Um dos aspectos fascinantes do automobilismo é a extrema habilidade necessária para chegar às categorias de elite, como a Fórmula 1 – ainda mais com todo o risco envolvido. Mesmo com a evolução dos equipamentos de segurança, é fato que o esporte a motor é perigoso, e só vai deixar de ser caso os pilotos sejam aposentados e as corridas passem a ser realizadas com carros autônomos. E esperamos que nunca aconteça.
Na verdade, o automobilismo é tão fascinante que até mesmo os astronautas são fãs. Sim: os seres humanos criteriosamente selecionados, altamente especializados e rigorosamente treinados que ganham (e arriscam) a vida explorando o espaço também acompanham as corridas. Um deles, em especial, fez mais do que acompanhar – Drew Feustel, que foi comandante da Estação Espacial Internacional (International Space Station, a ISS) entre junho e outubro de 2018. A foto abaixo foi feita por ele em seu último dia como residente da ISS.
Em seus seis meses no espaço, Drew não deixou de acompanhar religiosamente os treinos e corridas da Fórmula 1 – caso você por alguma razão não saiba, os astronautas também têm TV, internet e telefone na ISS. Melhor ainda: de sua casa temporária a 400 quilômetros da Terra, Drew tinha uma visão privilegiada dos circuitos em que eram realizadas as provas – como um Google Earth ao vivo. E o que ele fez? Fotografou cada um deles lá de cima, com sua câmera DSLR, e postou as imagens no e no . E todas são sensacionais.
Drew tem doutorado em sismologia – o estudo dos terremotos e demais movimentos que ocorrem na superfície do globo terrestre. A graduação lhe permitiu trabalhar com exploração de gás e petróleo na Exxon, de Houston, no Texas, onde permaneceu até 2000, quando entrou para a NASA. Sua primeira missão espacial aconteceu em 2009, quando trabalhou no Hubble (Missão de Serviço 4) e a segunda em 2014. Em 2018, a Agência Espacial Norte-Americana lhe ofereceu a posição de comandante da ISS, e obviamente Drew aceitou.
Mas antes de ser astronauta, Drew já era entusiasta. Seu primeiro carro foi um Mustang 1967, que ele restaurou sozinho. E não parou mais: com os anos, Drew aprendeu funilaria, pintura e mecânica, e também reuniu uma bela coleção de automóveis, sendo que o mais novo deles é um BMW M3 E30 fabricado em 1990. Ele também tem, entre outros, um Mercury Comet Cyclone GT 1966 (o carro com o qual ele posa na foto abaixo), uma VW Kombi Westfalia 1966 e um BMW 3.0 CS 1972. Para este, aliás, ele encomendou um motor de partida enquanto trabalhava na ISS –ou seja, de fora do planeta. Isto é que é dedicação.
A paixão pelas corridas de Fórmula 1 foi o que levou Drew a fotografar cada um autódromos da temporada 2018 – e, na ocasião de cada etapa, ele postava a foto da vista aérea (ou melhor, da vista espacial) do circuito onde seria realizada a corrida naquele fim de semana.
Segundo o próprio Drew contou à revista Hot Rod, o projeto foi uma espécie de hobby a que ele se dedicou nas horas vagas, enquanto cumpria sua missão no espaço. E ele se empenhou de verdade. Não era apenas uma questão de esperar a ISS pairar sobre a área do autódromo: ele teve de calcular a trajetória da Estação Espacial e, então, organizar sua agenda para ter uma brecha – na qual ele vestia o traje, saía da estação com a câmera em punho e registrava as imagens.
Drew usou uma Nikon D5 com uma lente super teleobjetiva de 800 mm e colocou nela um duplicador, também conhecido como teleconverter, para dobrar o alcance e aumentar a profundidade de campo e conseguir imagens nítidas e abrangentes dos autódromos e suas adjacências. Apontando a câmera para a Terra, ele conseguia enxergar pelo visor detalhes que não eram visíveis a olho nu – e só assim ele conseguia encontrar os autódromos para fotografá-los.
Para saber o momento certo de sair da ISS e fazer as fotos, Drew contou com a ajuda dos operadores da missão aqui embaixo – ele mandava as coordenadas dos autódromos para a Terra, que enviava de volta a melhor data e hora para tentar capturar as imagens da melhor forma possível. E era preciso ter timing: não parece, mas a ISS viaja pelo espaço a mais de 28.000 km/h e, por isso, raramente Drew tinha mais que cinco minutos para capturar as imagens. Não foram poucas as vezes em que ele teve de voltar à ISS sem a foto que queria por um erro de cálculo, ou simplesmente não conseguir encontrar o circuito em tão pouco tempo.
Por isso, cada micro-expedição fotográfica tinha de ser panejada com semanas de antecedência – cada foto era postada no dia da corrida correspondente, e foi assim com cada uma das provas disputadas na Fórmula 1 enquanto Drew estava no espaço: do GP do Canadá, realizado em 10 de junho, ao GP da Rússia, que aconteceu em 30 de setembro.
Drew retornou da Estação Espacial em 5 de outubro. Mas ele já havia tirado fotos dos circuitos onde seriam realizadas as cinco últimas provas do ano – Suzuka, no Japão; Circuito das Américas, nos EUA; Hermanos Rodriguez, no México; Interlagos e Yas Marina, nos Emirados Árabes — além de imagens dos circuitos da Indy e da MotoGP. Estas últimas fotos foram postadas por Drew do conforto de seu lar aqui na Terra, mesmo.
Por enquanto, o astronauta está curtindo um merecido descanso, mas não vai demorar para que ele volte ao trabalho. Quem sabe se ele não vai tirar novas fotos?
Sugestão do camarada Chris Reid