Barn finds pode ser traduzido literalmente como “achados em celeiros”. O termo surgiu nos EUA, onde era comum que os donos de propriedades rurais guardassem seus carros nos celeiros, junto das máquinas agrícolas e ferramentas usadas para o trabalho no campo. Muitos destes carros acabavam guardados por muito tempo e só eram encontrados décadas depois — nem sempre em bom estado e, muitas vezes, sem rastro do dono original, mas invariavelmente valiosos.
Naturalmente, com o passar do tempo o termo passou a ser aplicado a qualquer carro (ou qualquer coleção) que tenha sido encontrado depois de muito tempo guardado — seja num celeiro, numa garagem ou em qualquer outro lugar. Alguns destes achados são tão impressionantes que acabam ficando famosos.
Nós mesmos temos algumas histórias incríveis de barn finds aqui no FlatOut. Decidimos não apenas relembrar alguns deles, mas também outros achados inacreditáveis que já aconteceram nos últimos anos. Não se preocupe: esta é só a primeira parte!
Uma Ferrari enterrada no quintal
Quando falamos que um barn find pode ser encontrado em qualquer lugar, não exageramos: em 1978, um bando de moleques estava escavando o quintal de uma casa à procura de tesouros quando toparam com isto:
Uma Ferrari Dino 246 1974 que, segundo consta, foi comprado por um encanador de Hollywood, que gastou todas as suas economias para dar o carro de presente à esposa. Não se sabe ao certo o que aconteceu com o carro para que ele fosse encontrado enterrado apenas quatro anos depois, mas há duas versões.
A primeira diz que o carro foi roubado por manobristas depois de ser usado muito pouco pela esposa do encanador — o hodômetro marcava só 800 km. A outra diz que o roubo foi armado pelo próprio dono, que não aguentou as despesas de ter uma Ferrari e decidiu dar um golpe na seguradora. Ele teria contratado uma quadrilha para levar o carro embora e jogá-lo no mar, mas os ladrões teriam achado que isto daria muito trabalho e decidiram enterrá-lo.
De qualquer forma, quem quer que tenha escondido a Ferrari debaixo da terra tinha a intenção de recuperá-la depois — o carro estava “vedado” com plásticos e toalhas nas entradas de ar. Não adiantou muito: a terra e a umidade acabaram danificando o carro de todo jeito.
Os pais dos garotos avisaram as autoridades, e a Ferrari foi devolvida à seguradora ainda em 1978. Semanas depois, um mecânico chamado Brad Howard a comprou e a restaurou. Ele está com o carro até hoje, e ainda o expõe em diversos eventos pelos EUA. Leia a história toda aqui!
Os Alfa Romeo do castelo na Bélgica
Em 2012, o fotógrafo britânico Tim Knifton fez uma visita a um castelo abandonado “em algum lugar da Bélgica”, onde encontrou algo que faria qualquer gearhead gritar como uma garotinha: uma coleção de Alfa Romeo dos anos 50, acompanhados de diversas peças sobressalentes. Então, em novembro daquele ano, ele publicou as fotos dos carros , com o título The Lost Alfas (“Os Alfa Perdidos”).
Ao total, seis carros foram encontrados por Knifton. Ele não sabia dizer quais eram os modelos, mas logo a internet encarregou-se de identificá-los: um Giulia SS Sprint Speciale 1600, um Giulietta SS Super Sprint 1300, dois Giulia 1600 Spider e um 1300 Sprint, todos fabricados entre 1961 e 1964.
As imagens correram o mundo, e logo os entusiastas queriam saber mais a respeito dos carros. Com o tempo, foram surgindo novas informações. Não se sabe até hoje como os carros foram parar ali, mas sabe-se que os últimos donos do castelo o abandonaram em 2005, por falta de recursos, com os carros lá dentro. Em junho de 2015, quase três anos depois de descobertos, os carros foram leiloados por uma agência holandesa chamada Lussis. Contamos a história toda neste post.
A Ferrari 250 GTO abandonada a céu aberto
Esta história é mais antiga, mas não é menos impressionante. Isto por que se trata de nada menos que uma Ferrari 250 GTO — seguramente, o modelo mais valioso de Maranello. Como você deve saber, existem diferentes versões da Ferrari 250, e a GTO é a mais lendária delas: apenas 39 exemplares do grand tourer com motor V12 de três litros e 300 cv foram feitas entre 1962 e 1964, e usadas nas ruas e em corridas. Por sua raridade e beleza, a 250 GTO não costuma ser vendida por menos de US$ 20 milhões (cerca de R$ 75 milhões) quando vai a leilão.
