Há alguns dias, perguntamos aos leitores quais eram os acidentes não-fatais mais sinistros que eles já haviam visto. Não faltam exemplos — afinal, o automobilismo é um esporte absurdamente perigoso, mas de vez em quando os pilotos têm sorte e saem andando daquilo que restou de seus casos. Outros, precisam de muita força de vontade para recuperar-se das sequelas, e às vezes até voltam a correr.
Nossa sugestão foi o insano acidente de Martin Donnelly na Fórmula 1, definitivamente um dos acidentes mais chocantes que já aconteceram. Mas as sugestões de vocês definitivamente não ficam atrás. Vamos conferir, então, a primeira parte da lista!
Robert Kubica, GP de Montreal, 2007
O acidente do polonês Robert Kubica foi um dos mais impressionantes na história recente da Fórmula 1. Na 29ª volta do Grande Prêmio do Canadá, Kubica foi contornar uma hairpin e atingiu o carro de Jarno Trulli, que na época pilotava pela Toyota, e acabou passsando por cima de uma saliência na grama. Com isto, o carro levantou voo e Kubica não conseguiu frear ou mudar de direção, acertando o muro a 300 km/h, causando um impacto de 75G.
Com o safety car na pista, Kubica foi removido do carro e levado para o centro médico do circuito, onde teve sua condição declarada como estável. A princípio, acreditava-se que o piloto havia sofrido uma fratura na perna, mas depois foi constatado que ele hacia sofrido apenas uma concussão leve e uma torção no tornozelo. Ele passou a noite em observação e foi liberado no dia seguinte.
Stan Fox, Indianapolis, 1995
O mais lembrado de todos nos comentários foi o acidente do americano Stan Fox na Indy 500 de 1995. O acidente aconteceu no primeiro minuto, logo na primeira volta da corrida — Fox perdeu o controle do carro e acertou o muro do lado direito da pista. Seu carro partiu-se ao meio e todo o conjunto dianteiro se soltou, deixando as pernas do piloto desprotegidas. É um milagre que ele não as tenha perdido. Não foi à toa que escolhemos uma imagem do impacto para abrir este post.
Vários outros carros se envolveram no acidente, e destroços ficaram espalhados por toda a pista. Fox sofreu diversos ferimentos pelo corpo e ficou com um coágulo no cérebro, removido às pressas pouco depois da batida. Sua recuperação levou vários meses e, depois disso, Fox abandonou a carreira no automobilismo. Ele continuou envolvido com o esporte, porém, fundando a organização Friends of the Fox para dar apoio a pilotos que sofreram traumas na cabeça e ajudá-los a voltar a acelerar.
Dito isso, esta história tem um desfecho trágico: em 2000, Stan Fox morreu em um acidente de carro, quando bateu em um caminhão a caminho de um evento automotivo na Nova Zelândia.
Jeremy Foley, Pikes Peak
Na edição de 2012 da Pikes Peak International Hillclimb, a subida de montanha mais famosa do planeta, Jeremy Foley e o navegador Yuri Kouznetsov deixaram muita gente apreensiva ao cair da montanha. Não é preciso explicar muito: em uma curva de alta para a esquerda, o Lancer Evolution da dupla perdeu aderência e desceu rolando pelo penhasco.
A visão é assustadora — o carro capota várias vezes e, no processo, quase todos os painéis da carroceria se soltam, deixando a gaiola de proteção, piloto e navegador expostos. No vídeo acima, a dupla diz que a única coisa que conseguiam pensar era “vamos morrer agora”, e que “depois do segundo giro, você perde completamente o senso de direção e sente como se estivesse dentro de uma máquina de lavar. Incrivelmente, ambos saíram andando do acidente, e um deles sofreu apenas com um ombro deslocado. Detalhe: naquele ano, pela primeira vez a subida de montanha aconteceu em uma Pikes Peak completamente asfaltada.
Niki Lauda, Nürburgring Nordschleife, 1976
O acidente de Niki Lauda é, sem dúvida, um dos mais famosos da história da Fórmula 1 — não apenas pelo quanto foi impactante, mas também pelo contexto da época: Nürburgring Nordschleife, a rivalidade entre Lauda e James Hunt, e o fato de estamos falando da década de 1970, quando os carros definitivamente não eram seguros como hoje.
