Olá! Me chamo Arthur Episcopo e me sinto honrado de escrever sobre eu e meu Barulhento aqui para vocês. Trata-se de um Ford Maverick Super Luxo 4 portas, ano 1974, que adquiri há pouco menos de três anos, em abril de 2011.
Bem, vamos começar com a minha história e paixão por carros e os “enferrujados” em geral… eu praticamente nasci dentro do Dodginho Polara de meu pai, como mostra a foto abaixo.
Logo depois vieram os grandes Ford: primeiro um Galaxie LTD que minha família (não os apedrejem mais do que eu já fiz!) usava de picape para transportar material para a obra em uma casa que construímos. Lembrem-se, no começo dos anos 1980 esses carros eram praticamente dados a quem se dispusesse a adotá-los – este LTD custou o equivalente a 36 pizzas na época. Pizzas? Sim, convertemos o valor em uma “moeda” que consumíamos muito – ao menos, era uma referência razoavelmente concreta em tempos de inflação exponencial.
Em 1982, após o Galaxie ter sido usado até literalmente se acabar, meu pai chegou em casa num belo dia com um Maverick Super cupê 1974, com motor seis cilindros em linha… Foi paixão à primeira vista! O carro era amarelo canário, com as faixas e o capô do GT fase I, com aquelas incríveis presilhas funcionais!
Aliás, devo dizer que o ano 1974 é bem recorrente lá em casa: o Dodginho de meu pai era 1974, o LTD era 1974, o primeiro Maverick era 1974, o atual também, e eu também sou ano e modelo 1974! Sou apenas dois meses mais antigo que meu Maverick atual, que foi fabricado em março (de acordo com o número de série) e vendido em abril – informação presente no recibo de retirada da concessionária, uma preciosidade que veio junto com o manual do proprietário.
Foram quinze anos de convivência, de “relacionamento amoroso” com aquele primeiro Maverick amarelo. Cresci ao lado dele, aprendi a dirigir nele (aos 11 anos – outros tempos!), tirei meus primeiros rachas (esperar o quê de um moleque nos anos 80/90 com um Maverick nas mãos?), dei meus primeiros amassos (ahhh, as maravilhas românticas dos bancos inteiriços!), fiz curtas e longas viagens (dormi incontáveis vezes ali dentro), passeios com a galera… Poxa, espero que a maioria de vocês tenha recordações tão boa com algum “companheiro” (não dá para tratar algo assim como um simples objeto) como eu tive com aquele Maverick! Muitos na época diziam que era o amor da minha vida…
O cowboy sou eu, com 11 anos, pouco depois de minhas primeiras aulas no volante do Maverick, numa estradinha de terra em São Roque! Na época ele já tinha sido reformado – e o amarelo vibrante foi trocado por este creme apagado. À direita: eu e o “Trovão Azul”, em 1996 – a foto está péssima, mas é a única que eu tenho dele com a aparência final
Mas a vida é uma caixinha de surpresas. Lá pelo começo de 1997, depois de incontáveis reformas para deixá-lo tinindo, sofri dois acidentes com o “Trovão Azul”(como dá pra ver na foto acima, eu troquei sua cor) em menos de 15 dias. Primeiro fui abalroado na lateral traseira por um caminhão. Dias depois peguei um bueiro destampado e rachei uma torre de suspensão.
Desanimei.
Sabia o trabalho que eu teria com funilaria para acertar aquele paralama traseiro, também sabia que seria quase impossível, com meus parcos recursos, deixar a suspensão alinhada depois de mandar cortar toda a estrutura de sustentação para fazer uma nova. Vendi meu Trovão com o coração partido…
Quatorze anos se passaram. Neste período, vi estes carros se valorizarem ao ponto de terem preços quase irracionais, e entristecido, imaginava que nunca mais teria a oportunidade de ter um Maverick ou qualquer antigo novamente…
Em 2010 me casei com uma garota que também gostava de carros antigos (entre outras muitas qualidades), e em nosso “acordo de casamento”, combinamos que compraríamos um carro relativamente novo para ela (um Focus), e na primeira oportunidade um antigo para mim. Assim teríamos um carro novo para passeios e viagens, e um antigo para curtir. Troquei de emprego e abracei todas as oportunidades de fazer horas extras que apareciam. Logo teria uma graninha que me permitiria sonhar com graxa novamente…
Estávamos casados há quase um ano, e eu, sempre investigando sites de compra (quase diariamente) à procura de oportunidades. E achei muita coisa interessante! Pensei: “é agora! Vou comprar meu monte de ferrugem de novo!” Quando fui compartilhar os planos com a Elis (minha esposa) e mostrar alguns carros que estavam dentro das minhas possibilidade, fiquei sabendo da melhor notícia de minha vida: minha herdeira estava “na linha de montagem”!
