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Projetos

Sinistro mesmo é este Pontiac Firebird com 600 cv e tração 4×4 de Skyline GT-R

Na cena dos muscle cars, os restomods estão entre os projetos mais populares – mantém-se a essência clássica do carro, de forma geral, porém acrescenta-se mecânica mais moderna, toques pessoais na estética e modificações na suspensão e nos freios para trazer a dinâmica para o século 21. Também vemos muitos projetos de restauração completa e fiel, buscando resgatar ao máximo a originalidade do carro – fora, é claro, os survivors, cujo objetivo é literalmente preservar a originalidade do trabalho de fábrica, com todo o charme da pátina. Todas estas escolas têm o seu valor.

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De tempos em tempos, porém, aparece algum entusiasta que (usando um jargão já batido) pensa fora da caixa e parte para algo totalmente inovador. Hoje vamos tratar de um caso assim: Gregg Hamilton – que é o mecânico-chefe da Hoonigan, a equipe do Ken Block – e seu Pontiac Firebird Trans-Am. Fora da caixa, na verdade, é pouco para ele: trata-se de um Trans-Am de segunda geração com motor V8 família LS com compressor mecânico e… tração nas quatro rodas vinda do Nissan GT-R, acompanhados de uma mistura de componentes de ferro-velho e peças feitas sob medida, e temperados com um look à la Mad Max.

Gregg acompanha Ken Block desde 2005 e esteve envolvido em literalmente todos os projetos do piloto – do Impreza WRX à picape Ford Hoonitruck. Ou seja: ele entende algumas coisinhas sobre mecânica e fabricação em metal. Ele já tinha montado um Pontiac Firebird antes, um projeto restomod inspirado no original, porém com alguns elementos pessoais mais modernos e um motor V8 biturbo. No entanto, depois de um tempo, Gregg diz ter enjoado um pouco da rotina de manter um projeto daquele calibre – todo perfeito, sem amassados, riscos ou qualquer tipo de dano. Ele queria algo mais bruto e maléfico, que pudesse carregar e trazer marcas de guerra. Então, passou os últimos dois anos montando este Firebird meio monstro de Frankenstein.

De cara, à primeira vista, o carro parece um Firebird antigo meio judiado, com pintura craquelada e pontos de corrosão aparentes, quase como um rat look. Isto é totalmente proposital, porque Gregg queria um projeto no qual pudesse concentrar-se exclusivamente na mecânica, sem se importar com a aparência. Mas o descuido com o carro é algo calculado, com direito a um spoiler dianteiro feito sob medida, um spoiler traseiro inspirado no original, porém consideravelmente maior, rodas novas (já vamos falar mais sobre elas) e, como um toque final, um emblema GT-R na traseira. Este último tem sua razão de ser.

O V8 LS, de acordo com Gregg, veio de uma picape Chevrolet encontrada em um ferro-velho, e foi todo desmontado e preparado com novos componentes, incluindo cabeçotes de alumínio. O diferencial dianteiro também veio de um ferro-velho, retirado de um Infiniti Q45. Vários componentes, na verdade, vieram de carros diferentes, como o subchassi dianteiro de um Corvette C6 Z06 (que também cedeu os freios) e o diferencial traseiro de um Nissan 300ZX.

 

No entanto, a parte mais impressionante é a transmissão, que usa componentes de Skyline GT-R. Mais precisamente, o câmbio manual de cinco marchas do R32 e o diferencial central do R33, incluindo o sistema eletrônico ATTESA para variar o torque entre os eixos. O módulo de controle foi alojado no porta-malas, onde divide espaço com um dos tanques de combustível (há outros dois onde ficava o banco traseiro), e reprogramado especificamente para o projeto. O sistema do Skyline envia quase todo o torque para as rodas traseiras em condições normais (cerca de 98%), e pode transferir até 50% do torque para o eixo dianteiro conforme o sistema detectar necessidade – considerando o torque seco de V8 supercharged, esta necessidade provavelmente é um estágio quase permanente.

A suspensão usa amortecedores feitos sob medida e um arranjo pushrod na dianteira e na traseira, ficando ancorado em uma estrutura tubular. As bitolas ficaram mais largas, mas Gregg não se preocupou em alargar o lado de fora dos para-lamas. Em vez disto, ele instalou pneus 295 nas quatro rodas, para que eles propositalmente ficassem projetados para fora.

A inspiração de Gregg foi o próprio Mustang Hoonicorn – projeto tocado por ele, que também consistia em um muscle car clássico com motor V8 sobrealimentado. A diferença é que, em vez de dois turbos, Gregg optou por um supercharger Weiand no V8 LSx de 5,3 litros, que também recebeu novas bielas, virabrequim pistões e cabeçotes. A potência estimada é de mais de 600 cv, mas Gregg não pretende passar o carro no dinamômetro. Como já era o caso com o outro Firebird, ele acredita que números não traduzem o verdadeiro intento do projeto.

A intenção era fazer um carro puramente funcional, cru em estética, e sofisticado na mecânica. O lado de dentro reflete bem esta filosofia, fazendo uso de outros componentes reaproveitados – como o painel do Toyota Celica – aliados a uma boa dose de do-it-yourself, por exemplo, o túnel central e o assoalho fabricados sob medida. Os bancos são conchas fixos; os revestimentos de porta são inexistentes, bem como carpete e tapetes; e o único rádio que existe é um PX, usado para comunicação com outros carros da equipe.

O único luxo do carro é um sistema de ar-condicionado da Vintage Air, especializada em sistemas para carros antigos – algo de que Gregg fez questão, pois não há qualquer tipo de isolamento termoacústico e o motor, recuado em 45 cm para melhorar a distribuição de massas, invade o habitáculo e deixa a cabine inabitável no verão.

É um carro funcional, e Gregg o dirige sempre que pode – seja nas ruas ou em track days, onde os emblemas “GT-R” na carroceria sempre causam estranhamento e algumas risadas. Ficamos apenas imaginando o que este carro não deve tracionar nas saídas de curva. Os emblemas foram comprados pela Internet, sequer são autênticos, e quem os vê não imagina que, por baixo de toda aquela pátina, há algo bem mais sofisticado do que sugere a carroceria. Pode não ser um carro perfeito para todo mundo, mas é fruto de um grande conhecimento técnico e, talvez mais importante, do desejo de fazer um carro para si, e não para os outros. O resto é consequência.

Foto: Larry Chen/Hoonigan