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Renault Sherpa Light: o Hummer francês que chegou ao Brasil

Podemos não vê-los no Brasil mas a Renault também fabrica caminhões. E há quase tanto tempo quanto os carros – os automóveis da Renault começaram a ser produzidos em 1901, e os caminhões chegaram cinco anos depois. Ao longo das décadas, a divisão de caminhões da Renault teve vários nomes – como Saviem, entre 1956 e 1976, e Renault Véhicules Industriels até 2002, quando a empresa passou a se chamar Renault Trucks.

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E foi a Renault Trucks quem criou o Sherpa, veículo militar 4×4 cujo nome faz referência ao povo Sherpa, que há séculos vive nos arredores do Monte Everest.

Os Sherpa são, tradicionalmente, guias para aventureiros que se arriscam na montanha – e alguns estudos encontraram evidências de adaptações genéticas que os tornam mais resistentes ao frio e capazes de aproveitar melhor o oxigênio em regiões de grande altitude e ar rarefeito.

Mas você também pode chamar o Renault Sherpa de “Hummer francês”.

Agora, diferentemente do Hummer, que foi criado para servir ao exército americano e deu origem a um carro de rua – um dos maiores e mais exagerados carros de rua já feitos – o Sherpa só é produzido para uso militar. No Brasil, inclusive.

O Sherpa foi apresentado em 2006 durante a Eurosatory, feira de equipamentos de defesa e segurança em Paris. A produção começou pouco depois, em 2007, nas variantes Sherpa 2 (picape de dois lugares) e Sherpa 3 (jipe de quatro lugares, cinco ou dez lugares).

Em conceito, ambos eram muito semelhantes ao HMMWV americano – um chassi de caminhão com carroceria reforçada, configurações de passageiros ou carga, e alta capacidade off-road. Mas a Renault fazia questão de enfatizar que o Sherpa 2/3 tinha vão livre do solo maior que o do Humvee – e podia atravessar alagamentos de até 1,5 m de profundidade. Na verdade, todas as suas dimensões eram maiores que o utilitário da AM General: 5,90 metros de comprimento, 2,20 m de largura e 2,10 de altura. A suspensão era a mais simples possível, com eixo rígido e molas helicoidais na frente e atrás.

Produzido na fábrica da Renault Trucks em Lyon, o Sherpa vinha com um motor turbodiesel Renault de 4,8 litros, capaz de entregar 218 cv – o suficiente para atingir 120 km/h de velocidade máxima, o que é bastante para um 4×4 de pelo menos 7.700 kg. E ainda conferia excelente autonomia de 800 a 900 km com um tanque de combustível. O câmbio era sempre automático, e a tração sempre 4×4 com reduzida.

A versão de 7.700 kg, porém, era a mais simples e leve, sem blindagem pesada – esta era opcional, e podia fazer com que o Sherpa passasse as dez toneladas. A versão mais resistente do Sherpa tinha blindagem STANAG 4569 nível 2 – o que, na prática, significa que ele podia resistir a tiros de fuzil 7.62×39 a uma distância mínima de 30 metros e minas terrestres com massa explosiva de até 6 kg. Mas mesmo as versões sem blindagem opcional ofereciam um grau relativamente alto de proteção contra tiros de armas leves, em parte graças ao uso de vidros blindados independentemente da blindagem da carroceria.

O Sherpa 2/3 passou a se chamar Sherpa Light em 2010, quando também foram apresentadas novas versões de carroceria voltadas para uso militar mais pesado, incluindo suportes para metralhadoras no teto. No geral, porém, o Sherpa sempre foi vendido pela Renault como um veículo de reconhecimento, patrulhamento e exploração, e não de combate.

O Sherpa original é utilizado por diversos países, importado da França, onde é produzido desde 2018 pela Arquus, empresa criada a partir da divisão militar da Renault. O nome “Arquus” é um amálgama de armaequus (“cavalo” em latim) – de certa forma, pode ser entendido como “Cavalo de Guerra”. Só no Kuwait, por exemplo, existem 240 unidades do Sherpa em serviço.

Na Arábia Saudita, 100 deles estão em operação. Na França, mais de 200 exemplars do Sherpa são utilizados pelas Forças Especiais Francesas. Nos EUA, México e Canadá, os Sherpa são vendidos pela tradicional fabricante de caminhões Mack, que os produz sob licença.

E existem Sherpa até mesmo no Brasil – três exemplares foram comprados pela Polícia Federal em 2015 para reforçar a segurança durante a Olimpíada de 2016, realizada no Rio de Janeiro. No total, os veículos custaram R$ 5,24 milhões.

Mas o Brasil também chegou muito perto de ter sua própria versão do Sherpa. Em 2015, a Avibras Indústria Aerospacial apresentou ao Exército Brasileiro sua proposta para a Viatura Blindada Multitarefa Leve de Rodas (VBMT-LR). A base foi o Sherpa, cujo projeto foi licenciado à empresa brasileira e adaptado para se tornar o Avibras Tupi.

Com nacionalização projetada de 60%, o Avibras Tupi proposto era praticamente idêntico ao Sherpa Light original, com exceção do motor adaptado para queimar querosene aeronáutico e biodiesel. A Avibras chegou a garantir que conseguiria produzir entre 30 e 32 unidades em um período de seis a oito meses.

A disputa entre fabricantes, porém, foi vencida pela Iveco com seu LMV – mas a Avibras levou adiante o desenvolvimento de sua versão do Sherpa Light, que hoje faz parte do seu portfólio. É o “nosso” Hummer francês – feito no Brasil.