Neste último fim de semana, a Cosworth divulgou um teaser enigmático que exibia apenas a silhueta dos gêmeos Toyobaru sob o código do motor boxer 2.0 da Subaru — FA-20, deixando claro que prepara algo para o cupê BRZ. Ainda que as marcas não tenham divulgado detalhes sobre o que há por vir, a simples junção dos nomes Cosworth e Subaru na mesma frase foi suficiente para deixar metade do universo gearhead com crises de ansiedade. Por isso, decidimos aproveitar esse momento que antecede o nascimento de um desses carros para relembrar os melhores carros de rua da preparadora.
A história da Cosworth começa na Inglaterra em 1958, preparando motores para competições de monopostos leves. Em 1963, seus motores estrearam na Formula 1, equipando os carros da Stebro com um quatro-em-linha de 1,5 litro de 110 cv, um motor pequeno e discreto, mas que conseguiu levar a obscura equipe canadense ao sétimo lugar do GP dos EUA daquele ano.
A partir do surgimento do motor Double Four Valve (DFV), baseado no bloco V8 da Ford, a Cosworth obteve 176 vitórias na categoria e tornou-se a segunda maior vencedora de GPs da Fórmula 1, atrás somente dos motores Ferrari, que contabilizam 211 GPs vitoriosos (e 16 temporadas a mais).
A trajetória nas pistas seria suficiente para torná-la uma lenda automotiva, mas felizmente seu know-how pode ser visto em algumas raras máquinas liberadas para as ruas. A Série RS da Ford talvez seja a maior vitrine civil da marca. A parceria começou em 1959, quando a Cosworth preparou o motor Ford Kent dos sedãs Cortina. Desde então, cada Ford de rali e suas versões de rua para homologação foram movidos por um Cosworth. Os mais famosos dessa linhagem são o Sierra RS200 Cosworth, o pequeno RS200 e o Escort RS Cosworth.
RS200
Em 1980 a Ford planejava inscrever uma versão ultra-radical de tração traseira do Escort para disputar o Grupo B, mas uma série de problemas durante o desenvolvimento fizeram marca desistir do RS1700T, como ele seria chamado, em 1983. Para não desperdiçar os três anos de desenvolvimento, a marca decidiu aproveitar o que já estava pronto para fazer um novo projeto, desta vez com tração integral para encarar Peugeot 205 e Audi Quattro.
O resultado foi o RS200, um modelo inédito feito sobre chassi tubular, com motor 1.8 turbo desenvolvido pela Cosworth e carroceria de fibra de vidro produzida pela Reliant (sim, a fabricante britânica criadora do Robin). O 1.8 Cosworth tinha 250 cv na versão de rua e com apenas 1.050 kg ele era capaz de acelerar de zero a 100 km/h em 6 segundos, mas a velocidade máxima batia em “apenas” 225 km/h.
Em sua versão de competição, chegou a ter mais de 450 cv e o tempo de aceleração baixava para incríveis 3,2 segundos. Como vários outros modelos do Grupo B, o RS200 tornou-se um carro de rua devido à exigência de uma produção mínima de 200 unidades feita pela FIA para homologação.
Para 1987, a Ford planejava uma nova versão do carro com potência entre 550 e 850 cv, conhecida como Evolution, mas o fim do Grupo B cancelou os planos de evolução do modelo. Contudo, 24 dos 200 RS200 de rua foram transformados em modelos Evolution, e são capazes de acelerar de zero a 100 km/h em pouco mais de 2 segundos.
Sierra RS Cosworth
O Sierra Cosworth foi criado para homologar o modelo no Grupo A da FIA a pedido do diretor da Ford Motorsports Europe, Stuart Turner. Turner havia trabalhado na divisão de automobilismo da marca nos EUA, e foi um dos principais responsáveis pela criação do GT40 e do Ford-Cosworth DFV, o famoso motor da F1.
Para criar o RS Cosworth, a Ford recorreu à sua parceira Cosworth para trabalhar o motor do carro. A pedido da marca ele seria um 2.0 de 180 cv, mas a Cosworth só aceitaria um contrato para produzir 15.000 motores, no mínimo, e eles não teriam menos de 207 cv. A Ford topou, e em 1985 nasceu o Sierra RS Cosworth, lançado como modelo 1986. Na época, seu 2.0 turbo tornou-se o primeiro motor de um carro produzido em série a produzir mais de 100 cv por litro deslocado.
Ainda em 1987 a Ford lançou a versão RS500, limitada a 500 unidades, em uma tentativa de tornar o carro imbatível nas pistas. Eles foram convertidos de RS para RS500 pela Aston Martin Tickford, um divisão especializada em conversões de veículos que pertencia à Aston Martin na época. Os RS500 tinham turbina e intercooler maiores, suspensão retrabalhada e um spoiler adicional sob o famoso aerofólio “whale tail“. A potência subiu para 226 cv, que levavam o carro de zero a 100 km/h em 6,2 segundos e à velocidade máxima de 240 km/h.
Escort Cosworth
O Escort RS Cosworth e seu inconfundível aerofólio traseiro duplo foram um dos maiores ícones esportivos do início dos anos 1990. Inicialmente lançado para mais uma vez homologar o modelo para o WRC, ele não era exatamente um Escort, e sim uma versão do carro de rali (que era baseado no Sierra) relativamente amansada para as ruas.