“Bem”, comentei, “acho que vamos ter que trocar o seu Focus por uma minivan, eu tenho um dinheirinho de reserva”. Nesta hora tive mais uma amostra de que casei com a mulher certa. Ela me disse: “a gente se vira com meu carro, porque está na hora de você comprar o seu antigo…”
Ahhhh!!!
Como falei lá em cima, eu já tinha um leque de carros que estava de olho. Uma Chevrolet “Boca de Sapo” com mecânica de Opala 4 cilindros, um Galaxie 500, dois Dodges quatro portas passáveis, sendo que era um raro Gran Sedan (o Barata vai me matar por eu não ter comprado esse!), alguns Opalas dos anos 70 e muitos, muitos Mavericks, na maioria de 4 e 6 cilindros. E entre eles, um belo sedã quatro portas, Super Luxo, Vermelho Cadmium, que o anúncio dizia ser V8. O dono ainda tinha, de quebra, um Landau 1974 e um LTD 1976 também à venda. Preciso dizer qual foi a primeira e única visita que fui fazer?
Cheguei cedinho no sábado, numa ruazinha sem saída em Guarulhos, encontrei o dono das relíquias e tentava, sem muito sucesso, disfarçar a ansiedade. Ele entrou na garagem apertada, abriu o portão de madeira pra cima e, de repente, lá estava aquele para-choque cromado, aqueles faróis redondos me encarando no fim daquele capô vermelho enorme… Minhas mãos e pernas perderam a firmeza. Ele foi dar a partida, e o motor não pegou… Abriu o capô e o coração da fera ficou exposto, cheio de promessas, enquanto pegava o carregador portátil para dar partida… Bateu a chave de volta e o ronco veio como um soco nos meus ouvidos! Sim, deu pra perceber que ele não estava no ponto, e sim, naquela garagem minúscula e com aqueles abafadores JK dava pra ficar surdo em questão de segundos.
E assim o “Barulhento” surgiu em minha vida.
O então dono engatou a primeira e saiu para aquela ruazinha estreitíssima – a ponto de ser possível manobrar o carro somente no fim da viela. Olhei sua lataria, suas curvas, seus cromados… PQP! Estava muito inteiro! Não estava perfeito, mas para um automóvel que na época tinha 37 anos e ainda vestia a pintura original de fábrica, ele estava quase tão íntegro quanto o Focus 2008 da Elis.
Ele parou do meu lado, passou para o lado do carona, abriu a porta e ofereceu: “quer dar uma volta?” Quase pulei pra dentro do carro. Alisei o volante de baquelite, acariciei a almofada do painel, senti como se estivesse encontrando alguém muito importante – um pedaço de meu passado e de minhas memórias que achava que estavam perdidos…
Engatei a primeira, mexendo para baixo a alavanca com acionamento na coluna, engatou como uma manteiga. Soltei o freio de estacionamento e começamos a nos mover. As sensações do passado vieram com tudo, e também veio a certeza de que os anos com carros modernos me transformaram num molenga! Quase bati de frente com o Focus estacionado, pois tinha me esquecido do quanto a direção de um Maverick pode ser pesada e imprecisa – ela não tinha folga, era um feriado prolongado com emenda de dois dias! Quase um carnaval…
Descemos para as ruas do bairro e tive que realmente usar os freios pela primeira vez. “Ele está com os freios dianteiros a tambor?”, perguntei. O dono nada disse…
Cabe uma observação aqui: muitos Mavericks de primeira geração (Fase I), tinham freios dianteiros a tambor. E se o Maverick tem fama de ter freios traseiros traiçoeiros, não queira imaginar o quanto que fica pior nos modelos em que os freios dianteiros são a tambor! Trocamos a suspensão dianteira inteira daquele meu primeiro carro só para colocar os discos ventilados do GT, já que na primeira chuvinha ou poça d’água os tambores dianteiros paravam de funcionar e o carro rodava até se freássemos a uns 40km/h!
Bem, o vermelhão não fazia curvas direito, freava menos ainda, não tinha cintos de segurança e estava com o motor completamente fora do ponto. Mas era glorioso, lindo, espetacular, orgásmico, vê-lo rodar e vivenciar a experiência de me acostumar a ele novamente, vendo aquele capô enorme iluminado pelo sol, sentindo a maciez da suspensão e das “poltronas” dianteiras, sentindo a disposição daquele motor surrado querendo ser acelerado (ou será que era aquele diabinho sentado no meu ombro sussurando em meu ouvido?) e ouvindo aquela sinfonia do V8 acordando metade do bairro! Olha eu até olhei os belos Landau e LTD que estavam guardados em outra garagem, mas já estava completamente enfeitiçado! Fechei negócio na hora. Dias depois ele levou o carro em casa.
Andei pouco, muito pouco com este carro em quase 3 anos, talvez uns 500 km. Mas cada momento foi especial. Nos próximos textos irei detalhar quais são os meus planos para o Barulhento, o que já fiz, os problemas e soluções que encontrei e quais as fases que defini para deixar o carro como sonhei.
Por Arthur Episcopo, Project Cars #48