Boas! Meu nome é Eliezer Messias, tenho 40 anos e sou motorista socorrista. Acompanho o FlatOut desde os primórdios, e a equipe desde os tempos do Jalopnik Brasil. Sou amante dos offroads desde sempre, isso vale pra qualquer modalidade de esporte fora de estrada. Não que eu pratique como modalidade esportiva, mas por hobby só. Aliás, por coincidência o post inaugural do FlatOut é o nosso amigo Colin McRae dando uma empurradinha com pé no seu Focus de Rali – pra quem não se lembra, está aqui.
Sou de uma cidade minúscula no Sul de Minas chamada Itapeva. Fui criado na Zona Rural onde desde muito cedo temos contato com maquinas agrícolas, então desde muito pequeno já estava em cima de um trator — que não deixa de ser um veiculo offroad. Tive motos, Fuscas, trabalhei com transporte escolar na zona rural numa Kombi, mas com o tempo as coisas mudaram, vim morar na cidade me casei e me distanciei um pouco dos veículos offroad.
Até o dia em que comprei um Lada Niva.
Me deu muitas alegrias e por incrível que pareça tenho só essa foto, (tirada com um Nokia 6681 que era um celular top-de-linha na época). Depois acabei vendendo o Niva. Tive vários carros pro dia-a-dia, mas nenhum off-roader — o que não significa que eu não pudesse me virar:
Quem disse que um Clio 1.6 não traz diversão na lama?
E pra voltar a praticar offroad, juntei com a galera da cidade que tem gaiola e montei um Fusca Baja, feito a martelo e talhadeira com apoio de um grande amigo que agora está em SP, o Zoltan.
Foto 4 (legenda: a Minha filha Ana em primeiro plano e os colegas se divertindo)
Fiquei um tempo com o Fusca e acabei vendendo, dando um tempo das trilhas. Naquele ano eu estava com um Polo 2004.
Comigo por três anos, eu já estava louco para trocar de carro. Queria de todo modo um 4×4. Pesquisa vai, pesquisa vem, revirei a internet atrás de alguma coisa pra fazer rolo no Polo. Algo que não precisasse de muito dinheiro na diferença. Não achava nada. Um belo dia em meados de julho de 2016, meu genro Henry Junior me mandou uma mensagem: “Você viu o anuncio no Facebook, da Hilux?”
Fiquei doido: “Henry, manda mensagem pro vendedor e marca de irmos lá amanhã cedo”. No dia seguinte, bem cedo chegamos lá; a Hilux estava numa cidade a uns 35 km da minha, enfiada numa garagem estranha e cheia de coisas por cima. O vendedor era o segundo o dono. O motor havia travado fazia um ano e meio e a picape ficou encostada desde então.
Na hora dei nome de “Onça”, com um tom pejorativo referente à bomba que podia ser essa compra.
Esta foi a primeira vista da onça
Mas como seria a oportunidade da minha vida não podia desperdiçar.
No anúncio dizia que ela era 1997, mas pedimos o documentos pro proprietário — um senhor de quase 80 anos —, e o correto é 1993, motor 2.8, diesel, capacidade de 1 ton. eixo rígido dianteiro. Apesar de parada a algum um tempo os documentos estavam em ordem, pagos e sem multas.
Conversa vai, conversa vem, o hominho conta toda a história da pick-up, que ela veio do RJ, tinha sofrido um acidente e tal. Vamos ao que interessa: o valor. O Velhinho vem com história que vale muito mais e tal, aí falei: “Olha motor diesel é caro pra mexer, pode gastar mil ou 10 mil, é um tiro no escuro, o senhor está a pé sem carro tenho um Gol 1997, se interessar te passo ele mais duas de R$ 500. Ele pensou, pensou, pensou, e pediu que levasse o Gol para ele dar uma olhada.
