“Computador de bordo”. Até os anos 2000, esta expressão era obrigatória na hora de descrever os equipamentos dos carros mais caros – mesmo que não descrevesse, de fato, um computador dentro do carro. Hoje em dia, quando de fato temos computadores dentro dos carros (a central multimídia no painel não deixa, de certa forma, de ser um computador).
Então, o que é realmente um computador de bordo? A definição exata pode ser mais complicada do que parece. No Brasil, eles começaram a chegar só em meados da década de 1980 – mais precisamente em 1985, com o Fiat Premio, que foi o primeiro carro do Brasil a ser vendido com computador de bordo. Era um sistema rudimentar, com um painel digital numérico que mostrava dados como consumo instantâneo, consumo médio, autonomia, distância percorrida e velocidade média, além de data, hora e cronômetro. O dado exibido na tela era indicado por uma luz ao lado da descrição, e o equipamento tomava o lugar do conta-giros no painel. A Fiat se orgulhava bastante do item, e até rolou uma campanha impressa para exaltá-lo.
Duas décadas depois, nos 2000, vários carros começaram todas estas funções (ou boa parte delas) na mesma tela do hodômetro digital, de forma bem mais prática – e precisa. E isto deixou de ser um diferencial, hoje em dia. Tanto que temos computadores de bordo com tela colorida, diversas funções integradas com a central multimídia e alguns detalhes bacanas como uma pequena imagem em escala do carro. Nada que acrescente funções essenciais – são quase como gadgets.
Mas os computadores de bordo apareceram bem antes disto. E talvez você não acredite, mas o primeiro carro a ser oferecido com um computador de bordo foi… sim, um Volkswagen com motor a ar. Sempre eles!
Mas não foi o Fusca: foi o Type 3, o carro que conhecemos no Brasil como 1600 ou “Zé do Caixão”, e também foi vendido como Variant (a perua) e TL (o fastback). O equipamento só estava disponível nas versões com injeção de combustível Bosch D-Jetronic, um sistema analógico.
A Volkswagen, evidentemente, fez publicidade para o sistema – evidentemente, seguindo seu icônico template de anúncios criado pela agência DDB.
Agora. Um carro com um computador embutido.
Todo Volkswagen Squareback agora vem com um computador.
Ele parece uma caixa, com mais ou menos 30 cm de largura, e está conectado ao motor em 9 lugares.
Vamos explicar. (Ou tentar.)
O Volkswagen Squareback é um dos poucos carros no mundo com um sistema de injeção de combustível.
Um computador foi projetado para controlar este sistema. Para pensar por ele.
Por exemplo, o computador consegue realmente perceber a velocidade do motor, a carga de trabalho do motor e a temperatura do motor. E então, mandar a quantidade exata de combustível e ar necessários para cada cilindro.
O desperdício de combustível é reduzido, e a autonomia aumenta. E você consegue percorrer cerca de 11 quilômetros por litro.
O que você não vai ter são problemas com o carburador. Porque não há carburador. Nada para regular, nada para limpar, nada para afogar.
Só o VW Squareback (e seu irmão, o Fastback) tem um sistema de injeção de combustível e um computador que pensa.
Volkswagens sempre fizeram sentido. Agora, eles têm sentidos.
Nem precisávamos ter traduzido o texto todo, mas é interessante ver a forma como a injeção de combustível – e o computador de bordo – eram vistos na época. Verdadeiras inovações, quase mágica.
Não era um sistema digital – e não havia um circuito integrado, como os computadores modernos, mas havia até mesmo um sistema de diagnóstico que era plugado ao computador e, com uma interface composta por botões giratórios, números e luzes indicadoras, era possível obter um diagnóstico e saber o que havia de errado com o motor. O sistema foi o precursor dos sistemas de on-board diagnostics (OBD) – que se tornaram o padrão nos carros modernos. Se você pode levar o seu carro até a concessionária ou oficina, conectá-lo a um computador e obter dados detalhados sobre seu funcionamento e possíveis problemas – ou mesmo comprar um leitor OBD-II e fazer isto em casa – é graças ao Type 3 da VW.
