Olá, pessoal. Tudo tranquilo? Vocês já foram apresentados ao Tobias e agora chegou a hora de colocar a mão na massa. Hoje vou contar para vocês algumas histórias que vivi com o Tobias e depois mostrar o processo de funilaria e tapeçaria.
Bom, o Fusca é um carro bem popular, aliás, acho até difícil encontrar alguém com mais de 40 anos que nunca tenha andado em um, mas para a galera mais nova o besouro é um mistério. Eu me encaixo nesse grupo: nasci em 96, último ano de produção do besouro no Brasil. Eu nunca tinha andado em um e mal sabia como ele era. Por isso vou contar para vocês minhas impressões da primeira vez que o dirigi.
O câmbio é “bobo”, obviamente não tem a mesma precisão de carros modernos, mas não tem grandes segredos. A suspensão traseira dele é um tanto rústica, tendo de redobrar a atenção para passar em lombadas sem sentir uma dor no coração (aliás, a suspensão traseira é tão rústica que caso seja rebaixada fica com um stance bem característico, basta ver em modelos ratlook). No final das contas aquele velho clichê entusiasta “depois de dirigir um Fusca, você dirige qualquer carro” me pareceu errado, me senti muito mais conectado ao carro e tive muito mais facilidade de tocar o carro sem a famigerada morrida de novato ao volante do que em modelos mais modernos como o Logan da mamãe e o HB20 da autoescola. A direção é extremamente leve assim como o carro como um todo, afinal de contas, um carro com 760kg é um peso pena.
Aliás, a primeira vez que dirigi em via pública sem ser na autoescola foi com o Tobias para treinar para minha prova prática no Detran. Meu pai do lado, o feroz motor 1300 urrando seu poderoso ronco de batedeira misturado com máquina de lavar quebrado e então partimos. Visibilidade? Estranha. Potência? Mais do que o suficiente para alguém que não podia passar dos 30km/h na autoescola. O que me acontece? Um carro entra na contramão da rua de bairro onde eu estava e eu me assusto, mas o Fusca não se abala com o desvio de emergência demonstrando desenvoltura, alguns metros para a frente uma SW4 gigantesca da Força Tática surge no sentido contrário em um rua estreita onde eu estava passando e então descobri um ponto fraco do Tobias: Você não sabe onde o carro começa e termina com aqueles paralamas arredondados, mas não, não bati na viatura então já foi uma vitória.
Novas lanternas instaladas e o borrachão ainda sem corte
Alguns meses se passaram e finalmente estava com a grana necessária para a reforma, resolvi que faria a parte pesada estética toda de uma vez, então quando o carro fosse desmontado para a pintura, os bancos seriam enviados para o tapeceiro que ficava algumas quadras de distância do funileiro. O funileiro foi indicado por um outro viciado em Aircooleds que conheci em um encontro e o Itamar do cara estava brilhando, então o que poderia dar errado? Tudo.
A primeira ideia era repintar na cor original, conhecida como azul copa, mas acontece que em 1981 essa cor não era oferecida, aliás, em 1981 não existiam Fuscas azuis de acordo com a tabela de cores da Volkswagen na época, logo, o Tobias já havia sido pintado anteriormente, não só isso como o motor dele, apesar de ser 1300, também não era original, inclusive gastei dias indo no Detran fazendo a legalização do mesmo. Então tomei uma decisão: Não desperdiçaria um dia a mais indo no Detran fazendo alterações de documentação, então o carro seria azul, e como a cor não era mesmo original, decidi que escolheria o azul mais bonito que conseguisse encontrar.
Um Fusca azul copa original
Comecei então a procurar fotos de besouros azuis pela internet para me decidir, eu queria uma cor forte mas que não fosse escura demais também, por fim encontrei um Fusca que me serviria de referência a partir daquele momento, encontrei ele como “Fusca Azul Laguna”, apesar de não ser exatamente essa cor.
