Desde que foi inventado, o automóvel evoluiu muito pouco em sua essência. É um veículo de quatro rodas equipado com motor a combustão, com rodas dianteiras que esterçam. Isso ajuda a descrever boa parte dos veículos criados de 1886 até hoje. Mas e os arroubos de inovação que eram tidos como certos? E o futuro que um monte de gente dava como certo, mas que nunca passou praticamente de ficção científica? Precisamos de sua ajuda para lembrar de tudo que já foi futuro e que nunca passou de esboço. Para isso, a gente começa e aponta uma inovação que até lamentamos por não ter se concretizado: o carro movido a turbina.
O exemplo mais famoso deve ser o do Chrysler Turbine Car, que os americanos chamavam de TC (cada um tem o TC que merece…). Criado pela Chrysler em 1962, ele foi projetado para ser um experimento prático, ou seja, a intenção era realmente fabricá-lo e vendê-lo ao público. Tanto que foram criados 5 protótipos e 50 modelos “de produção”, digamos assim, que foram entregues a 203 pessoas. Cada uma ficou com o carro por três meses e anotava as coisas boas e ruins que o modelo apresentava.
O Turbine Car tinha 5,12 m, 2,79 m de entre-eixos, 1,85 m de largura e 1,36 m de altura. As carrocerias eram feitas na Itália, pelo Studio Ghia, e enviadas aos EUA para receber o trem de força, composto também por um câmbio automático TorqueFlite de três marchas, sem conversor de torque, que podia travar a turbina secundária. Pesava cerca de 1.800 kg em ordem de marcha. Usava uma turbina Chrysler A831, que rendia 132 cv, mas inacreditáveis 58,7 mkgf. Como ela girava a 45.700 rpm, a marcha lenta ficava em 22.000 rpm.
A turbina era muito mais simples e interessante de um ponto de vista de construção (com 60 peças em vez das 300 de um motor a combustão com pistões). Também tinha vantagens de peso e era capaz de queimar qualquer coisa que pegasse fogo: etanol, metanol, óleo de cozinha, gasolina, diesel… A partida era dada com querosene e a Chrysler pedia encarecidamente que ninguém abastecesse o carro com gasolina com chumbo tetraetila. O aditivo causava depósitos nas pás da turbina.
O fato de ele queimar qualquer coisa que pegasse fogo não era uma grande vantagem considerando o preço da gasolina nos EUA na época, que era muito barata. Sua facilidade de manutenção, já que ele tinha apenas uma vela e não precisava de trocas de óleo, também não atraiu a atenção.
O grande problema da turbina é que ela não havia sido feita para girar pouco. Por conta disso, na estrada e com o pé embaixo, o consumo de combustível era de pouco mais de 8 km/l, mas a média era de 6 km/l. Se rodasse só na cidade, seu consumo era ainda pior.
A resposta do acelerador era terrivelmente lenta. Dizem que o lag entre pisar e sentir o carro embalar era de mais de um segundo. Ao final dos testes, que duraram cerca de dois anos e mais de 1,6 milhão de km, os carros foram recolhidos e oferecidos a museus. Quase nenhum aceitou um carro novo em folha, uma falta de visão inacreditável dos administradores. Dos 55, só 9 sobreviveram. Os outros 46 foram escrapeados.
Jay Leno é um dos poucos caras do mundo a ter um exemplar do Turbine Car. Se estiver com tempo, vale ver o programa que ele fez apenas sobre o carro, aparentemente uma paixão adolescente do apresentador. “Parecia realmente o futuro”, diz Leno a certa altura do vídeo. Repare no ruído que ele emite. De olhos fechados, você diria ser um avião.
Mas o Turbine Car não foi o único carro a se aventurar pelas turbinas. A GM teve também os Firebird, dos quais o mais famoso, provavelmente pelo estilo, é o Firebird II.
Chamado de XP-43, ele tinha 5,96 m de comprimento, 3,05 m de entre-eixos e uma turbina que gerava, em 1956, 204 cv. Ele também tinha freios a disco e suspensões independentes nas quatro rodas. Ele seria também autônomo, uma moda que anda querendo voltar…
Entre as tentativas modernas de trazer a turbina de volta aos automóveis, uma partiu do próprio Jay Leno, que construiu, com a ajuda da Alcoa e da GM, o EcoJet foi apresentado ao público no SEMA Show de 2006. Vinha com uma turbina Honeywell LTS101, que gerava 660 cv e 80,6 mkgf, um câmbio automático de quatro marchas, emprestado de um Corvette C5, assim como as suspensões. A carroceria, em fibra de carbono, foi construída pelos Metalcrafters. Vale conferir o vídeo que mostra a construção do carro.
Uma outra, menos direta ao ponto, foi o Jaguar C-X75.
Apresentado como conceito, ele usava turbinas, mas não como a principal fonte de propulsão do modelo. Elas serviam como geradores de energia elétrica para cada um dos quatro motores do carro, um para cada roda. Com as microturbinas, fornecidas pela Bladon Jets, a autonomia do supercarro, que podia acelerar de 0 a 100 km/h em 3,4 s e chegar à máxima de 330 km/h, era de mais de 900 km. A gente cita mais porque o carro é lindo. A proposta é claramente diferente das demais.
Além do uso de turbinas nos automóveis, que outro futuro brilhante e prometido não passou de sonho de virgem bêbada em noite de lua cheia? Por favor, recorram à memória e lotem nossa caixa de comentários com ideias!