Fala, galera! Tudo certo? Tô voltando com o último texto da série do E60 pra vocês. Nos primeiros artigos tentei mostrar como é o processo de desenvolvimento de um Formula SAE partindo do zero, além de um pouco de como nós aqui na EESC-USP Formula SAE gerenciamos nosso dinheiro e o pessoal que trabalha aqui.
Depois disso nada mais que comentar sobre como fizemos o carro andar, né?
Finalizado o carro na oficina, nos sobra pouca opção de saber se ele está rodando bem, e na realidade seguimos um procedimento bem básico e eficiente: Colocou no chão e nada quebrou? Check. Empurramos para frente e para trás e nada quebrou? Check. O motor ligou certinho e não apresenta problemas e aparentemente pode andar? Check. Bora correr!
Os primeiros testes que fazemos com o carro na realidade são feitos com extrema cautela! É bem no começo do tempo de vida do carro que as piores quebras acontecem e temos que tomar bastante cuidado com isso, afinal, é um de nós que está lá dentro do carro pilotando e estamos fazendo isso dentro da universidade! Sim, nossos primeiros testes acontecem dentro do nosso campus, em uma área que eles gentilmente nos deixam utilizar se conseguirmos sinalizar apropriadamente. Nesses primeiros testes puxamos um pouco o carro, testamos a direção, vemos se as marchas estão entrando certinho e se os freios estão funcionando bem. Durante esse teste paramos o carro algumas vezes pra checar as peças mais críticas e ver se elas estão ok, baixar os dados do motor no computador e ver se o funcionamento dele tá no padrão, e se tudo isso confere, deixamos ele sair de novo pra rodar.
Essa primeira fase tem uma duração muito relativa: Enquanto o carro não estiver rendendo um tempo bom na pista (leia-se parando por conta de pequenos problemas), nós continuamos testando dentro do nosso campus, afinal, em 10 minutos estamos na área de testes com tudo pronto para o carro rodar.
Nossa segunda fase de testes acontece em locais maiores, nas quais podemos exigir mais do carro para colocá-lo em uma situação semelhante à da competição. Por exemplo, temos o apoio do Kartódromo de Araraquara para realizarmos nossos testes lá!
O pessoal do kartódromo é um apoio muito forte que a gente tem, lá conseguimos botar o carro numa condição muito parecida à da competição, que acontece na pista de kart lá do ECPA (acontecia, visto que em 2014 a competição mudou da pista de karts para o autódromo). Só que ir para o kartódromo envolve uma logística bem maior pra gente: temos que arranjar o caminhão que vai levar o carro e as ferramentas, o carro pra galera da equipe conseguir ir e, pra fechar, os dias que o kartódromo consegue nos ceder são só de segunda a quinta, ou seja, temos que matar aula também! Hehehe
Então ir no kartódromo significa botar na balança dois fatores muito importantes para a gente: Precisamos botar o carro na pista para que ele seja testado de verdade, com as situações de stress que as peças entram quando o carro tá andando a 100%, mas, ao mesmo tempo, precisamos ponderar se o carro está realmente pronto pra ir lá, considerando toda logística por trás.
Com tudo isso na conta, conseguimos botar o E60 em Araraquara algumas consideráveis vezes. E é muito bom! Passar o dia com o carro testando, mudando alguns parâmetros no motor, mudando a suspensão, abaixando tempo e rezando pra nada quebrar e não atrapalhar a vibe hahah
Agora com um fast-foward para a semana da competição:
Oficialmente a competição começou na quinta-feira, e como Piracicaba fica apenas a duas horas de São Carlos, decidimos que iríamos para lá na quinta-feira cedo mesmo. Com isso, podíamos usar os outros dias da semana para fazer alguns testes finais no carro e tentar refinar tudo. Mas nem tudo acontece como planejado…
Segunda-feira decidimos que seria bom fazer uma simulação da competição, botar o carro nas condições que ele estaria logo no final da semana e ver se todos os setups e calibrações estavam ok, e também dar outro dia para os pilotos treinarem e melhorarem os tempos. Chegamos na pista, e, depois de arrumar tudo, botamos o E60 para andar. Logo na primeira volta, ouvimos um barulho muito alto de engrenagem travando e o carro parando…. Fomos correndo para ver se estava tudo ok com o piloto e, claro, com o carro.
Segundo o relato do piloto o motor simplesmente deu um tranco muito forte e desligou, situação que a gente nunca tinha visto. Tentamos ligar algumas vezes ainda no kartódromo, mas em vão. Depois de colocar o carro de volta nos boxes e conversar bastante, decidimos voltar para nossa oficina e averiguar o que tinha acontecido. Assim que chegamos com o carro, convocamos todo mundo que precisava trabalhar para retirar o motor do carro e o pessoal responsável conseguir ver o que tinha acontecido.
Depois de algumas horas trabalhando em cima do motor (já madrugada adentro), descobrimos que o problema era mais sério do que pensávamos: Os rolamentos do pistão tinham esfarelado totalmente! O desespero que bateu na gente naquela hora foi algo que é difícil explicar: O projeto pelo qual nos dedicamos por quase 1 ano inteiro não tinha condições de correr por conta de uma falha provavelmente nossa.
Nos reunimos e discutimos bastante as opções que tínhamos, e nessa hora o senso de equipe fez muita diferença, já que a última ideia que nos veio à cabeça foi desistir da competição! Decidimos que alguns ficariam responsáveis por acordar cedo logo na terça-feira e ir correr atrás de peças que pudéssemos usar para remontar o motor a tempo da competição, já que ainda tínhamos 4 dias inteiros para fazer o carro voltar a rodar!
