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Car Culture História

LM002, ou “Lambo do Rambo”: quando a Lamborghini decidiu fazer um SUV pela primeira vez

A esta altura, boa parte dos leitores deve saber que a Lamborghini já vendeu um SUV — o LM002, também conhecido como “Lambo do Rambo”. Aos que não sabem, é verdade: houve um tempo em que você poderia entrar em uma concessionária da Lamborghini e sair de lá com um enorme utilitário com interior luxuoso, tração integral e motor V12. Tudo isso nos anos 80 — claro, em que outra época poderia ser?

Tudo começou em meados da década de 70, quando o governo dos EUA decidiu que precisava de um veículo maior e mais robusto do que o Jeep Willys para transportar os soldados do exército americano. Em 1979, decidiu-se que o High Mobility Multipurpose Wheeled Vehicle (HMMWV, ou simplesmente Humvee) seria o escolhido — mais tarde, ele daria origem à Hummer e os gigantescos H1, H2 e H3.

2004 Hummer H1

Can’t touch this

Mas a AM General, que fabricava o Humvee, não foi a única empresa a apresentar uma proposta ao governo americano. Do outro lado do Atlântico havia outra companhia interessada em fornecer um novo meio de transporte para os soldados (e receber uma boa grana para isto): a Lamborghini. No mínimo, inesperado, mas gostamos de imaginar que parte do lucro seria revertido no desenvolvimento de supercarros ainda mais fodásticos que o Countach (falando nisso, já leu nosso post sobre os motivos que tornam o Countach um dos supercarros mais incríveis de todos os tempos? Se não, confira aqui!)

Enfim, em 1977 a Lamborghini apresentou seu projeto no Salão de Genebra. O chamado Cheetah era bem um Lamborghini, e sim um conceito desenhado por Rodney Pharris, da Mobility Technologies International, ou MTI, empresa contratada pelo governo americano justamente para desenvolver veículos militares. Ele foi construído na Califórnia, e não na Itália, e enviado depois para que a empresa de Sant’Agata cuidasse dos detalhes finais e instalasse o motor. Este não era um V12 Lamborghini (ainda), e sim um V8 Chrysler de 5,8 litros montado em posição central-traseira, aliado a uma transmissão automática TorqueFlite de três velocidades.

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O Cheetah teve dois problemas graves: primeiro, ele era a prova material de que veículos off-road não podem ter motor central-traseiro. Além de pouco potente (só 190 cv) o V8 Chrysler era pesado e comprometia a dinâmica do Cheetah, que acabou descartado pelos US of A antes mesmo de ser testado. Bastou uma demonstração com seu projetista ao volante para que a Lamborghini recebesse um sonoro “não”.

O comercial feito para que a Lamborghini apresentasse o Cheetah para possíveis clientes

O outro problema era que Pharis se inspirou demais em outro veículo militar, o FMC XR311, na hora de projetar o Cheetah. A FMC havia vendido dez exemplares do XR311 para o governo americano alguns anos antes, e o Cheetah era praticamente uma cópia dele.

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Em cima, o FMC XR311. Embaixo, o Cheetah

A FMC acabou processando a Lamborghini antes da apresentação do utilitário em Genebra, mas pelo visto não conseguiu provar nada — e os dois utilitários “gêmeos” clarameante influenciaram o design do Humvee.

No fim das contas, o Cheetah foi um fracasso e acabou causando um grande prejuízo à Lamborghini, contribuindo para a falência da companhia ainda naquele 1977.

No ano seguinte a Lamborghini passou para as mãos dos suíços Jean-Claude e Patrick Mimran, investidores do ramo alimentício, porém apaixonados por carros esportivos. Eles injetaram uma boa quantia na companhia, lançaram o Jalpa — um Lamborghini de entrada razoavelmente bem sucedido, que veio antes do Gallardo — e investiram em versões especiais para o Countach. O investimento se provou bem acertado, porque a Lamborghini conseguiu se recuperar financeiramente nos primeiros anos da década de 80, e incluiu até mesmo uma retomada no projeto do Cheetah.

O protótipo LM001 foi apresentado ao lado do Jalpa, no Salão de Genebra de 1981. Seu nome pode significar tanto “Lamborghini Militaria 001” quanto “Lamborghini Mimran 001” — depende da fonte que você consultar. O que importa é que, embora não parecesse, era uma evolução do Cheetah, mantendo até mesmo o motor central-traseiro, desta vez um AMC de 5,9 litros e… 180 cv. Apesar de fraco, o motor ainda era capaz de levar o LM001 aos 160 km/h — algo impressionante para a época —, mas a traseira pesada trouxe os mesmos problemas dinâmicos do Cheetah.

