Na indústria automobilística dos anos 2020, menos é mais. O downsizing, prática que consiste em adotar motores de menor deslocamento, sobrealimentados e mais eficientes, no lugar de motores maiores de potência equivalente, já deixou de ser uma novidade indigesta para tornar-se o padrão da indústria. E a própria indústria caminha para o abandono completo dos motores a combustão interna nas próximas décadas – embora, como já explicamos nesta matéria, acreditemos que vai demorar um pouco mais.
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Mas existe um lugar onde os motores grandes sobrevivem. Quer dizer, não é exatamente um lugar, mas um setor da indústria global. E quando falamos “motores grandes”, queremos dizer motores GRANDES. Enormes. Gigantes. Colossais. Os maiores motores do planeta – como o monstro aí embaixo:
Este é um Duvant 9VOS, movido a diesel, que tem 3,4 metros de altura e 5,5 metros de comprimento. Ele pesa 34 toneladas e tem nove cilindros, cada um com 36 litros de deslocamento – totalizando 330 litros no total. O motor é capaz de entregar nada menos que 1.600 cv e, para isto, queima 350 litros de diesel por hora – enquanto produz um rugido aterrador. Apenas três unidades foram produzidas pela francesa Duvant em 1962, e o motor do vídeo ficou exposto em Paris durante o salão Rétromobile em 2012.
Mas, se não foi usado mover nenhum veículo, para que servia este motor?
A resposta: ele era um gerador a diesel, usado para produzir eletricidade. Depois de pronto, ele foi levado para o subsolo do Hipódromo de Auteuil, nos arredores de Paris – e foi o responsável por gerar toda a eletricidade utilizada pelo local por quase trinta anos antes de ser aposentado, em 1990. Depois disto, o motor foi removido do local pelos membros da Association des Amoureux des Vieux Moteurs (“Associação de Apreciadores dos Motores Antigos”, em tradução livre) para ser restaurado, retificado e transformado em uma atração para todos os que curtem estas máquinas superlativas.
O ronco ensurdecedor, a fumaça preta do escapamento e o fato de ter escadas e plataformas para manutenção impressionam, claro. Mas o Duvant 9VOS é antigo e, desde sua concepção, motores a diesel ainda maiores, com mais cilindros e muito mais força, foram desenvolvidos e produzidos. E nem todos eles são estacionários.
Um exemplo muito interessante são os motores em V da Anglo Belgian Corporation (ABC). A empresa existe desde 1912 e sempre fabricou motores grandes para veículos pesados, e também para serem usados como geradores. Atualmente, eles fabricam motores de seis e oito cilindros em linha, com potência que varia entre 1.175 e 2.400 cv (naturalmente aspirados) ou entre 5.300 e 7.000 cv (turbodiesel); e também motores em V. Estes podem ter 12 ou 16 cilindros e entregam entre 3.600 e 4.800 cv.
Embora até sejam ocasionalmente usados como geradores estacionários, estes motores também costumam ser empregados em embarcações – e são especialmente populares em barcos rebocadores, que muitas vezes usam dois motores.
O processo de partida em um rebocador destes é impressionante por si só. Periféricos como bombas de óleo e ventoinhas precisam ser ligadas de antemão, individualmente. Depois, liga-se o motor de partida – que é um Scania a diesel de 250 cv normalmente usado em caminhões. Só então é que se dá a partida no motor em si. Abaixo, veja um V12 turbodiesel de 5.500 cv ser ligado:
Outra fabricante especializada em motores a diesel gigantescos é a alemã MTU Friedrichshafen, que foi fundada em 1909 por Wilhelm Maybach e seu filho Karl Maybach. Wilhelm Maybach, na época, era diretor técnico da Daimler-Motoren-Gesellschaft, empresa precursora da Daimler AG e, por extensão, da Mercedes-Benz.
Os motores da MTU também são utilizados em embarcações – em seu site, a empresa recomenda seu uso em “iates rápidos, patrulheiros e barcos de bombeiros”, mas eles também são adequados para uso aeronáutico, em locomotivas (como geradores) e em caminhões de mineração. A família mais popular é a 4000, com motores de 20 cilindros em V, deslocamento de 86 litros e potência que varia entre 5.300 e 5.850 cv. São motores de giro baixo, no máximo 2.100 rpm, que privilegiam a durabilidade.
Como no caso dos motores da ABC, é preciso primeiro acionar o motor de partida e os sistemas de arrefecimento e alimentação antes de ligar o motor em si.
Outras fabricantes, como Caterpillar e MAN, também possuem suas linhas de motores a diesel gigantescos. Os Caterpillar da série 797 possuem configuração e dimensões parecidos com os motores da ABC, e costumam ser utilizados nos caminhões de mineração da própria Caterpillar – e também como geradores estacionários, em configurações com até quatro turbocompressores.
Agora, nenhum destes motores chega ao nível daquele que, de fato, é o maior motor de combustão interna do planeta: o Wärtsilä-Sulzer 14RT-flex96C, que não apenas tem as maiores dimensões externas como também é dono da maior capacidade volumétrica.
Estamos falando de um motor de mais de 13 metros de altura, 27 metros de comprimento e 2.300 toneladas – ele tem a altura de um prédio de quatro andares. O Wärtsilä-Sulzer 14RT é usado nos maiores navios cargueiros do mundo, que são capazes de transportar até 16.000 contêineres carregados, medem mais de 400 metros de comprimento e pesam mais de 200.000 toneladas (ou 200 milhões de quilos).
Como contamos nesta matéria, lá dos primórdios do FlatOut, um Wärtsilä-Sulzer 14RT é capaz de entregar 109.000 cv e 775.400 kgfm de torque girando a pouco mais de 100 rpm – o que faz sentido, considerando que só o virabrequim de um titã como este pesa 300 toneladas. É o bastante para que um navio equipado com ele chegue aos 27 nós de velocidade máxima, ou cerca de 50 km/h.
Existem por volta de 300 unidades do motor Wärtsilä-Sulzer 14RT em operação. Ele ainda é o maior e mais potente motor a diesel do mundo, e é possível que jamais seja superado neste aspecto.