Apesar de muito interessante, porém, o sistema não era um computador de bordo com interface de usuário. Estes só vieram mesmo na década de 1980, quando as telas nos carros ainda eram um sonho distante (e diversos experimentos eram feitos para tentar incorporá-las ao ambiente. Até mesmo telas de CRT, como a Aston Martin tentou fazer com o Lagonda. Eles eram parecidos com o que a Fiat oferecia com o Premio, mas ganharam precisão quando os sistemas de injeção computadorizados tornaram-se padrão.
A evolução foi rápida na virada da década de 1990. Você deve lembrar, por exemplo, dos computadores de bordo que os carros da Chevrolet ofereciam naquela época – o sistema do Omega, por exemplo, não era muito diferente: um display com indicações escritas e um painel numérico para mostrar consumo instantâneo, consumo médio, autonomia e tempo de viagem, além de um relógio e um marcador de temperatura externa.
No Chevrolet Monza, o item tinha as mesmas funções, mas era um display ainda menor e mais simples, sem as indicações impressas na tela. Podia ser facilmente confundido com um simples relógio. A partir daí, a evolução aconteceu rapidamente. Primeiro, as telas começaram a ficar melhores – você deve lembrar, por exemplo, do Astra de segunda geração, lançado no Brasil em 1998. As versões mais caras vinham com um computador de bordo no topo do console central, com uma tela mais generosa em pixels, porém as mesmas funções simples dos modelos anteriores. O Chevrolet Corsa podia contar com o mesmo equipamento, assim como a Zafira e até mesmo alguns modelos da Fiat nos anos 2000 – especificamente, os que utilizavam o motor Família I da General Motors, como Stilo, Idea e Palio. O display ficava no painel, e era muito parecido.
Foi nesta época que, com mais capacidade de armazenamento e processamento, os computadores de bordo começaram a trazer funções mais sofisticadas, e que te faziam sentir-se mais “no controle” do carro. Por exemplo, o computador de bordo permitia programar alertas para diversos serviços de manutenção do carro, sincronizados com o hodômetro, ligar ou desligar o alerta de excesso de velocidade (e programar a qual velocidade ele seria acionado) e, em alguns casos, ajustar a temperatura do ar-condicionado ou o acionamento dos retrovisores elétricos.
Computadores de bordo com estas funções ainda estão presentes nos carros mais baratos (no Brasil, inclusive), embora com uma interface mais bonita, alguns com telas coloridas e outros elementos interativos. Também existem, atualmente computadores de bordo aftermarket, que podem ser integrados a tablets sensíveis ao toque e ligados ao scanner OBD-II do carro ou mesmo a um smartphone, fazendo uso de aplicativos desenvolvidos especialmente para esta aplicação.
Atualmente, nos automóveis mais caros, os assistentes virtuais com comandos de voz podem ser considerados a evolução mais recente dos computadores de bordo. Eles integram todos os sistemas do carro – o que, em alguns casos, inclui assistentes de segurança – e, conectados à Internet, acabam servindo até mesmo para liberar ou desativar equipamentos, além de poder ser atualizados remotamente. Assim, eles estão cada vez mais próximos dos computadores que temos em nossas casas.
Se isto é bom ou ruim? É uma questão complexa. Por um lado, os computadores de bordo sofisticados que temos hoje podem, sim, facilitar diversos aspectos de nossas vidas dentro do automóvel e até mesmo fora dele. É possível, por exemplo, configurar diferentes setups para cada usuário do carro em uma família; aproveitar a conexão online para explorar uma cidade desconhecida, deixando que o carro te leve até o melhor hotel ou restaurante; ou simplesmente curtir qualquer música, em qualquer lugar. Por outro lado, a assinatura de recursos que, antigamente, você escolhia no momento da compra, pode ser mais uma forma de obter dinheiro dos proprietários – algo que promete, ainda, gerar bastante discussão.