A ideia ainda era criar um veículo militar, mas não mais para os EUA — o público-alvo da vez eram os países do Oriente Médio, que já haviam demonstrado interesse no Cheetah. Contudo, para tornar o LM001 um off-roader viável nos desertos árabes, era preciso que aquele motor mudasse de lugar.

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E assim surgiu o LMA002. O “A” era de “Anteriore”, por causa do motor que finalmente foi reposicionado para a dianteira. E também não era um V8 americano, e sim um legítimo V12 Lamborghini — mais precisamente, o V12 de 4,75 litros usado no Countach LP500S.

O reposicionamento do motor exigiu uma reformulação na estrutura do SUV, mas também garantiu espaço para seis pessoas atrás — o que, somado aos quatro lugares na cabine, permitia que dez pessoas se acomodassem no protótipo. O salto de potência também era gigantesco: o LMA002 passou a ter um motor de 375 cv alimentado por seis carburadores Weber, o que garantia um desempenho bem melhor aliado ao novo câmbio ZF de cinco marchas.

As coisas finalmente estavam caminhando como deveriam, e o protótipo apresentado no Salão de Genebra de 1982 foi cuidadosamente aperfeiçoado pelos quatro anos que se seguiram até que, no Salão de Bruxelas de 1986, a Lamborghini revelou a versão de produção de seu utilitário, agora batizado de LM002.

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Embora visualmente o LM002 seja bastante parecido com o protótipo que lhe deu origem, sua proposta era bem diferente. Enquanto o LMA002 fora pensado para aplicações militares no Oriente Médio, um V12 Lamborghini não era o motor ideal para isso — e sim um turbodiesel. Sendo assim, a Lamborghini decidiu transformar seu SUV em um super-jipe de luxo com extremas capacidades off-road, mais ou menos como um Land Rover elevado ao quadrado.

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Assim, o LM002 tinha, além de seus 375 cv e tração integral, um interior muito amplo e espaçoso, coberto com couro italiano da melhor qualidade por todos os lado e equipado com vidros elétricos, ar-condicionado e som Alpine.

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A ideia de um utilitário de luxo com origens militares atrai compradores desde sempre — basta olhar para sucesso dos Mercedes Classe G, dos Jeep e do próprio Hummer. Com o Lamborghini LM002 não foi diferente, e logo os mesmos compradores que o rejeitaram como veículo militar se interessaram por ele como uma fortaleza sobre rodas — Usay Hussein, filho de Saddam Hussein, e Muamar Gaddafi, o ex-ditador líbio, encomendaram os seus, e o primeiro LM002 produzido foi direto para a garagem do rei Hassan de Marrocos.  Dizem até que eles acabaram por ceder e encomendar frotas do LM002 para seus exércitos, mas estas informações jamais foram confirmadas.

Logo, outros famosos cederam aos encantos do LM002 — Mike Tyson, o campeão de Fórmula 1 de 1982 Keke Rosberg e Sylvester Stallone, para citar alguns. Este último foi o que rendeu ao LM002 o apelido de “Rambo Lambo”. Ao todo, entre 301 e 328 LM002 foram produzidos ao longo de sete anos — e a Lamborghini chegou até mesmo a desenvolver uma versão de 600 cv para o rali Paris-Dakar, mas ela acabou não competindo.

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Estamos falando de um utilitário esportivo gigantesco capaz de acelerar de 0 a 100 km/h em oito segundos e chegar a 210 km/h no asfalto e 180 km/h na areia — onde se movia com desenvoltura graças aos pneus Pirelli Scorpion de medidas 325/60R17, desenvolvidos especialmente para ele —  mesmo pesando 2.700 kg. Caso o dono não achasse que esta força era suficiente, dizem que era possível encomendar um V12 de 7,2 litros usado em lanchas de corrida — e que cabia perfeitamente em seu cofre. Pelo menos um LM002 foi encomendado com este motor, mas ele não existe mais.

Dá para dizer que o M002 ajudou a Lamborghini a se reestabelecer financeiramente depois de ser adquirida pela Chrysler, em 1987. Sendo assim, também podemos concluir que ele foi o precursor da tendência que os fabricantes de esportivos apresentam hoje — lançar um utilitário de grife para ajudar a sustentar o desenvolvimento de seus modelos mais rápidos e famosos, porém menos lucrativos. A Porsche aprendeu direitinho, usando as vendas do Cayenne (e, a partir de agora, do Macan) para financiar o desenvolvimento do 911 como bem entender.

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Nos próximos anos, a Lamborghini também vai voltar ao caminho que ajudou a traçar, projetando o lançamento de seu novo SUV, o Urus, para 2017. Agora tudo faz sentido, não faz?