Essa era a referência do que eu queria
Mostrei a referência para o funileiro e ele mostrou no catálogo uma cor (também original da VW) chamada “Azul Arara, não era igual, mas era bem semelhante e um pouco mais forte… me dei por satisfeito e deixei o serviço na mão dele. Três semanas depois, sem notícias do dito-cujo, resolvo aparecer de surpresa para ver o progresso do carro (quem sabe vê-lo pronto conforme o prazo?).
Já viu cabide com rodas? Pois é…
O cara basicamente só tinha tirado os parachoques e os faróis, devo dizer que fiquei desapontado, mas já sabia que palavra de funileiro é tão confiável quanto platinado de Fusca, então cobrei um avanço mais rápido, tive de relembrar a cor que queria pois ele nem recordava mais e voltei para a casa emburrado, pelo visto ia ter de pressionar o cara para o trabalho ser feito. Umas três semanas para frente finalmente recebo a chamada que eu esperava: O carro tinha sido pintado e antes de montar as peças o cara queria um “Okay” da minha parte. Ainda sem habilitação, fui de carona com a minha mãe e tenho uma surpresa…
Alguém me beslica e diz que é um pesadelo?
Meu Fusca estava com cor de calcinha desbotada… fantástico. Como se não bastasse o nervosismo de ver a cor errada, ainda estava acompanhado da minha adorada mamãe, que fez questão de repetir incontáveis vezes o quão errada estava a cor no meu ouvido e escuto a pérola do funileiro: “Ah, eu achei que a cor não estava certa, pensei em ligar para confirmar mas como o serviço já estava atrasado, decidi pintar logo”.
Apesar do erro ser obviamente dele, tive de bancar a tinta nova, mas dessa vez quem foi comprar fui eu: Se quer algo bem feito, faça você mesmo. Desta vez, para não haver mais confusões olhei o catálogo e peguei o código, mas a cor que escolhi dessa vez era Azul Pepsi, um tom mais moderno mas ainda dentro da Volkswagen. Tinta na oficina, mais um mês de prazo e volto novamente decepcionado para casa. Mas agora já estava tudo acertado, com o carro desmontado o tapeceiro recebeu os bancos e começou a fazer a forração em courvin preto que eu tinha encomendado. Quatro meses de espera desde o dia em que o Tobias saiu de casa, em uma sexta-feira ensolarada, recebo a ligação que eu tanto esperava: o interior estava pronto e eu podia levar o carro para casa.
Mas como? No dia meu irmão não estava em casa, eu já tinha 18 anos mas não tinha habilitação e a funilaria ficava longe, além disso, meus pais haviam se separado recentemente e meu velho não estava mais morando em casa (o que acabou quebrando todo o propósito do projeto de família) e eu simplesmente não conseguiria esperar até segunda para ir buscá-lo. Saquei meu celular e chamei meu amigo Gabriel (meu brother gearhead desde sempre), mas ele não poderia me ajudar. Eu só tinha mais uma pessoa habilitada que podia me ajudar naquela sexta-feira: minha amiga Ana, ela não dirigia um carro manual desde que tinha tirado a carta, mas topou na hora me ajudar a levar o carro para casa. Nos encontramos no funileiro e lá estava o Tobias em toda sua glória.
Finalmente o Tobias ficou azul
Entrei no Fusca com minha amiga ao volante e minha mãe seguindo com o carro dela… momentos de tensão… Bom, o que se seguiu foram peripécias de quem se esquece do que é dirigir um carro manual: alguns trancos, morridas e até cantada de pneu. Mas foi naquele momento que descobri a mágica de se ter um besouro em bom estado, ainda mais azul. As pessoas ficavam sorrindo para o carro, dando pancadas umas nas outras e gritando “Fusca Azul!!!”, agora o Tobias era um senhorzinho muito popular e a cor estava servindo ao seu propósito.
Interior ainda sujo depois de voltar para casa
No entanto, nem tudo são flores para os besouros veteranos. Quando finalmente consegui minha habilitação meu pai me disse “Não comprei o Tobias para ser seu carro, mas para ser um projeto de família, você precisa de um carro para você”. O que isso queria dizer? O Tobias viraria um sem-teto…
Por Bruno Pelegrine, Project Cars #258