“Relativamente” porque ele mantinha o sistema de tração integral e seu motor 2.0 gerava 227 cv de potência. O RS Cosworth fazia de zero a 100 km/h em 5,7 segundos e seguia ganhando velocidade até atingir a máxima de 237 km/h.
Entre 1992 e 1996 foram produzidos apenas 7.145 exemplares, mas apenas os primeiros 2.500 serviram à homologação da FIA e usavam turbina Garrett T3/T04B e não tinham acessórios de conveniência como teto solar e nem mesmo isolamento acústico.
Os modelos seguintes foram lançados no fim de 1994, e usavam turbina Garrett T25, que era menor e gerava menos turbo lag. A Ford trouxe dois desses modelos ao Brasil para exibição no Salão do Automóvel e testes em revistas especializadas.
Mercedes Benz 2.3-16 e 2.5-16
Na década de 1980 a Mercedes decidiu preparar um carro de 320 cv para disputar os ralis, no hoje extinto Grupo B, substituindo seus imensos coupés da Classe SL. A ideia era usar como base o novo 190E, com seu motor de quatro cilindros e 2,3 litros que desenvolvia 140 cv e os alemães acharam que seria uma boa ideia pedir aos criadores do motor DFV uma ajuda para desenvolver o powertrain do seu novo bólido.
Usando o bloco do motor M102 original dos 190E, o engenheiro Mike Hall criou um cabeçote de comando duplo de válvulas com 16 válvulas (as maiores que couberam na câmara de combustão), acionadas por tuchos fabricados em peça única. Os cabeçotes eram fundidos pelo método Coscast, no qual a liga metálica derretida não era derramada sobre o molde, e sim injetada sob pressão, tornando a liga mais resistente. Os pistões de cabeça plana levavam a compressão a uma razão de 10,5:1 e a medida sobrequadrada dos cilindros (95,5 mm de diâmetro e 80,25 mm de curso) permitiam que o motor girasse a 7.000 rpm.
Mas durante o processo a concorrente Audi lançou o Quattro, com a inovadora tração integral. Ciente da lavada que se arriscaria a tomar, a marca desistiu do 190 E de rali, mas resolveu levar adiante um projeto para competir no DTM, o campeonato alemão de turismo. Mais uma vez, para homologar o modelo na categoria, era preciso lançar o carro no mercado.
Daí surgiu o 190 2.3-16 Cosworth em 1984, uma versão mais pacífica para as ruas com 185 cv. Tinha velocidade máxima de 235 km/h e acelerava de zero a 100 km/h em 7,5 segundos. Um dos eventos publiciários do lançamento do carro foi uma corrida em Nürburgring com gente como Stirling Moss, Alain Prost, Niki Lauda e o jovem Ayrton Senna guiando modelos idênticos.
Em 1988 a Mercedes substituiu o motor 2.3 por um 2.5 que elevou a potência para 200 cv nas versões de rua equipadas com catalisador. Há quem diga que os 2.5 não foram desenvolvidos pela Cosworth, mas o fato é que a Mercedes não divulgava o fato de seu sedã bem sucedido nas pistas usava um cabeçote produzido por uma companhia britânica. Além disso, os cabeçotes fundidos pelo método Coscast tinham a marca do processo gravada no metal, e a Cosworth também tem registrado os códigos desses cabeçotes em seus arquivos.
Opel Vectra GSi, Astra GTE e Calibra
No Brasil há uma lenda sobre os motores C20XE que equiparam os Chevrolet Calibra e o Vectra GSi trazidos da Europa no começo da década de 1990. Uns dizem que eles foram desenvolvidos pela Cosworth e apenas fabricados pela Opel, enquanto outros falam que os cabeçotes desses motores são Cosworth e o bloco Opel. A segunda versão é a mais correta, embora não totalmente.
O motor C20XE foi desenvolvido por um engenheiro da Opel chamado Fritz Indra para ser usado pelo departamento de competições da marca. A Cosworth foi envolvida para produzir o cabeçote usando o método Coscast.
Acontece que somente os modelos produzidos entre 1988 e 1991 usavam o cabeçote Coscast, identificados pela marca “Coscast” próximo à terceira porta de escape do cabeçote (abaixo). A partir de 1992 o cabeçote passou a ser fabricado pela Opel, estreando no Astra GSi e mais tarde nos Vectra GSi e Calibra. Esses cabeçotes tinham pequenas diferenças de projeto em relação aos Coscast, além de serem fundidos pelo método tradicional.
Como o C20XE foi um motor adotado em carros produzidos em grande volume, dificilmente algum dos modelos importados acabou equipado com um cabeçote Coscast três ou quatro anos depois do encerramento da parceria com a Cosworth.
Subaru Impreza STI CS400
Em 2010 a Subaru anunciou uma parceria tão surpreendente quanto improvável com a Cosworth pra produzir uma versão especial do já especial Impreza STI. Apenas 75 unidades do STI receberam o sobrenome britânico, que deu ao motor 2.5 turbo um aumento de potência para 400 cv com turbo maior, nova admissão e reprogramação da ECU.
O Impreza “Cossie” também recebeu uma série de upgrades na dinâmica que incluíram novas pinças de freio de quatro pistões, amortecedores Bilstein e molas Eibach com mais carga que as originais. A aceleração era de absurdos 3,7 segundos e a velocidade máxima limitada eletronicamente a 250 km/h.