No outro dia eu tava de plantão dei dinheiro pro meu genro abastecer e pedi que levasse o Gol e fechasse o negócio. Logo cedo o Henry foi lá fechou o negócio e ficou acertado de no sábado ir buscar com o guincho. Aí bateu aquela ansiedade, sábado não chegava nunca. Vai que esse velho desiste do negócio?
Contratei o guincho de um amigo aqui na cidade, eu estaria trabalhando de novo e vai lá foi Henry, meu braço direito. Dei os dois cheques, o dinheiro do guincho, jogaram o Gol em cima e borá lá. Passou um pouco e o Henry me manda as fotos da “Onça” em cima do guincho.
Bateu aquele alivio. Deixamos a “Onça” em frente a casa do Henry, e fui correr atrás de mecânico pra poder mexer.
No outro dia a filha do homem liga pro meu genro, furiosa: “Vocês vem aqui, fazem negócio com um senhor de 80 anos e “furam os olhos” dele? A pick-up vale R$ 30.000. Mesmo gastando R$ 10.000 vocês ainda ficam com R$ 20.000 porque o Gol não vale nada. Procuramos na tabela Fipe o valor da Hilux e ligamos de volta: “A picape vale R$ 20.200. Seu pai está lúcido e fechou um negócio comigo”. Fiz logo as transferências e ainda banquei a transferência do Gol.
Aí começou a saga para botar a “Onça” pra urrar. Tem um mecânico amigo meu que, meio relutante, resolveu enfrentar o desafio. Depois de combinar os valores de mão de obra juntei o dinheiro e paguei a mão de obra à vista. As peças são mais baratas, pago no cartão mesmo.
Aí começa o suor frio, o medo de gastar o que não tinha nem podia, mas como era um risco não calculado que eu aceitei que vá assim. O mecânico pediu uns dois dias pra desmontar e dar um diagnóstico, eu tava trabalhado e toda hora passava lá dar uma olhada.
Ele começou o desmonte por baixo, e por incrível que pareça, minha sorte e felicidade não era nada grave, apenas uma biela tinha colado o que causou o travamento. Tiramos a biela mandei conferir se não tinha ovalado numa retífica de um colega aqui da cidade. Um centésimo de ovalação. Deu um passe, trocou a bucha e fez tudo na cortesia.
Agora partimos pra parte de cima, tiramos o cabeçote, estava muito bom, mas um dos pistões estava com a canaleta quebrada. Comecei a correr atrás das peças, jogo de bronzinas, jogo de anéis, jogo de juntas, e o tal pistão quebrado. Revirei Bragança Paulista, que fica pertinho da minha cidade e não achei nada das peças. Tudo só por encomenda, mas acabei achando o mais “importante”: o pistão. Um jogo com os 4 pistões novos eram R$ 700. Não queria comprar o jogo completo e fui atrás de um bom pistão avulso. Cheguei lá, uma oficina pequena, mas só tinha carros importados, falei com o mecânico e ele disse que tinha a peça. R$ 50 reais e 50% resolvido. Ficaram faltando as demais peças, que fui procurar em São Paulo.
Em três dias consegui reunir as peças, entreguei ao mecânico e em quatro dias o carro estava ligado:
Eu tava louco pra saber como estava a tração, afinal era o mais interessante, peguei a Ana Carolina, minha filha, e fomos dar uma rolê. No primeiro morro cheio de pedras parei no meio da subida e falei pra Ana: “Agora é a hora da verdade!”
Arranquei em 1º e só pedra que voou pra trás, segura no freio aí, falei pra ela. Desci, ela tem de ser acionada na roda livre manual, trap, de um lado, trap do outro, alavanca na posição, indicação 4WD no painel, vou sair e pá, nada de pedra pra trás, saiu firme colada no piso, o sorriso foi de orelha a orelha: “Aí, Ana, tá 100% a tração!”. Subimos num pasto, brinquei um pouco.
Ela aí toda originalzona.
Pronto. A Hilux estava como eu queria: motor funcionando e tração ok. O próximo passo seria a customização — mas isso fica para o próximo capítulo!
Por Eliezer Messias, Project Cars #408