O Mini é uma instituição da indústria automobilística britânica, apesar de a versão moderna ser alemã. E não é difícil de entender o motivo: a primeira geração, lançada em 1959, está entre os primeiros carros compactos com motor transversal e tração dianteira a fazer sucesso, mais de uma década antes do Golf Mk1 e do Fiat 127. Seu tamanho diminuto, a engenhosa suspensão independente com cones de borracha, o entre-eixos curto e o peso ridiculamente baixo (menos de 600 kg nas versões mais frugais) o tornavam aquilo que os britânicos chamam de a hoot to drive – uma delícia de guiar, em tradução livre.
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Todos os carros cresceram bastante nos últimos 20 ou 30 anos, então podemos perdoar que o mesmo tenha ocorrido com o Mini Hatch, lançado em 2000 sob a tutela da BMW. De lá para cá, embora os mais exigentes lamentem os quilos a mais, o hatchback retrô virou sensação, ganhou uma série de versões apimentadíssimas e não dá sinais de cansaço – tanto que sua versão elétrica, ousamos dizer, parece um carrinho urbano bem interessante.
Levando em conta o histórico do Mini e suas décadas de tradição como pocket rocket, não dá para conceber uma explicação racional para alguém transformá-lo em um monstrinho com motor V8 e tração traseira. Foi exatamente isso que fizeram com ele, porém – e não de um jeito tosco, improvisado ou exagerado. Ao contrário – parece um carro muito equilibrado e todas as adaptações foram feitas com capricho, com direito a acabamento de primeira.
Seria mais bacana se fosse o projeto de um entusiasta fazendo tudo em casa, claro, mas não dá para não exaltar o trabalho da empresa responsável – a britânica Powerflex. Os caras são especialistas, principalmente, em componentes de suspensão de alta performance para todas as gerações do “Mini BMW”. E, como toda empresa do ramo, de vez em quando eles fazem project cars para servir de vitrine para seu trabalho – e também para ter algo novo e divertido de acelerar. Deve ser ruim trabalhar assim, não?
O carro tem nome: “Vini”, de “V8 Mini”. Para manter tudo em casa, o V8 em questão é o S65 do BMW M3 E92 – aspirado e girador, capaz de entregar de fábrica 420 cv a 8.300 rpm e 40,8 kgfm de torque a 3.900 rpm – acompanhado do câmbio de dupla embreagem e sete marchas da Getrag e do sistema de tração traseira do M3. Mas o motor só foi escolhido depois que o monobloco já havia sido todo recortado e modificado com novas chapas de aço, longarinas e uma estrutura tubular feita sob medida.
O carro foi idealizado por David Power, dono da Powerflex, que era dono de um Porsche 928 mas queria algo menor, mais leve e mais “esperto”. Foi então que, em 2016, ele procurou Eliot Dunmore, da EDM Racing – outra empresa do Reino Unido que, desde 1990, monta carros para track day, subida de montanha, ralis e corridas de turismo. Embora a EDM Racing não seja exclusivamente voltada aos Subaru, é com eles que Dunmore tem mais afinidade. Depois de discutir varias ideias, os dois chegaram à conclusão quase arbitrária de montar um Mini com tração traseira.
O fato de o Mini ser bastante popular por aquelas bandas como base para projetos insanos foi um dos fatores, mas no fim das contas foi mesmo um insight – David gostava do visual do Mini, mas Dunmore lembrou o amigo das limitações do projeto, tanto pelo tamanho do cofre quanto pela tração dianteira. O caminho “natural”, então, foi resolver transformar o Mini em um carro de tração traseira “porque sim, ora essa!” Longe de nós questionar os motivos – o que interessa é o resultado.
Curiosamente, o projeto foi montado meio que às avessas. Antes de qualquer coisa, um Mini Cooper de segunda geração foi obtido e completamente desmontado. Depois, começaram as adaptações – incluindo a construção de uma nova parede corta-fogo, a refação de todo o assoalho (com a inclusão de um túnel central para o cardã) e, talvez o principal, a adoção de subchassis do Subaru Impreza na dianteira e na traseira. Primeiro, porque as dimensões batiam com as do Mini. Segundo, porque a suspensão dianteira do Impreza foi feita com o motor boxer em mente – o que naturalmente garantia mais espaço no cofre do Mini, assim como o posicionamento das barras estabilizadoras e da caixa de direção. Mesmo a medida das bitolas era muito próxima – e, como Power queria um visual relativamente stock, no fim das contas as peças de Subaru caíram sob medida. Sem falar no diferencial traseiro, que era robusto o suficiente para aguentar praticamente qualquer motor que a dupla pudesse escolher.
Pois é: só depois de preparar o monobloco e a suspensão foi que Power e Dunmore escolheram o motor. A primeira opção, obviamente, foi o boxer do Impreza. Depois, veio a idea de usar o seis-em-linha do M3 E36. Em ambos os casos, a parte frontal do motor ultrapassava as medidas do cofre. Então, um belo dia, David Power deu uma volta no BMW M3 E92 de um amigo e foi como se algo “clicasse” dentro do seu cérebro.
Mais curto e mais estreito que o flat-4 do Impreza, o motor caiu como uma luva no cofre recém-remodelado do Mini. E o câmbio também coube direitinho no espaço reservado a ele. Mais difícil foi fazer com que o conjunto de motor e câmbio funcionasse do jeito certo na “casa” nova – geralmente swaps com carros modernos trazem mais complicações eletrônicas do que problemas de packaging. Ou seja: fazer caber foi só o primeiro passo. Por sorte as coisas ficaram mais fáceis desde que sistemas eletrônicos aftermarket foram criados e se tornaram relativamente acessíveis.
O carro recebeu suspensão MacPherson na dianteira e na traseira, com braços feitos sob medida e amortecedores Bilstein específicos para o projeto. As rodas são um jogo de Braid Forged R, abrigando freios Alcon nas quatro rodas. Com pintura dourada, elas formam um conjunto essencialmente britânico ao lado da carroceria verde British Racing Green.
Agora, se o lado de fora não entrega nada do que está acontecendo debaixo do capô, o interior é praticamente o oposto. O design do painel, por exemplo, foi mantido, mas o acabamento foi todo feito em fibra de carbono – incluindo até os raios do volante. Um quadro de instrumentos digital aftermarket substituiu o cluster original, enquanto o console central recebeu uma série de botões para controlar as funções do carro.
Os bancos de fábrica foram trocados por um par de bancos concha Cobra Motorsports, revestidos com padronagem pied-de-poule e cintos de cinco pontos Schruth. Já o banco traseiro foi embora sem deixar substituto – até porque a parte de trás é ocupada pela gaiola de proteção e pelo tanque de combustível selado.
Tanta fibra de carbono resultou em um peso relativamente baixo: 1.300 kg – um belo naco a menos que o M3 E92. E, com entre-eixos bem mais curto, o carro virou um monstrinho muito esperto. Não foi por acaso que sua estreia ao público aconteceu nada menos que no Goodwood Festival of Speed de 2021, dividindo espaço com verdadeiras lendas do automobilismo e lançamentos importantes como o Lotus Emira. Deve ter feito bonito!