Com seu motor pendurado na traseira, o Porsche 911 já rema contra a maré entre os esportivos de alto desempenho há algumas décadas – esta configuração é considerada por muitos como obsoleta desde os anos 1970, quando os carros esporte começaram a adotar em peso o motor central-traseiro. Mas o fato é que o motor pendurado atrás do câmbio acabou virando a assinatura do 911, de forma que os engenheiros de Stuttgart não medem esforços para que cada geração do Nine-Eleven seja ainda melhor que a anterior. E o mais incrível é que eles conseguem fazê-lo de várias formas diferentes.
Para ilustrar isto, os caras da revista britânica Evo colocaram, lado a lado, as hot laps de dois 911 que são praticamente opostos: o 911 Turbo S e o 911 GT3 RS. O primeiro é um canhão feito para pegar estrada, com interior luxuoso, tração integral e um flat-six de 3,8 litros com dois turbos e 580 cv. O segundo, um carro de corrida para as ruas, com interior depenado, tração traseira e motor naturalmente aspirado (um flat-six também, obviamente) capaz de entregar 500 cv. O resultado? Ambos os carros viraram exatamente o mesmo tempo no circuito britânico de Anglesey: 1:13,6.
Fica ainda mais impressionante quando comparamos mais a fundo. O 911 Turbo S tem 560 cv a 6.500 rpm e 71,4 mkgf de torque já às 2.100 rpm (ou 76,5 mkgf com overboost). O 911 GT3 RS entrega a potência máxima de 500 cv a 8.250 rpm, com o pico de torque de 46,9 mkgf a 6.250 rpm.
O Turbo S é mais potente, mais torcudo e disponibiliza toda a força do motor bem mais cedo, mas também é mais pesado: 1.675 kg contra 1.495 kg, em ordem de marcha – 180 kg a mais. O fato de ter tração integral também ajuda o Turbo S a ser um carro extremamente competente nas saídas das curvas mais lentas – ele gruda no chão e sai de forma neutra e decidida. Anglesey é um circuito mais travado e, por isso, o 911 Turbo S acaba levando vantagem em vários momentos (leia aqui nossa matéria sobre as vantagens e desvantagens dos sistemas de tração integral). Ah, e ele leva apenas 2,9 segundos para chegar aos 100 km/h.
O GT3 RS, com sua receita muito mais crua, é um carro bem mais exigente com o piloto em determinados momentos – especialmente porque seu comportamento é bem mais traseiro, como era de se esperar. Mesmo que perca para o Turbo S em aceleração bruta (o 0-100 km/h é cumprido em 3,3 segundos – ainda que haja testes com resultados abaixo dos 3 s), o GT3 RS é mais visceral por natureza. É só reparar como seu ronco é bem mais brutal e seu comportamento, mais tinhoso, exigindo contraesterços a todo momento, especialmente nas saídas de curva. Sua velocidade de contorno de curva é substancialmente maior (leia aqui nosso especial sobre a dinâmica da carros de tração traseira).
Existe, contudo, um fator que não pode ser deixado de lado: o modo como o teste foi conduzido (hot lap) e o menor tempo publicado em vídeo. No mundo real, haveria uma discrepância maior, pois o peso maior do 911 Turbo S faria com que os freios superaquecessem primeiro, e seus pneus, mais voltados para uso cotidiano (o Turbo S usa Pirelli PZero) passariam logo da temperatura de funcionamento ideal. O GT3 RS calça um jogo de Michelin Pilot Sport Cup 2, com um composto feito para lidar com temperaturas mais altas e tem freios de carbono-cerâmica opcionais.
Isto tudo dito, não podemos deixar de parabenizar a Porsche por conseguir dar duas personalidades tão distintas e, ao mesmo tempo, igualmente extremas, à plataforma do 911. Não é todo mundo que consegue fazer isto. Na verdade, praticamente ninguém.