Ao longo das décadas (não anos, décadas), o alemão Walter Röhrl acumulou diversas conquistas no WRC, com 14 vitórias e dois títulos, além de ajudar a Audi a se tornar um dos maiores nomes do rali mundial nos anos 80, ao comando do Audi Quattro e suas variações. Pouca gente sabe, porém, que sua carreira no WRC começou em 1973, primeiro ano da competição, ao volante de um Opel Ascona.
Nove anos depois, em 1982, Röhrl conquistaria seu segundo título do campeonato de pilotos do Mundial de Rali. Coincidentemente (ou não), seu carro também era um Opel Ascona – desta vez, no Grupo B, a categoria mais extrema da história do WRC. Acontece que, quando pensamos nos carros que fizeram história no maior campeonato de rali do planeta, raramente o Ascona 400 (nome da versão do Ascona para o Grupo B) vem à mente.
O fato é que, em 1975, um Opel Ascona de primeira geração venceu o Rali de Acropolis, na Grécia, com Walter Röhrl ao volante. Caso você não se lembre, o Opel Ascona é o carro alemão que, em sua terceira geração, deu origem ao nosso conhecido Monza. Nos anos 70, porém, ele era um carro um tanto diferente por conta do motor longitudinal e da tração traseira. Por outro lado, com um pouco de imaginação, sua silhueta até lembrava a do Monza (especialmente a coluna C).
O motor era um quatro-cilindros de 1,9 litro derivado daquele usado nos modelos de rua, porém preparado para render mais que o dobro da potência: de 90 para 206 cv. Pode não parecer muito agora, mas lembre-se que aqueles eram os anos 70 e que o Ascona pesava apenas 950 kg. Foi o bastante não apenas para garantir a primeira vitória de Röhrl no WRC em 1975, mas também para conquistar o título do Campeonato Europeu de Rali no ano anterior.
Acontece que, como você deve saber, nos anos 70 o WRC foi dominado por carros menores, como o Lancia Stratos e o Fiat 131 Abarth – tendência que só foi se acentuando com o passar dos anos. Enquanto o Ascona ia comendo pelas beiradas no Mundial de Rali, sem resultados expressivos, os rivais começavam a usar como base hatchbacks de tração dianteira (veja o Lancia Delta HF 4WD, por exemplo).
Remando na direção contrária, a Opel decidiu criar não um, mas dois carros de rali baseados em modelos médios: o Ascona, que havia acabado de chegar a sua segunda geração, e o Manta, versão cupê de apelo mais esportivo do Ascona. Ambos foram desenvolvidos juntos, usavam os mesmos componentes e competiram ao mesmo tempo, mas o Ascona se saiu melhor. Ah, e ambos receberam o sobrenome “400”.
O quanto? Basta dizer que, com o Ascona 400, Walter Röhrl conseguiu seu segundo título no WRC – em 1982, primeiro ano do Grupo B. O Manta 400, por sua vez, conseguiu mais destaque em campeonatos regionais. Também era um excelente carro, mas sua estreia em 1979 foi marcada por diversos problemas mecânicos, pelos quais o Ascona não passou.
É provável que tenha sido apenas má sorte, visto que a única diferença entre os dois carros era mesmo o formato da carroceria. O motor, desenvolvido pela Cosworth, usava um cabeçote de 16 válvulas feito sob medida, o bloco do motor 2.0 CIH (Cam-in-Head, com o comando ao lado das válvulas) com diâmetro ampliado, e o virabrequim do motor CIH a diesel de 2,3 litros. O resultado foi um motor de 2,4 litros que entregava 255 cv e podia ser preparado para render algo próximo dos 350 cv sem qualquer tipo de indução forçada.
Já a carroceria e o interior ficaram sob a responsabilidade da Irmscher, preparadora alemã que cultivava uma relação de longa data com a Opel e desenvolveu novos para-lamas, mais largos; além de portas, capô e tampa do porta-malas mais leves.
A estreia do Ascona e do Manta aconteceu em 1980, com o sueco Anders Küllang como piloto principal da equipe de fábrica. Foi o último ano de glória da Fiat com o 131 Abarth, que conquistou seu terceiro título de construtores consecutivo enquanto Walter Röhrl, que corria pelos italianos, levantou pela primeira vez a taça dos pilotos. A Opel, contudo, conseguiu uma temporada consistente, com o Ascona de Küllang vencendo na Suécia e conquistando, no final da temporada, 71 pontos, suficientes para um quinto lugar no campeonato de construtores.
Em 1981, os melhores resultados do Ascona 400 foram dois terceiros lugares, em Monte Carlo e em San Remo, conquistados respectivamente pelo alemão Jochi Kleint e pelo italiano Tony Fassina.
A glória só viria no ano seguinte com Walter Röhrl entrando para o time. O piloto alemão conquistou duas vitórias, em Monte Carlo e na Costa do Marfim. Parece pouco, mas é preciso lembrar que 1982 foi o primeiro ano do Grupo B, e o Ascona 400 era um carro que já estava ultrapassado, sendo um dos poucos que ainda tinham motor aspirado e tração traseira em uma era cheia de carros turbinados com tração integral.
As duas vitórias de Röhrl, mais seis subidas ao pódio em 12 etapas, garantiram que Röhrl conseguisse 109 pontos ao fim da temporada – 12 pontos à frente de Michèle Mouton, a segunda colocada. No campeonato de construtores, porém, a Audi se deu melhor, ficando com o título de construtores por uma vantagem de… 12 pontos.
Nos anos seguintes a situação do Ascona e do Manta não melhorou – pelo contrário, os rivais desenvolviam protótipos cada vez mais insanos especialmente para o Grupo B, enquanto os recursos financeiros da equipe de fábrica da Opel não permitiam tal coisa. Assim, depois de mais duas temporadas sem resultados expressivos (fora uma vitória com Ari Vatanen no Safari Rali em 1983), a tanto o Ascona quanto o Manta deixaram o WRC em 1985.
O outro legado de Ari Vatanen com o Opel Manta: “Dear God!”