Lançado em 1984, o Santana foi o primeiro modelo “de luxo” da marca no Brasil – por mais que o VW Passat já estivesse no mercado havia dez anos, a imagem da Volks ainda estava muito ligada a carros populares e ao motor boxer arrefecido a ar. O Santana mudou a percepção da marca pelo público e ainda foi um projeto muito bem sucedido, passando por duas reestilizações e garantindo sua permanência na linha até 2006. Ainda que tenha terminado seus dias como o favorito dos frotistas por seu projeto arcaico, porém confiável, pode-se dizer sem medo de errar que o Santana foi um grande sucesso do início ao fim de sua passagem pelo Brasil.
O Santana, porém, nada mais era do que a segunda geração do VW Passat com outro nome, algo que muitos ignoravam na época do lançamento. E, embora na Europa ele não tenha tido o mesmo impacto que teve por aqui, os europeus tiveram algumas versões bem interessantes que jamais deram as caras no Brasil. Como o Passat Variant Syncro: uma Quantum que, além de um sistema de tração integral baseado no Quattro da Audi, ainda tinha um motor cinco-cilindros que também era derivado dos carros de Ingolstadt. Parece bom demais para ser verdade, mas era real, como já contamos neste post.
O Passat Syncro foi lançado em 1984. O motor cinco-cilindros, cujo projeto era derivado do VW EA-827 (que também deu origem ao nosso VW AP e nasceu na Audi), podia ter dois litros e 115 cv ou 2,2 litros e 120 cv. Já o sistema Syncro era praticamente o mesmo sistema quattro da Audi, usando três diferenciais – um em cada eixo, e mais um diferencial central, no meio do cardã. Este tinha bloqueio mecânico e, com isto, compensava a diferença de velocidade entre os eixos e, além de impedir a quebra do sistema, proporcionava qualidade de rodagem e tração superiores.
O sistema usava o arranjo do eixo dianteiro do Audi 80 como base para o eixo traseiro, que recebia um diferencial idêntico. Um terceiro diferencial era instalado no eixo cardã, com bloqueio mecânico, compensava a diferença de velocidade entre os eixos, impedindo a quebra do sistema e proporcionando uma qualidade de rodagem e tração superiores.
Um aspecto importante do sistema Syncro é que ele foi concebido para carros com motor longitudinal. E esta característica certamente ajudou um entusiasta alemão chamado Tobias Herrmann a montar o carro que viemos mostrar a vocês: um Santana com motor V8 Audi e tração integral. O que, considerando o parentesco do Santana com o Audi Quattro, está totalmente dentro da família.
Embora tenhamos dito que o Santana na Alemanha não teve o mesmo impacto que no Brasil, seria um erro afirmar que ele não tem uma dedicada comunidade de fãs europeus. E você se surpreenderia com a quantidade de projetos interessantes feitos com base no Santana alemão. Instalar mecânica Audi cinco-cilindros, incluindo o motor do Audi Quattro de rua, é algo relativamente comum por lá.
Tobias queria algo diferente. Usando como ponto de partida um Passat B2 que encontrou parado, juntando poeira em uma garagem, e que comprou por um valor bem camarada, ele decidiu que utilizaria um V8 period correct, ou seja, fabricado mais ou menos na época em que seu carro: um V8 de 3,6 litros que originalmente equipava o Audi V8.
O Audi V8 merecia o nome que tinha: produzido entre 1988 e 1993, ele foi o primeiro Audi com motor V8. E também foi o primeiro a juntar o sistema de tração integral Quattro com um câmbio automático. O Audi V8 foi o precursor doA8, que é até hoje o modelo de topo da Audi – o maior, mais potente e mais caro carro da marca. Seu motor V8 deslocava exatamente 3.562 cm³ (diâmetro x curso de 81×86,4 mm), tinha comando duplo nos cabeçotes e taxa de compressão de 10,6:1, e era alimentado por um sistema de injeção eletrônica multiponto. Era o bastante para entregar 250 cv a 5.800 rpm e 34,7 mkgf de torque a 4.000 rpm. Tobias não fez nenhuma alteração no motor e, honestamente, nem precisava: 250 cv em um Santana?
Incrivelmente não foi necessário realizar modificações radicais na estrutura do cofre, bastando a fabricação de suportes sob medida para o V8. Dito isto foi preciso fabricar um novo sistema de escape com coletores que se acomodassem no pequeno espaço entre o bloco e as paredes dos para-lamas, e também um novo radiador.
A tubulação do escapamento foi feita de forma a passar por baixo do túnel de transmissão, dividindo espaço com o cardã.
Além do mais, Tobias levou algum tempo para descobrir que o câmbio correto para o projeto seria o manual de cinco marchas do Audi Quattro, que encaixou-se perfeitamente no motor V8. A ECU é exatamente a mesma com a qual o motor saiu da fábrica da Audi em 1989, e não teve problemas para ser adaptada.
O restante do carro segue a cartilha dos Volkswagen modificados não apenas na Europa, mas no resto do mundo: suspensão com amortecedores ajustáveis do tipo coilover, rodas BBS RS 3-piece de 17×8 polegadas e pintura nova em folha, na elegante tonalidade dourada original.
O carro ficou cerca de 110 mm mais baixo com o novo setup, mas isto não anula outra característica bacana do projeto: a discrição. É comum ver exemplares do Santana com suspensão rebaixada, mas só quando o capô está aberto (ou é retirado para fotos) é que se percebe o segredo guardado pelo Santana.
Do lado de dentro a situação se repete: volante, revestimentos internos e todos os detalhes de acabamento são originais. No entanto, como sabemos, um project car raramente é concluído – parte da graça é justamente encontrar novos detalhes para modificar e resolver. Assim, Tobias posta as atualizações sobre o carro .
Há quem chame o carro de sleeper e, de fato, apesar da suspensão rebaixada, nada mais entrega as modificações realizadas. Nos perguntamos se existe alguém disposto a colocar um motor V8 Audi em um Santana brasileiro ou, melhor ainda, que esteja fazendo exatamente isto…