E foi ai que tivemos uma ajuda imensurável: O pessoal da Usicomp (essa empresa que está escrita nas nossas asas – e foi esse o grande motivo de colocarmos, além de toda ajuda durante o ano) disse que iria FABRICAR os rolamentos pra gente! E além de tudo, iriam fornecer pra gente os equipamentos pra conseguimos montar tudo de volta! O pessoal responsável pelo motor foi pra Santa Bárbara D’Oeste, local onde fica a empresa, no mesmo dia, e lá passaram o dia montando tudo.
Quinta-feira chegamos em Piracicaba para a competição, e o motor chegou logo depois. Montamos tudo de volta no carro e partimos para a inspeção técnica: era importante garantirmos que estávamos em ordem com as regras da competição, e no pior dos casos iríamos mexer no carro enquanto ligávamos o motor, afinal, não tínhamos nem testado ainda!
E60 na baía de inspeção técnica
Voltamos para a chácara e lá nos dedicamos em duas frentes: A primeira era reviver o motor recém-montado e ver se conseguiríamos correr com o carro, a segunda era deixar o pessoal que iria apresentar as provas estáticas estudar e ensaiar sem se preocupar tanto.
Fomos sexta-feira de volta para o ECPA e lá cumprimos com a agenda: Apresentamos todas as provas que estavam marcadas, e mandamos muito bem! Fomos para as finais da prova de design e ficamos em segundo na prova de marketing. Tudo devidamente apresentado, voltamos para a chácara agora com o objetivo de ligar o carro! Todos estávamos mexendo com isso desde segunda-feira, com horas de sono reduzidas a nada, mas ainda sem desistir, não até o último momento possível.
E foi sábado que tivemos nossa alegria! No penúltimo dia de competição temos três de quartro provas dinâmicas: Aceleração, skid-pad e Autocross. Juntas elas somam quase 30% dos pontos que podemos conquistar, e a meta era correr em todas e mandar bem! Às 10:30 da manhã, nosso motor estava vivo! Corremos para botar tudo no caminhão e chegar na competição para poder passar nas outras provas de segurança que não tínhamos passado por conta de não estar com o motor funcionando. Depois de conseguir todos adesivos, corremos para os locais de prova, porém não a tempo de pegar a pista aberta para Aceleração e Skid-Pad. Tudo bem, voltamos para os boxes e fizemos o setup do carro para rodar no Autocross à tarde.
Entramos na pista e o E60 mostrou para o que veio! Botamos o segundo melhor tempo da prova com o carro, e a nossa felicidade naquele momento era impossível de medir! Para tentar dar um gostinho pra vocês, segue o vídeo da volta:
Depois disso, era aguardar o que tinha para acontecer no enduro: O desafio dos 22km sem quebrar é grande, temos que tentar andar com o carro sempre no limite para tentar o menor tempo possível sem que ele apresente nenhuma falha, caso contrário não pontuamos na prova, e o primeiro lugar se torna impossível.
E chegou domingo…
Chegamos bem cedo no ECPA para preparar tudo com calma, fazer setup no carro, deixar os pilotos fazerem a caminhada na pista e estar preparado para os 22km. Botamos o carro na fila e esperamos… Até que o E60 foi para a pista, e completou a primeira volta! E enquanto comemorávamos, o carro parou, e o barulho não foi agradável aos nossos ouvidos. Mais uma vez o motor havia travado, e dessa vez o barulho era bem pior do que o do início da semana, e ali soubemos que o E60 não iria terminar o enduro.
Pois bem, chegamos ao final da competição e da saga do E60! Terminamos a competição em 6º lugar, uma posição que conseguimos garantir graças ao nosso bom desempenho nas outras provas. Sabíamos que o carro tinha um potencial imenso para correr muito bem, e que foi pela sequência de falhas com o motor que não pudemos ver ele dar 100% durante toda a competição.
No final de tudo, levamos ótimas experiências para a vida! Aprender a fazer um carro inteiro em um ano, com mudança de projeto do motor no meio do caminho, implementar aerodinâmica, controlar gastos, tudo isso adiciona demais à graduação fazendo juz ao nome de “atividade extra-curricular”. E além das experiências temos, claro, a equipe, a amizade entre os membros e o sentimento de família que compartilhamos é algo único.
Bom galera, é isso! Gostaria de agradecer ao pessoal do FlatOut pela oportunidade de poder contar um pouco do projeto aqui e também ao pessoal que comentou e ajudou a construir os textos. Tomara que tenham curtido um pouco e visto como é um pouco do nosso universo do Formula SAE no Brasil! Existem outros ótimos projetos sendo divulgados aqui no site, vale a pena conferir.
Abração!
Por Danilo Porto, Project Cars #100
Uma mensagem do FlatOut!
Danilo, apesar de ainda serem estudantes, você e sua equipe nos deram uma verdadeira aula de como se projeta e constroi um carro de corrida do zero. Uma pena que não conseguiram terminar o enduro, mas o simples fato de começar com uma ideia e um arquivo de computador e sair com um carro de corridas com motor, suspensão, freio, direção, carroceria e areodinâmica desenvolvidos por conta própria já é uma imensa vitória. Parabéns a todos da equipe e sucesso na carreira!