Parece que foi ontem que a Volkswagen meteu o louco e criou um motor de doze cilindros totalmente diferente do que o mundo havia visto até então. O ano era 2001, e a Volkswagen estava sob o comando de ninguém menos que Ferdinand Piëch, o homem que revolucionou o grupo Volkswagen e, por acaso, deu outro significado ao “Volks”, tornando mais acessíveis coisas antes inimagináveis para o público da marca.
Foi sob o seu comando, por exemplo, que a Volkswagen evoluiu o Golf GTI para o Golf R — que, apesar de entregar o mesmo tipo de tração integral que os japoneses da Subaru e Mitsubishi já entregavam na época, foi o carro que colocou a câmbio de embreagem dupla nas mãos do povo.
Foi também sob a batuta de Piëch que o Passat deixou de ser o modelo mais luxuoso da marca, sendo superado pelo Phaeton — um sedã capaz de competir com BMW Série 7 e Mercedes-Benz Classe S. Um Volkswagen! E também foi com ele que, pasmem, a Volkswagen lançou um SUV desenvolvido em parceria com a Porsche.
Foram tempos muito loucos, olhando em retrospecto. Afinal, foi ele também quem arrematou a Bentley e a Lamborghini e finalmente tirou do papel o sonho do supercarro da Audi — isso, claro, antes de mencionar a idealização do “hipercarro”, o Bugatti Veyron. Tinha até Passat de oito cilindros! O Grupo Volkswagen foi mesmo uma força da natureza nessa época.
O adeus a Ferdinand Piëch, o homem que revolucionou Audi, Porsche, Bugatti e Volkswagen
Parte dessa força veio de um projeto inédito na época: o motor W12. Se a Volkswagen quisesse competir nos segmentos superiores, eles precisariam de mais que os quatro cilindros tipicamente usados pela marca. Mais que os V6 e VR6 dos anos 1990. Seria preciso ao menos oito cilindros. Doze seria perfeito para conquistar o público.
E foi assim que nasceram os motores em W da Volkswagen — o W8, o W12 (e também o W16 do Veyron, mas esse é para outra hora).
A história do motor W começou em um lugar improvável: uma viagem no trem Shinkansen, entre Tóquio e Nagoya, no Japão, em 1997. Depois de uma breve conversa com Karl-Heinz Neumann, então chefe do desenvolvimento de powertrain na Volkswagen, Piëch pegou um envelope e esboçou uma ideia que vinha rondando sua mente por algum tempo: se o motor VR6, que equipava o Golf, o Passat e vários outros modelos da Volkswagen, era compacto o bastante para ser instalado transversalmente nesses carros, a união de dois destes motores em V, faria um motor de 12 cilindros igualmente compacto para aplicações longitudinais. Como seriam duas bancadas em forma de V, ele seria um duplo V, ou… W. Nasceu assim a ideia e o nome.
Nessa mesma viagem, ainda desenvolvendo o raciocínio, Piëch vislumbrou um motor “compacto” de 18 cilindros. Bastaria usar a configuração W tradicional — então em desuso nos anos 1990 — mas com três motores W em vez de bancadas simples de cilindros. Assim, o W18 teria o comprimento aproximado de um motor de cinco cilindros.
De volta a Wolfsburg, Piëch começou a trabalhar em um supercarro conceitual para receber esse motor W12. Com design de Giugiaro, esse conceito ficou pronto para o Salão de Tóquio de 1997, realizado no final daquele ano, e foi batizado como W12 Syncro ou W12 Syncro Coupé. Seu motor era simplesmente dois VR6 2.8 inclinados e unidos pelo virabrequim. Assim, seu deslocamento era de 5,6 litros e, com indução atmosférica, era capaz de produzir 420 cv, que eram levados às quatro rodas pelo sistema Syncro — o antigo nome do atual 4Motion. Ali nasceu oficialmente o motor W12, apresentado para o mundo no local onde ele fora concebido meses antes.
No ano seguinte, o W12 voltou a aparecer no Salão de Genebra, desta vez em uma versão aberta do W12 Syncro, conhecida como W12 Syncro Roadster, que foi sucedido pelo mais famoso dos conceitos W12 da Volkswagen, o W12 Nardò, que dispensava o nome e o sistema Syncro para homenagear o lendário circuito oval de testes de velocidade — onde ele próprio conquistara um recorde, após percorrer 7.740 km em 24 horas, o que resultou em uma velocidade média de 323 km/h. O W12 estava mais que provado, não?
Apesar de parecer um carro pronto para as ruas, com seu W12 agora deslocando 6 litros para produzir 591 cv, o W12 Nardò nunca chegou às linhas de produção. Pode ter a ver com a decisão da Volkswagen em tirar o supercarro da Audi do papel, o que ajudaria na recriação do Lamborghini de entrada, algo fundamental para a viabilidade da marca italiana, recém-adquirida pela Volkswagen. O fato é que o W12 acabou chegando ao público de um jeito bem diferente: no cofre do Audi A8 2002 — o último ano da primeira geração. Uma decisão um tanto estranha, visto que o carro já estava no final de ciclo.
Depois o V12 foi parar no Bentley Continental GT 2003 (aquele desenhado pelo brasileiro Raul Pires) e só no ano seguinte estreou em um Volkswagen: o Phaeton W12 2004. Em 2005 foi a vez do Touareg ganhar o motor W12, o que o colocou a par do Porsche Cayenne Turbo, com os mesmos 450 cv, porém com indução atmosférica, em vez de dois turbos.
O W12 ainda deu origem ao mais raro dos motores Volkswagen: o W8, que foi produzido somente de 2001 a 2004 no raro Passat W8, que combinava o motor de oito cilindros, quatro litros e 275 cv ao câmbio manual de seis marchas (ou automático de cinco) ao sistema de tração integral, agora rebatizado como 4Motion.
Desde 2015 o W12 vinha sendo usado no Bentley Bentayga, o último modelo equipado com ele. Em sua configuração final, o W12 recebeu dois turbos e chegou aos 608 cv, mas agora ele deixará de ser produzido e dará lugar a um V8 convencional, combinado a um motor elétrico que o levará aos 700 cv — afinal, estamos a 11 anos do fim da combustão europeia, lembra?
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