Se hoje temos supercarros, há quem acredite (e não é pouca gente) que devemos tudo ao Lamborghini Miura. Lançado em 1966, o Miura frequentemente é tido como o primeiro carro de alto desempenho com motor central-traseiro e espaço para dois ocupantes. Além de tudo, ele é absurdamente lindo — e valioso: um Miura impecável não custa menos de US$ 1 milhão, ou cerca de R$ 2,7 milhões.
O que esperar, então, de um exemplar ainda mais raro e extremamente bem conservado como este Miura SVJ? Bem, é o que você vai descobrir agora!
O Miura SVJ é uma variante especial que nasceu para as pistas e não tinha a aprovação de Ferruccio Lamborghini. Na verdade, nem mesmo o Miura original tinha a aprovação do chefe, que não gostava muito da ideia de um Lamborghini de apelo mais esportivo, com motor central-traseiro, perfil baixo e alto desempenho. Ele preferia os grand tourers, maiores, mais confortáveis e elegantes.
Por isso o Miura foi feito meio que por baixo dos panos — a equipe de engenharia trabalhou no projeto nas horas vagas (os melhores carros são feitos assim, aparentemente) e apresentou o primeiro protótipo no Salão de Genebra de 1966. Vendo a boa recepção do carro e a aprovação geral do público ao design de Marcello Gandini, só então Ferruccio Lamborghini permitiu que o projeto tivesse sequência. O resto, como dizem, é história: o Miura foi produzido até 1973 e, no ano seguinte, substituído pelo Countach, que era radicalmente diferente mas acabou se tornando outro ícone.
Com baixo peso, um V12 de 3,9 litros e 350 cv montado na transversal acoplado a uma caixa manual de cinco marchas e suspensão independente com braços sobrepostos do tipo duplo wishbone e molas helicoidais nas quatro rodas, o Miura fazia exatamente o que os engenheiros pretendiam: era um carro bem rápido, capaz de chegar aos 100 km/h em sete segundos (lembre-se, era 1966) e confortável o bastante para que seu dono o levasse rodando até o autódromo, se divertisse bastante e voltasse para casa dirigindo.
Só que um dos engenheiros envolvidos no projeto desde o início, Bob Wallace, sabia que o Miura tinha potencial para mais e, em 1970, decidiu provar para seu chefe que estava certo. Assim, no fim de 1971 ele pegou um Miura e o modificou para adequá-lo ao Apêndice J do regulamento da FIA, que ditava as regras para corridas de carros de turismo.
O chamado Miura Jota recebeu diversas modificações: a estrutura do tipo monobloco recebeu reforços de cromo molibdênio (mesmo material usado nos karts profissionais hoje em dia) para ficar mais rígida, os tanques de combustível foram reposicionados para as soleiras das portas para melhorar a distribuição do peso, a carroceria, que usava alumínio e aço, passou a ser toda de alumínio, os vidros laterais foram trocados por peças de plástico, o interior perdeu boa parte dos itens de conforto e os para-lamas foram alargados para acomodar bitolas e rodas mais largas. O carro pesava cerca de 360 kg a menos que um Miura normal — que levava o ponteiro da balança até os 1.298 kg.
O motor, por sua vez, era uma versão do V12 que originalmente entregava 385 cv, e recebeu aumento na taxa de compressão para 11,5:1, novos comandos de válvulas, ignição eletrônica, cárter seco e escape menos para entregar 440 cv. Visualmente, o Miura Jota tinha novos faróis fixos, cobertos por uma proteção de acrílico, e um discreto spoiler dianteiro.
Depois de pronto, o carro realizou uma bateria de testes de 20.000 km. O que aconteceu depois não é muito claro — sabe-se apenas que Ferruccio determinou o cancelamento do projeto pois não tinha interesse em colocar o Miura para competir. Dizem que ele mandou o Jota para o ferro-velho, mas que o carro foi salvo e vendido para um milionário italiano que, por sua vez, manteve as modificações e mandou o carro para ser restaurado. Contudo, o Miura Jota nunca voltou para sua garagem, pois foi destruído em um acidente em uma autostrada italiana.
E é aí que começa a história deste carro: ainda que o Miura Jota original não existisse mais, sua existência ficou conhecida entre os entusiastas e proprietários, e alguns deles acabaram encomendando à fábrica algumas das modificações realizadas por Wallace ou todas elas. Cinco deles foram feitos — dois do zero e três conversões. O carro das fotos é um dos modelos convertidos.
Trata-se de um Miura SV 1971 que, de acordo com documentos oficiais da Lamborghini, foi convertido em 1974. O carro, originalmente, era branco com o interior azul, mas seu dono pediu que fosse pintado de vermelho e dourado com interior caramelo. O motor recebeu preparação leve, enquanto algumas características originais, como a localização do tanque de combustível, foram preservadas.
Depois de pronto, o carro foi importado para o Japão, onde trocou de mãos pelo menos três vezes até ser restaurado no fim da década de 1980. Em 2007 o carro foi enviado para os Estados Unidos e restaurado novamente, desta vez com a supervisão de Claudio Zampolli, engenheiro que cuidou de alguns projetos especiais da Lamborghini nos anos 60 e 70.
O processo de restauração foi feito pelo especialista em Miura Gary Bobillef, que ficou surpreso com o bom estado da mecânica e da carroceria do carro, e custou US$ 225 mil (cerca de R$ 600 mil). Agora, o carro será leiloado no estado do Arizona, que acontecerá durante os dias 15 e 16 de janeiro.
A estimativa é que o carro seja arrematado por algo entre US$ 2 milhões e US$ 2,6 milhões, ou algo entre R$ 5,3 milhões e R$ 6,9 milhões. É… 2015 promete!