No primeiro capítulo do Rest in Power, falamos não apenas sobre a origem do Lancer Evolution, mas de toda a história nos ralis que levou a Mitsubishi a desenvolver seu modelo mais lendário — e um dos favoritos dos entusiastas. Agora vamos ver como foi que começou, de fato, a evolução: o Lancer Evolution II.
Para o ano-modelo de 1994, a Mitsubishi preparou a primeira atualização do Lancer, anunciada em janeiro daquele ano — o que obviamente incluía o Evo, considerando que a primeira fornada do pioneiro, de 2.500 unidades, foi torrada em apenas três dias. Isso explica por que a Mitsubishi anunciou o novo Evo um mês antes do resto da linha, em dezembro de 1993.
Se você olhar com pressa um Evo I e um Evo II lado a lado, não vai notar as diferenças. Na verdade, mesmo depois de alguns minutos é difícil distingui-los. Isto porque elas estão nos detalhes, e algumas mudanças— as mais importantes — nem eram visíveis, porém mais do que o suficientes para justificar o sobrenome “Evolution”.
Spoiler dianteiro maior, um suporte adicional no aerofólio traseiro com a inscrição “EVOLUTION II”, luzes de neblina no Evo GSR e um acabamento preto entre as lanternas do RS eram as modificações estéticas mais significativas.
Originalmente o Evo II tinha rodas de 15 polegadas da OZ Racing mas, por causa de sua raridade, fotos de exemplares originais são bastante difíceis de encontrar
O Evo II tinha o mesmo comprimento do anterior (4,31 m), mas era 2,5 cm mais alto, com 1,42 m de altura, enquanto o eixo dianteiro foi ligeiramente deslocado para a frente, aumentando o entre-eixos em 10 mm e o deixando mais estável em curvas de alta. Para reduzir a transferência lateral de peso, as bitolas cresceram em 15 mm na dianteira e em 10 mm na traseira, e os pneus engordaram para os 205/60 R15 (antes eram 195/55 R15), levando à adoção de caixas de roda mais profundas e contribuindo para aumentar a estabilidade.
O carro também ficou 10 kg mais pesado: 1.246 kg para o Evo II GSR e 1.180 kg para o RS, que era depenado para ficar mais leve, perdendo ar-condicionado, freios ABS, lavador do vidro traseiro e adotando rodas de aço em vez das peças de liga leve. As mudanças na plataforma renderam um novo código para a geração: CE9A em vez de CD9A.
O Evo II GSR era oferecido nas cores branca, prata, azul, preta e vermelha, enquanto o RS só estava disponível em branco. Como você já deve ter sacado, a proposta do RS, mais do que ser acessível, era de ser uma base pronta para ser modificada por entusiastas e competidores.
O motor era exatamente o mesmo quatro-cilindros de 1.997 cm³ (dois litros) de código 4G63, porém trouxe algumas modificações relativamente simples: um aumento na pressão do turbocompressor, comando de válvulas com maior levante e escapamento de fluxo menos restritivo garantiam um aumento de 10 cv na potência — 260 cv a 6.000 rpm. O torque não mudou, continuou em 31,5 mkgf a baixos 3.000 rpm.
O ligeiro aumento de potência não foi, porém, a única mudança: agora o motor do Evo II tinha um radiador de óleo, preservando as características do lubrificante em condições extremas, e a transmissão manual teve as relações da primeira e da segunda marchas encurtadas (de 2,571:1 e 1,600:1 para 2,750:1 e 1,684:1, respectivamente), enquanto a terceira e a quarta marcha ganharam novos sincronizadores. A embreagem ficou mais resistente e o diferencial traseiro agora era mecânico tanto para o RS quanto para o GSR (este último, até então, tinha acoplamento viscoso na traseira).
A suspensão ganhou pontos de fixação reforçados, e a dianteira recebeu componentes forjados e uma barra estabilizadora mais leve, enquanto a traseira ganhou molas mais rígidas. Com os pneus mais largos, nova suspensão e entre-eixos e bitolas sutilmente ampliados, o Evo II ficou mais estável.
O interior também mudou pouco — a maioria dos componentes era a idêntica a dos Evo I, como painel e volante (até porque o Evo II não era tecnicamente uma nova geração, e sim uma atualização), mas com novos bancos concha Recaro, com apoio muito superior, no GSR. O RS continuava com bancos normais.
Mas o que interessa mesmo é o desempenho, e o Evo II mostrava a que veio ao acelerar de zero a 100 km/h em 4,7 segundos — quase um segundo mais rápido que a concorrência direta (o Toyota Celica GT-Four, que levava 5,5 segundos, e o Subaru Impreza WRX, que fazia o mesmo em 5,6 segundos). A dinâmica também foi bastante elogiada pela imprensa especializada, descrita como precisa e ágil.
Como seu antecessor, o Evo II era um carro de homologação para o WRC e, desta vez, motivada pelo sucesso do Evo original, a Mitsubishi produziu 5.000 unidades logo de cara. Foi uma decisão acertada — na verdade poderiam ter sido fabricadas mais unidades, visto que estas 5.000, todas para o mercado doméstico, já estavam esgotadas em abril de 1994.
Ainda não era chegada a hora de a Mitsubishi dominar no WRC, e o Evo II só começou a competir na quinta corrida da temporada de 1994 (eram dez no total), na região de Acropolis, na Grécia.
O atraso na estreia se deu por conta do diferencial central – nos protótipos, o mecanismo hidráulico não reagia muito bem nas aterrissagens de saltos, apresentando certa indecisão na distribuição de torque. Resolvida esta questão, o Evo II foi para os estágios de rali.
Armin Schwarz no Rali de Acropolis, na Grécia, em 1994
Você lembra quando, no post anterior, dissemos que a Mitsubishi voltaria aos pódios graças ao Evo II? Pois foi o que aconteceu nesta etapa — o alemão Armin Schwarz levou o Evo II de rali ao segundo lugar na Grécia e o resto da temporada foi marcado por um desempenho cada vez mais satisfatório dos Evo (tanto o I quanto o II) levados para correr por divisões da Mitsubishi da Alemanha e da Finlândia.
Foi um finlandês que deu ao Lancer sua primeira vitória no WRC —Tommi Mäkinen, ainda comandaria o Evo para quatro títulos mundiais consecutivos de pilotos. Depois de vencer o Rali da Finlândia ao volante de um Ford Escort RS Cosworth, Mäkinen foi para a Mitsubishi. Ele não chegou a terminar a única prova que disputou naquele ano pela marca dos diamantes — o Rallye Sanremo, na Itália, mas brilhou no ano seguinte com um novo carro: o Lancer Evolution III.
Só que esta história vai ficar para a próxima parte do Rest In Power!
[ Agradecimentos: Eric Darwich – consultor Mitsubishi Motors Brasil ]
Ficha Técnica — Lancer Evolution II
Motor: quatro cilindros em linha, transversal, 1.997 cm³, turbo, 16V, cabeçote com duplo comando de válvulas, injeção eletrônica, gasolina
Potência: 260 cv a 6.000 rpm
Torque: 31,5 mkgf a 3.000 rpm
Transmissão: manual, cinco marchas, tração integral
Suspensão: Dianteira do McPherson e traseira do tipo multilink
Freios: Discos na frente e atrás
Pneus: 205/60 R15 nas quatro rodas
Dimensões: 4,31 m de comprimento, 1,69 m de largura, 1,42 m de altura e 2,51 m de entre-eixos
Peso: 1.246 kg (GSR) / 1.180 kg (RS)
[ Fotos: Mitsubishi, tharakalol/Flickr ]