Carros de homologação foram criados com um intuito simples: garantir a relação entre os carros de corrida e os de rua, além de limitar os malabarismos dos fabricantes endinheirados. A tática nem sempre deu certo, já que toda e qualquer brecha era usada e abusada pelos projetistas mais sagazes. Certo ou errado, esse tipo de regulamento rendeu alguns dos maiores carros dos sonhos. Estas são as séries de homologação mais legais já criadas.
Lancia Delta HF Integrale Evoluzione
Em 1991 a Lancia começou a construção do lote final de homologação de seu Delta. Como um bom italiano de alto desempenho, o nome extenso apresenta todas as suas características: HF, que caracteriza os Lancia de alto desempenho, “Integrale” para identificar a tração integral e “Evoluzione”, que indica que é uma série de homologação para o Grupo A da FIA.
O modelo Evoluzione recebeu para-lamas mais largos para acomodar os novos eixos, novos discos de freio, um remapeamento no motor 2.0 turbo que passou a produzir 210 cv e o transformou em um dos grandes hot hatches de todos os tempos. Infelizmente, foi o último grande Lancia produzido. A marca passou por uma reestruturação que a reposicionou como uma marca de carros mais requintados, logo acima dos Fiat.
Fiat Oggi CSS
A versão Comfort Super Sport (CSS) do Oggi foi a única série criada para fins de homologação no Brasil. O campeonato era o Brasileiro de Marcas e Pilotos, que a Fiat recém conquistara no ano de lançamento do pequeno sedã. Vendo uma oportunidade de divulgar o modelo na categoria, a marca construiu 300 unidades para homologar o motor 1.4 (1415 cm³, mais precisamente, que era elevado para 1490 cm³ nas versões de pista), usando uma configuração digna de um italianinho invocado: cabeçote com fluxo otimizado, carburador maior, cilindrada aumentada, homocinéticas reforçadas, câmbio de relações encurtadas, barra estabilizadora mais grossa e bandejas traseiras maiores – que deram ao Oggi aquele visual bacanudo da cambagem negativa. Com as modificações o conjunto ganhou 19 cv, fôlego suficiente para competir com os rivais de 1,6 litro.
Para completar o pacote a Fiat dedicou algum tempo ao visual do carro, equipando-o com novos retrovisores, rodas de liga leve exclusivas, cintos de segurança vermelhos, pintura preta com grafismos em vermelho e um volante esportivo igual ao do Lancia Stratos. Uma preparação cuidadosa que jamais seria vista novamente no país.
Mercedes-Benz CLK GTR
Ao contrário do que mandam as regras de homologação, o CLK GTR só chegou às ruas depois de ser campeão nas pistas. Isso aconteceu devido a um relaxamento da FIA em relação à homologação, que permitiu que a Mercedes disputasse o campeonato tendo fabricado apenas uma unidade do modelo e guardando-a consigo. As demais unidades (25 ou 26, dependendo da fonte) foram produzidas e comercializadas depois que o carro já havia se aposentado das pistas. Tinha 620 cv, 78 kgfm de torque e chegava aos 340 km/h, velocidade limitada pela downforce da asa traseira.
Dodge Daytona e Plymouth Superbird
O Plymouth Superbird e o Dodge Daytona foram o jeito americano de transformar a aerodinâmica de tijolo dos muscle cars em algo capaz de cortar o vento. Derivados da mesma plataforma – a Chrysler B-Body – eles tornaram-se recordistas de velocidade, superando as 200 mph (320 km/h) e justamente por isso foram banidos das pistas. Não seria nada legal encostar em um daqueles aterrorizantes muros dos ovais a essa velocidade – quanto mais a bordo de um muscle car grandalhão.
Ferrari 288 GTO
Ao lado do Porsche 959, a Ferrari 288 GTO poderia ter sido o grande nome do Grupo B, se a categoria não tivesse sido extinta em 1987. Isso porque na metade dos anos 80, essa bonita macchina com motor V8 teve que ser produzida em série para ser homologada na categoria. Foram produzidas 272 unidades – 72 a mais do que as 200 necessárias (número que a torna ainda mais rara do que a F40), e algumas elas eram nada menos do que os carros de corrida transformados em carros de rua, visto que pouco mais de um ano depois o Grupo B morreria por causa dos desastres de 1986. O que isso tudo nos deixou? Uma bela Ferrari de 400 cv, e o primeiro carro de rua a ultrapassar os 300 km/h.
Além disso, a 288 cedeu o trono para a F40, que foi substituída pela F50 que, por sua vez, deu lugar à Enzo. É bom respeitarmos seu legado.
Porsche 911 GT1 Straßenversion
GT1 pode ser considerada o Grupo B do asfalto quando se trata em limites técnicos e bólidos de homologação para as ruas. O Porsche 911 GT1 Strassenversion é um fruto deste tolerante regulamento, que não estabeleceu número mínimo de unidades produzidas e ainda era ajudado por uma lei de emissões mais branda em 1998. Foi baseado na geração 993 do 911, mas do modelo original só tinha o nome e os faróis.
O motor era o típico boxer de seis cilindros, mas instalado em posição central e equipado com dois turbos, que rendia 600 cv nas pistas ou 544 cv nas ruas. Com sua origem nas pistas, seu motor central e seus 330 km/h de velocidade máxima, ele carrega em seu DNA a carga genética do lendário 962, cujo espírito gerou o Carrera GT.
