficou encarregado de restaurá-lo.
Acontece que Maxwell também tinha experiência em turbinar superesportivos — e Slead já os havia visto em ação. Eles ficavam muito rápidos. A 348 Challenge já era um carro legal, mas poderia ser mais rápido. Você já deve ter ligado os pontos a esta altura.
O motor foi retirado para que Maxwell pudesse trabalhar nele, e foi colocado outro motor no lugar — e assim Slead poderia continuar curtindo o carro e o conhecendo melhor enquanto Maxwell fazia sua mágica. E, embora não dê para perceber num primeiro olhar, o carro mudou bastante — não era só colocar os caracóis e boa. Não, senhor: o carro ganhou um novo sistema de arrefecimento, com dois radiadores maiores e mais eficientes, e dois turbocompressores Turbonetics T3/T4 K26, acompanhados de um intercooler feito sob medida. Também feitos sob medida são os coletores de admissão e escape e os dutos do sistema de arrefecimento.
Mais do que isso, o carro ganhou um novo módulo de controle, que talvez seja o maior responsável por modernizar a 348 e trazer seu desempenho para os padrões atuais. Isto porque, além de ter um pico de potência de 617 cv a 7.700 rpm (com corte de giro a 8.900 rpm) e torque de 67,2 mkgf, o módulo DTA Fast oferece controle de tração, controle de estabilidade, gerenciamento de injeção individual para cada injetor e controle de largada — e tudo funcionou muito bem com os sensores Bosch originais.
O “chão” fica por conta da suspensão mais moderna da F355 (que é uma evolução da 348, na prática), com braços sobrepostos assimétricos, amortecedores Bilstein e barras estabilizadoras, e das rodas originais da 348 Challenge — de 18 polegadas, fabricadas pela Speedline e calçadas com pneus Pirelli P-Zero de medidas 245/35 na dianteira e 315/35 na dianteira. Nos quatro cantos, os freios são AP Racing com discos de 346 mm de diâmetro e pinças de seis pistões. A 355 batida que cedeu a suspensão também foi a fonte do câmbio manual de seis marchas.
O carro é capaz de acelerar até os 100 km/h em 2,8 segundos (!) com máxima de 308 km/h. Matt Farah, do The Smoking Tire, testou o carro em seu mais recente vídeo e ficou simplesmente embasbacado. Ele diz que, apesar de andar na frente de uma Ferrari moderna (a 458 Italia, por exemplo, vai de 0 a 100 km/h em 3,3 segundos), a 348 de Stacey Slead é muito mais orgânica e barulhenta. “Ela tem todos os barulhos certos: o ronco do V8, o assovio das válvulas dos turbos e o clic-clac da grelha na alavanca de câmbio.”
Além de tudo, Slead e Maxwell tiveram o cuidado de fazer tudo parecer original — incluindo até mesmo uma placa no motor que diz “348 Challenge Biturbo”, que, como tudo no carro, foi feita por ele. O interior, que já é bem despojado de fábrica, porém bem acabado, só recebeu cintos de competição. Quem não conhece muito de Ferrari jamais diria que este carro foi modificado e preparado.
Ele é a prova definitiva de que Ferraris e turbos combinam muito bem — como se precisássemos de mais provas.
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