Todos que viveram no século 20 sonharam, ainda que por um instante, com os carros voadores e tudo mais, mas ninguém imaginou que os Fuscas estariam por aí, entre carros semi-autônomos, carregados de eletrônica e sofisticação. Afinal, quem poderia dizer que um carro cuja produção iniciou há exatos 74 anos permaneceria tanto tempo nas ruas de todo o planeta?
Sim: o Fusca é, na prática, o KdF-Wagen idealizado por Ferdinand Porsche sob encomenda de Adolf Hitler, que pretendia motorizar a Alemanha com um carro barato e que atendesse às necessidades das famílias do país, na época. Ele foi realmente apresentado em 1938 e, por isso, costuma-se dizer que esta é a data oficial de nascimento do besouro.
Logo em seguida, o governo alemão, mais exatamente a Kraft durch Freude — um órgão político que controlava as atividades de lazer dos trabalhadores alemães (algo como os órgãos de serviço social da indústria, porém estatal) — construiu uma fábrica que produziria os carros próximo a Fallersleben. Nos arredores da fábrica, em uma região conhecida pelo antigo Castelo de Wolfsburg, foi criada uma cidade planejada para abrigar os operários da KdF, batizada Stadt des KdF-Wagen bei Fallersleben (cidade da KdF-Wagen em Fallersleben).
O problema é que a fábrica foi concluída pouco antes da Segunda Guerra, e quando o conflito finalmente estourou em 1939, em vez de fazer carros populares para os 340.000 alemães que depositaram seus pagamentos semanais de cinco marcos, a fábrica começou a produzir veículos militares para a Guerra. Entre 1939 e 1945 a fábrica produziu somente o Kübelwagen (abaixo), o Schwimmwagen e o Kommandeurwagen — três modelos militares derivados do projeto do Fusca, ou melhor, do KdF-Wagen.
O que aconteceu neste período todos nós aprendemos nas aulas de história: Hitler, Mussolini e os japoneses se deram mal, os americanos, os soviéticos e os britânicos se deram bem. Após a rendição da Alemanha, os aliados mantiveram sua ocupação no país para o processo de reconstrução, desmanche da indústria bélica e realocação do território polonês anexado por Hitler.
Entre as fábricas de máquinas de guerra estava esta fábrica da KdF. Em 1945, o major Ivan Hirst, do corpo militar de engenheiros eletricistas e mecânicos do Exército Britânico (Corps of Royal Electrical and Mechanical Engineers), foi encarregado de ir até a região junto com o coronel Charles Radclyffe verificar se havia restado algo da fábrica a ser recuperado. Àquela altura, a cidade já havia sido rebatizada com o nome do castelo: Wolfsburg.
Durante a Guerra, a fábrica havia sido bombardeada três vezes, e por isso ela já não tinha mais janelas e os porões estavam inundados. O maquinário, contudo, estava intacto, pois boa parte havia sido escondida em galpões afastados da vila dos trabalhadores. A ideia inicial era desmanchar a fábrica e levar o maquinário para a Inglaterra como reparação de guerra, mas durante missão, Hirst também encontrou um protótipo do KdF-Wagen, e percebeu que havia material e maquinário suficientes para começar a produção do carro.
Ele reportou a seus superiores as condições encontradas em Wolfsburg, e diante da notícia, a cúpula do Royal Army ordenou a produção de 20.000 unidades para uso das forças aliadas de ocupação. Hirst então reconstruiu o telhado da fábrica usando galhos, troncos e lona, e em 27 de dezembro de 1945, começou a produzir os carros na fábrica de Wolfsburg com a força de trabalho de 6.000 operários alemães.
Estes foram os primeiros Fuscas produzidos em série na história — muitos deles foram construídos com peças do Kübelwagen até 1946, quando a fábrica já produzia 1.000 carros por mês, ou mais de 30 por dia e foi rebatizada como Volkswagen.
Hirst se manteve à frente da fábrica até 1949. Àquela altura a Volkswagen já tinha também uma rede de concessionários e exportava seu carro para diversos países — incluindo a Inglaterra e, mais tarde, os EUA.
O Fusca acabou se tornando um sucesso mundial e um dos maiores símbolos da indústria alemã, e foi produzido por 58 anos até 2003, quando a última unidade do “Vocho” foi produzida em Puebla, no México. Mas você ainda pode encontrá-lo por aí, circulando bravamente como se o tempo não tivesse passado para ele.
Ainda não é assinante do FlatOut? Considere fazê-lo: além de nos ajudar a manter o site e o nosso canal funcionando, você terá acesso a uma série de matérias exclusivas para assinantes – como , , e muito mais!