Em meados da década de 1990, a Porsche decidiu entrar para a categoria GT1 de endurance – na prática, uma classe de protótipos que tinham versões de rua para homologação. Não havia muitas diretrizes no regulamento da FIA, exceto que seriam necessárias 25 unidades oferecidas ao público para que os carros de corrida pudessem competir.
A arma criada pela fabricante de Stuttgart para encarar as pistas foi o Porsche 911 GT1. O protótipo feito com base no Porsche 911 993 era feito sob medida para encarar, em especial, o McLaren F1, usando apenas a porção frontal da estrutura do 911 (mais teto e parte da área envidraçada) e completando com o arranjo mecânico do Porsche 962C, último grande representante do Grupo C, e responsável pelo cancelamento da categoria por parte da FIA. O 962C era veloz demais e não dava chances aos outros competidores.
O 911 GT1 teve uma carreira curta sob a batuta da Porsche, defendendo a equipe de fábrica por apenas três anos – 1996, 1997 e 1998, sendo que em seu último ano veio o triunfo nas 24 Horas de Le Mans. Depois disto, os exemplares que ainda tinham condições de competir foram vendidos a equipes particulares, e seguiram nas pistas até 2003, quando a GT1 foi extinta de uma vez por todas.
O visual de Porsche 911 que tomou bomba certamente ajudou o 911 GT1 a construir sua reputação – além do fato de, na prática, ser o primeiro nine-eleven a ter o motor instalado em posição central-traseira. O motor em questão, aliás, era um belo flat-six de 3,2 litros com bloco e cabeçotes de alumínio, quatro válvulas por cilindro, dois turbos KKK e arrefecimento líquido, capaz de entregar exatamente 600 cv, como mandava o limite imposto pelo regulamento.
Compartilhando boa parte de sua estrutura, incluindo o sistema de suspensão, com o Porsche 962, era evidente que o 911 GT1 seria um grande carro de corrida. Isto foi provado logo em sua estreia, em uma corrida de quatro horas no circuito britânico de Brands Hatch, na qual o bólido ficou com o primeiro lugar na categoria GT1, e foi selado de uma vez por todas nas 24 Horas de Le Mans de 1998. Mas o 911 GT1 também disputou dezenas de outras provas, fosse pela própria Porsche ou por equipes independentes.
Nas 24 Horas de Daytona de 1998, por exemplo, um Porsche 911 GT1 foi inscrito pela Larbre Competition. O carro de chassi nº 104 já havia disputado as 4 Horas de Donington e as 24 Horas de Le Mans pela Kremer Racing, equipe que havia sido contratada pela própria Porsche algumas vezes, mas jamais chegou a terminar uma corrida. Então, em 1998, o carro foi comprado pela Larbre, que já havia conseguido bons resultados nas 24 Horas de Le Mans em edições anteriores, incluindo duas vitórias na categoria de turismo em 1993 e 1994, com o Porsche 911 Carrera RSR.
Foto: Racings Sports Cars
Com o 911 GT1, a Larbre conseguiu o melhor resultado de sua existência até então: depois de largar na 16ª posição, os pilotos Christophe Bouchut, Patrice Goueslard, Carl Rosenblad e André Ahrlé conseguiram terminar a prova na terceira posição, atrás de outro Porsche 911 GT1 e da Ferrari 333 P, que venceu a corrida.
Depois disto, o carro foi vendido à Millenium Motorsport, que o pintou de amarelo e o vendeu à britânica G-Force, que incorporou as cores da empresa de lubrificantes Pennzoil (amarelo e preto) até se desfazer do carro em 1999.
Hoje em dia, o 911 GT1 #104 roda pelo Reino Unido emplacado e seu dono sai com ele em alguns fins de semana. Como assim?
Sim, você leu certo. Além dos 20 exemplares do Porsche 911 Strassenversion, modelo de homologação exigido pela FIA, há um carro de corrida que também pode rodar nas ruas. Henry Hope-Frost, do Goodwood Road and Racing, pega uma “carona” no carro neste vídeo, aproveitando que seu dono estava a caminho da 75ª edição do Goodwood Members Meeting, que rolou em março de 2017.
O 911 GT1 foi uma das atrações principais do evento neste ano, que celebrou justamente a categoria GT1 com um belo desfile de carros de corrida, incluindo o McLaren F1, a Ferrari F40 e o Mercedes-Benz CLK GTR.
Estes carros são raríssimos e caríssimos e, por esta razão, não participam de corridas durante o evento, e sim de “high speed demos”, desfiles em alta velocidade, porém sem levar os carros ao limite e sem ultrapassagens. O negócio não é competir, e sim colocar os carros para acelerar em um ambiente seguro e com menos riscos.
O 911 GT1 104 está, atualmente, com a pintura com a qual competiu nas 24 Horas de Daytona. Para ser transformado em um esportivo de rua, ele não precisou de muita coisa, na verdade: os dois turbos KKK estão trabalhando com pressão mínima (o que ainda resulta em 550 cv no motor flat-six de 3,2 litros), o sistema de escape recebeu catalisadores, o bocal de combustível foi adaptado para funcionar com bombas comuns, a suspensão foi recalibrada para ficar um pouco mais alta e macia e os pneus agora são próprios para uso em vias públicas. E, de acordo com o proprietário, foi só isso, mesmo. Nem foi tão burocrático assim conseguir uma placa personalizada, com o nº 104.
O 911 GT1 vem se juntar ao Jaguar XJ220 LM e ao Porsche 962C convertidos para uso nas ruas do Japão com suas pinturas de corrida intactas, que mostramos aqui no FlatOut em 2014. Achamos que já está na hora de juntar todos eles para um rolê…