Ford RS200
O RS200 é feio com aqueles faróis redondos, perfil esquisito devido ao entre-eixos curto e ao estranho conjunto de dutos de admissão e asa traseira. Mas, cá para nós: no mundo das corridas, há beleza maior do que a beleza da função? De todos os bólidos do Grupo B o RS200 foi o mais especializado de todos eles.
A carroceria em kevlar desenhada pelo estúdio Ghia abrigava um motor central de 2,1 litros e 550 cv declarados (na prática era bem mais potente) e um inovador sistema de balanceamento de torque. Com esses atributos ele chega aos 100 km/h antes de você terminar de dizer “ford-erre-esse-duzentos”.
Mitsubishi Lancer Evo e Subaru Impreza WRX
Um gearhead não precisa ter vários superesportivos na garagem, afinal carros foram feitos para ser guiados e usados de verdade, e é impossível levar um supercarro para a pista todos os dias – imagine então um monte deles. O que é realmente legal no Subaru Impreza WRX STI e em seu rival Lancer Evolution, é que eles são versões anabolizadas de sedãs comuns que um pai de família compraria para levar os filhos para a escola e a esposa para as compras. Isso significa que você pode acelerar de zero ao McDonalds mais próximo em poucos segundos, mesmo na chuva.
Ambos têm tração 4×4, mais de 300 cv de potência, ótima dirigibilidade, e ainda espaço e praticidade de um sedã qualquer. São perfeitos para a cidade, mas se comportam maravilhosamente bem na pista e até na terra. Além disso qualquer mortal com a quantia certa de dinheiro e um mínimo de bom senso pode se divertir com eles. Crédito da foto: Motortrend
BMW M1
O único BMW de motor central tinha seu formato de cunha estilizado por Giugiaro e o seis-em-linha M88 com seis borboletas e injeção mecânica produzindo 277 cv em uma época em que os motores V8 da Ferrari paravam na casa dos 250 cv. Apenas 456 unidades foram construídas, a mão, pela BMW Motorsport para homologar o modelo para o Grupo 4 do Campeonato Mundial de Carros Esporte. Com o fim da produção em 1981, o motor M88 foi atualizado para equipar três grandes ícones da BMW Motorsport: o M635 CSi, o M5 E28 e o M5 E34.
Audi Quattro
Ele foi o Audi mais raro e caro já vendido, com apenas 220 unidades. Com seu motor de alumínio de 300 cv, uma carroceria tecnológica feita de fibra de vidro reforçada com Kevlar e alumínio (a Audi adora alumínio) e um sistema inovador de transmissão, ele mudou a forma que o mundo via os carros de tração integral. Não havia um diferencial pesado e barulhento, nem uma dinâmica terrível, muito menos um apetite voraz por gasolina. Depois de mudar o padrão dos carros de rali, o Audi Quattro definiu o padrão dos esportivos de rua do futuro.
Peugeot 205 T16
Para homologar seu 205 T6 para disputar o Grupo B, a Peugeot construiu 200 unidades da versão de rua do foguete da terra. Eles tinham o mesmo visual que o carro de rali, com para-lamas alargados e a seção traseira removível para acessar o motor instalado em posição central como no modelo de corrida, assim como a tração integral. Apesar das semelhanças, os modelos de rua tinham tinham pouco menos da metade da potência do carro de competição — cerca de 200 cv.
Lancia Stratos Stradale
O Lancia Stratos veio ao mundo exclusivamente como um carro de corridas — embora tenha sido inspirado em um carro conceito apresentado no Salão de Turim de 1971. No começo ele disputava o Grupo 5 da FIA, que não exigia produção mínima para os concorrentes. Quando a Lancia inscreveu o carro no Grupo 4 do WRC, a FIA exigiu uma produção mínima de 500 unidades para homologação. Como é comum nas versões de homologação o Lancia Stratos Stradale (seu nome de civil) tinha o mesmo motor da versão de competição, mas amansado para produzir 190 cv. Ainda era suficiente para levar o carro aos 100 km/h em menos de cinco segundos (em 1974!) e acelerar até os 232 km/h.
Mercedes-Benz 190E-16
No fim da década de 1970 a Mercedes competiu nos ralis com seus enormes cupês V8 da Classe SLC. Quando seu novo modelo de entrada, o 190E, foi lançado no começo dos anos 1980, a marca decidiu inscreve-los no mundial de rali, e por isso encomendou à Cosworth um motor com 320 cv para uma versão de corridas. Enquanto o carro era desenvolvido, a Audi apareceu com o Quattro e seu drivetrain com motor turbo e tração integral, fazendo com que o 190E ficasse obsoleto para a competição. Então a Mercedes mudou o foco, e foi da terra para o asfalto do Campeonato Alemão de Carros de Turismo (DTM).
Só que para disputar o campeonato, os carros deveriam ser baseados em modelos de rua. Assim, a Mercedes amansou o motor 2.3 16v e o instalou em seu sedã compacto, criando o 190E 2.3-16, de 185 cv e 23,6 mkgf de torque. O modelo estreou no Salão de Frankfurt de 1983, e foi a estrela da corrida inaugural do novo circuito GP de Nürburgring em 1984, quando o novato Ayrton Senna deu um baile na chuva nos maiores nomes da F1 da época. A entrada do 190E 2.3-16 no DTM, levou a BMW a desenvolver uma resposta à sua rival estrelada. Seu nome? BMW M3.