A corrida, décima da temporada, teve 14 voltas pelo circuito que, na época, tinha 22 km de extensão (hoje em dia são 20 km). A dupla da Ferrari largou na ponta, com Niki logo atrás de Hunt, e foi marcada por uma chuva repentina que ocasionou diversas trocas de posição na primeira volta, e levou diversos pilotos a iniciar a prova com pneus de chuva. Minutos depois, a chuva parou, e Lauda fez uma visita aos boxes para colocar pneus de pista seca. Na análise médica que fizemos em 2014, contamos a história em detalhes:
Entre aqueles que tinham feito a parada estava Niki, pressionado para voltar às primeiras posições. Seguido por Guy Edwards, ele passou a Exmühle e vinha em direção à Bergwerk atrás de Carlos Pace quando inexplicavelmente tocou a zebra interna da pequena curva cega à esquerda que a antecede. Segundo relatos a suspensão do seu carro se quebrou neste momento, fazendo com que Niki perdesse o controle do veículo a mais de 200km/h, para rodar e se chocar violentamente com o muro de pedras à direita. O carro voltaria para a pista já incendiado. Edwards conseguiu se desvencilhar dos destroços, mas Brett Lunger e Harald Ertl ainda colidiriam com Lauda.
Consciente e vendo sua Ferrari consumida por chamas cada vez maiores, Niki tinha perdido seu capacete já no primeiro choque e sentia a pele do seu rosto queimar enquanto lutava para sair do cockpit. Felizmente os dois pilotos envolvidos no acidente se juntaram a Arturo Merzario e Edwards na retirada de Niki das chamas, com o veículo de resgate chegando 40 segundos depois do evento. Lauda ainda conseguiu sair em pé do carro, mas logo perdeu a consciência e cinco minutos depois foi removido para o hospital de Mannheim.
Niki sofreu extensas queimaduras após a exposição ao fogo por cerca de 50 segundos, notadamente na sua face, com escalpo, lado direito, sobrancelhas e pálpebras como maiores alvos.
O mais impressionante é que Niki, que brigava pelo título, conseguiu voltar a correr apenas seis semanas depois do incidente, ainda com uma bandagem na cabeça e severas deformações no rosto. Hunt venceu no Nürburgring e ficou com o título, mas Lauda ainda garantiu o vice-campeonato. Sua história não virou filme por acaso.
Rubens Barrichello, Imola, 1994
Todos sabem que no GP de San Marino, no circuito de Imola, em 1994, o mundo perdeu Ayrton Senna. No entanto, outro brasileiro também sofreu um acidente terrível naquele fim de semana: Rubens Barrichello, durante os treinos da sexta-feira.
Barrichello, que vivia uma ótima fase na Jordan, estava confiante para aquela que seria a terceira corrida da temporada. Então, na segunda volta dos treinos, ao contornar a curva Variante Bassa do circuito de Imola, ele decidiu ir cerca de 15 km/h mais rápido que na volta anterior.
Aquele foi seu erro: o carro saiu da trajetória e acertou uma zebra relativamente alta, que funcionou como uma rampa e fez com que o Jordan 194 de Barrichello decolasse e acertasse o muro a 223 km/h. O carro, então, atingiu o chão com o bico e capotou, repousando de lado.
Os fiscais de prova e médicos correram até o local e encontraram Barrichello inconsciente no cockpit, respirando com dificuldade por causa do sangue que saía de um corte em seu rosto e foi rapidamente entubado — o que garantiu que, ao chegar ao centro médico, sua condição tivesse melhorado sensivelmente. Os treinos foram interrompidos e Eddie Jordan, temendo pela vida de seu piloto, aproveitou para ir conferir seu estado. Lá, ele encontrou Ayrton Senna, que foi o primeiro a ver Barrichello de volta à consciência. “Ele está bem”, disse. “Em estado de choque, claro, mas está bem”.
Como já dissemos, todos sabemos o que aconteceu depois. Infelizmente, o acidente de Senna dois dias depois não pode entrar nesta lista.
Kenny Bräck, Texas Motor Speedway, 2003
Em 2003, o piloto sueco Kenny Bräck pilotava na Indy Racing League. Ele vinha de uma carreira de dez anos iniciada na Fórmula Ford sueca e na Fórmula 3 britânica antes de partir para a Indy em 2000 mas, naquele ano, sofreu o acidente que acabou com sua carreira nos monopostos.
Depois de enroscar as rodas de seu carro com as de Tomas Scheckter, Bräck decolou e foi arremessado em direção ao alambrado do circuito. O carro se partiu ao meio, submetendo Bräck a uma desaceleração de 214 g — o número mais alto já registrado em um acidente na história do automobilismo.
Ele sofreu fraturas no osso esterno, no fêmur, esmagou uma vértebra e quebrou os tornozelos. A recuperação levou 18 meses e embora ele tenha voltado a correr nas 500 Milhas de Indianápolis de 2005 e em algumas outras ocasiões, este acidente praticamente decretou o fim de sua carreira na Indy. De qualquer forma, só o fato de ter saído vivo foi questão de pura sorte.