Sabe aquela noção de que limites mais baixos resultam sempre em menos mortes no trânsito? Pois a Inglaterra acaba de descobrir da pior forma possível que isso nem sempre funciona. Eles criaram zonas de 20 mph para tornar o trânsito mais seguro, mas em vez de reduzir o número de mortes, eles aumentaram.
A ideia de que a velocidade reduzida ajuda a reduzir o número de mortes é baseada em modelos matemáticos que consideram a velocidade, o tempo de reação e o tempo de parada do veículo. Quanto mais devagar o veículo está, maiores as chances de evitar um impacto.
Mas… isso só é verdade quando o motorista e o pedestre estão atentos ao ambiente viário — ou seja: quando o motorista percebe o risco de atingir um pedestre/ciclista ou quando o pedestre percebe que pode ser atropelado.
O que aconteceu na Inglaterra foi o seguinte: em 2016 os condados de Bath e North East Somerset criaram 13 zonas de baixa velocidade (20 mph; 32 km/h) visando reduzir o número de acidentes fatais. . As outras seis áreas viram os números de mortes inalterados ou reduzidos — estes, em especial, nas regiões centrais da cidade.
O motivo, segundo as autoridades locais, é que após a redução de limites, pedestres e motoristas passaram a assumir que a segurança está garantida devido aos limites reduzidos e, por isso, tornam-se menos cautelosos.
O mesmo aconteceu em outras regiões do Reino Unido, como mostrou que analisou as estatísticas de trânsito ao longo de um ano em Portsmouth, a primeira localidade a adotar estas zonas de 20 mph, que abrangeram 94% das ruas da região.
Os resultados da análise mostraram que apesar de uma redução sensível de 2,1 km/h na velocidade média — de 31,9 km/h para 29,8 km/h — e de uma redução de 22% no número de acidentes, o número de fatalidades aumentou de 18 para 20.
O estudo não apontou as possíveis causas do aumento do número de mortes, porém observou-se que o número de acidentes foi reduzido em zonas que tiveram a redução de 30 mph para 20 mph associadas a outras medidas de moderação do tráfego (traffic calming) como lombadas, faixas mais estreitas, mudanças de direção e sinalização reforçada.
Isso reforça a ideia de que , não por mera desobediência deliberada, mas devido ao conceito de velocidade operacional, como já vimos anteriormente. Da mesma forma, radares ocultos não garantem a segurança: se a intenção é reduzir a velocidade dos carros, os motoristas precisam perceber a necessidade de reduzir o limite, uma vez que nem sempre a sinalização é suficiente.
Some isso ao fato de que o número de acidentes fatais foi menor no centro das cidades do que em áreas suburbanas, e podemos supor que o motorista e os pedestres/ciclistas tendem a ficar mais atentos onde o movimento é maior, ainda que as velocidades operacionais sejam baixas. Em outras, quando não há movimento intenso, os motoristas e pedestres/ciclistas sentem-se seguros para desviar a atenção, ainda que brevemente.
Isso é uma tendência observada nos EUA, . A fonte da distração?
Aqui é importante lembrar que em algumas ruas de São Paulo também houve aumento no número de mortes após reduções nos limites de velocidade. A diferença aqui, é que não temos estudos ou investigações de acidentes para ajudar a determinar as causas e pontos críticos dos acidentes fatais, tampouco uma base nacional de dados estatísticos unificada.
Isso mostra, mais uma vez, que o trânsito não é uma ciência exata que pode ser controlada por modelos matemáticos utopicamente infalíveis. Como vimos, o mantra que repete “redução de velocidade salva vidas” não ajudou muito as pessoas que morreram após as reduções de 30 mph para 20 mph. O trânsito é complexo demais para ser comandado pelo senso-comum.
Especialmente quando o dinheiro acaba, como aconteceu com os ingleses, que não poderão reverter os limites, nem adotar novas medidas porque o orçamento foi todo gasto com a criação das zonas calmas.