Existem no mundo algumas configurações diferentes para o conjunto mecânico de um carro. Motor transversal e tração na dianteira garantem um arranjo mais compacto e menores perdas mecânicas. Motor central-traseiro, normalmente em superesportivos, favorece o comportamento dinâmico. Motor traseiro e tração traseira, como no Porsche 911, é um layout tradicional que concentra o peso atrás e torna a condução bastante arisca.
O que todas estas configurações têm em comum? Todas elas são aplicadas de forma prática pela indústria automotiva, e todas elas têm situações em que são mais adequadas. E todas fazem sentido de alguma forma.
Agora, você já viu um carro com motor traseiro e tração dianteira? A gente também não, até agora. Porque foi exatamente o que os criadores deste Mini Cooper fizeram. E mais: o motor que fica lá atrás é um V8!
Você deve estar se perguntando por que alguém faria isto. Acontece que este tipo de coisa raramente tem uma justificativa plausível – ao menos do ponto de vista técnico. E, nesse caso, não é diferente: foi mais uma questão de “será que dá?”
O ano era 1965. O Mini, lançado seis anos antes, em 1959, já havia passado pelo crivo do público, que adotou em massa aquele carrinho simpático, barato, prático e relativamente confortável para seu tamanho e preço. Acontece que, sendo um carro britânico, o Mini já trazia inerentes características de um driver’s car, com baixo peso, balanços virtualmente inexistentes, entre-eixos curto e suspensão bem acertada. Não foi à toa que, em 1964, 1965 e 1967, o Mini venceu o desafiador Rali Monte Carlo com tração dianteira e motor de um litro e 70 cv – potência bem mais modesta que a dos rivais.
Provas de turismo com carros compactos são populares até hoje no Reino Unido, e a preparadora britânica BRT era uma das várias que estavam envolvidas neste universo durante a década de 1960. A companhia era comandada por um cara chamado Harry Ratcliffe (quase uma mistura de Harry Potter e Daniel Radcliffe, não?), que já tinha alguma experiência pilotando e modificando carros compactos, como o Ford Anglia e o Morris Minor em eventos de club racing em autódromos no interior da Inglaterra.
A ideia de colocar um motor V8 no porta-malas de um Mini Cooper deve ter surgido simplesmente porque nunca ninguém havia feito isto antes. Seria uma maneira de atrair publicidade para a BRT – desde a época dos shows de horrores ficou claro que o ser humano sente um apelo peculiar pelo bizarro.
Os pneus exageradamente grandes na dianteira davam a pista de que havia algo errado com aquele carro. Ao abrir o capô, você então via que o pequeno quatro-cilindros de 1,1 litro original havia dado lugar a um tanque de combustível. Também era possível ver os semi-eixos dianteiros de Mini Cooper S, devidamente acoplados ao diferencial de um Jaguar E-Type, que ficava virado de cabeça para baixo. Os semi-eixos eram conectados a cubos de Mini Cooper S, com rodas de 13 polegadas – enormes para um Mini, exigindo que se alargasse os para-lamas.
Um cardã de 90 cm percorria o carro, ligado ao câmbio manual de quatro marchas do E-Type. O motor era um V8 Buick de 3,5 litros, alimentado por um carburador Rochester 2GC de corpo duplo e capaz de entregar 155 cv. Ficava montado em um subchassi feito sob medida na traseira. O interior de um Mini já é frugal por natureza e, por isto, não ficou muito diferente do original. Todos os instrumentos funcionavam perfeitamente, inclusive.
A BRT tinha outros exemplares do Mini preparados para corridas – carros mais tradicionais, com o quatro-cilindros na dianteira –, que eram usados para competir de forma séria. O Mini com V8 na traseira era mais um show car, feito para entreter o público e mostrar o que a preparadora era capaz de fazer. Mas, no fim das contas, os pilotos também se divertiam bastante.
Não porque o Mini V8 era bom de guiar, mas porque ele era incrivelmente traiçoeiro, dando um nó na física dos carros de corrida com sua configuração mecânica invertida.
Você já deve ter ouvido falar que o segredo para pilotar um Porsche 911 é controlar a traseira dando toques gentis e calculados no acelerador. Isto acontece porque, com o peso atrás do eixo traseiro, o sobresterço é praticamente inevitável. A situação no Mini é parecida, mas com um agravante: o eixo motriz fica na frente, puxando o peso “morto” do motor na traseira – guardadas as devidas proporções, como se o carro estivesse rebocando um trailer. Nem mesmo a bateria, o radiador e o tanque de combustível na dianteira, que em tese tornariam as coisas mais equilibradas, ajudavam muito.
Além disso, o entre-eixos curtíssimo do Mini causava menos inércia polar, o que por sua vez fazia com que o carro mudasse de direção com muita facilidade e, ocasionalmente, rodasse logo de uma vez. , dedicado à história e à preparação do Mini original, Harry descreveu uma vez a pilotagem do Mini V8 como “atirar um martelo pelo cabo”.
Foi a pior e a melhor coisa que eu já fiz. A melhor coisa por causa de toda a publicidade que ele nos trouxe, especialmente no circuito de Oulton Park. Em uma corrida, você tinha uma boa chance de ficar em uma boa posição porque ninguém conseguia te ultrapassar, porque o carro ficava deslizando por toda a pista!
O carro foi aposentado alguns anos depois e, depois disso, foi trancafiado em uma garagem por 30 anos. Até recentemente, a revendedora britânica JD Classics tinha o carro anunciado em seu acervo, mas alguém o comprou.