Sendo assim, como acreditar que uma 250 GTO ficou largada em um campo a céu aberto por 14 anos antes de ser notada? Pois foi exatamente o que aconteceu com o exemplar de chassi #3589, carro comprado no Reino Unido em 1962 e usado por dois anos em corridas — com destaque para um terceiro lugar nas 12 Horas de Sebring de 1963.
Depois de aposentado, o carro foi doado a uma escola no Texas, que a usava em desfiles e eventos. Sim, doada — carros de corrida usados eram quase descartáveis naqueles tempos. Em 1972, a escola decidiu que manter uma Ferrari de corrida rodando não era prioridade no orçamento e decidiu vendê-la a um homem chamado Joe Korton, que pagou US$ 6.500. Em dinheiro de hoje, são cerca de US$ 37 mil, ou R$ 140 mil.
Korton, aparentemente, era um comprador compulsivo de carros clássicos, mas não dava a mínima para eles: a 250 GTO ficou apodrecendo em sua propriedade por 14 anos, rodeada de outros carros antigos, e frequentemente era usada por seus filhos como escorregador. Pior: Korton se recusava a vender o carro, não importava o tamanho da oferta.
Foto: Peter Singhof
Por sorte, em 1986, um colecionador suíço chamado Frank Gallogly conseguiu comprar o carro, e ficou com ele por dois anos antes de vendê-lo a um conhecido. Este, por sua vez, decidiu restaurar o carro. No entanto, ao avaliar o estado da carroceria, ele percebeu que muitos painéis teriam de ser substituídos. Assim, acabou optando por construir uma carroceria nova. A original, que serviu de molde, foi perservada e continua em exposição na Suíça.
A lenda dos carros na fazenda em Portugal
Você já deve ter lido essa história aqui mesmo no FlatOut, mas não custa relembrar. De tempos em tempos, uma “notícia” sobre um americano que comprou uma fazenda em Portugal e, ao abrir um dos galpões da propriedade, deparou com um verdadeiro tesouro em forma de coleção de automóveis. Seriam carros roubados? Uma coleção abandonada por um milionário?
Acontece que não é nada disso: trata-se da coleção do português Antônio Ferreira de Almeida, que hoje tem 66 anos e começou a comprar seus carros em 1971 e, ao longo das décadas, acumulou mais de 400 exemplares, de dezenas de marcas e modelos diferentes, na esperança de vendê-los no futuro. Em 2007, o dono dos carros autorizou que fossem publicadas fotos de seu acervo no site de uma empresa especializada em carros antigos.
Incomodado com a exposição, Ferreira de Almeida voltou atrás pouco tempo depois, mas as fotos já haviam se espalhado. Sem conhecimento de sua origem, logo a comunidade da Internet tratou de criar sua própria versão dos fatos. Foi daí que surgiu a história do americano em Portugal, que é falsa.
A verdade é que os carros continuam na propriedade de Ferreira de Almeida, no vilarejo de Arrepiado, região de Santarém, portugal. Hoje em dia, no entanto, não são mais 400 carros, e sim 230 — você pode ver a lista . No fim das contas, o dono dos carros achou que as fotos o ajudariam a conseguir um dinheiro extra por alguns deles. Mesmo que a história já tenha sido esclarecida em 2009 pelo site Sports Car Market, de tempos em tempos as imagens ressurgem, acompanhadas da história falsa sobre elas.
O protótipo do Ford Mustang Boss 302
Esta, por outro lado, é uma história que contamos aqui há poucas semanas, mas certamente é digna de figurar nesta lista: imagine que você tem um protótipo de fábrica de uma versão lendária do Ford Mustang. Imagine que o carro está na sua garagem há décadas, e só depois de muito tempo você descobre o que tem nas mãos.
Em 1969, Larry Shinoda conseguiu um Ford Mustang novinho para realizar algumas modificações preliminares e definir como seria o visual do Mustang Boss 302, versão de homologação para uma versão de corrida da Trans-Am. O designer acabou usando o carro regularmente por algum tempo antes de vendê-lo e, desde então, nunca mais soube dele.
O americano John Grafelman comprou o carro em 1978 e, desde o início, sabia que se tratava de uma “edição especial”. No entanto, foi seu filho que, no início dos anos 2000, juntou evidências suficientes para descobrir que o carro não era um Boss 302 de produção, mas sim o protótipo feito pelo próprio Larry Shinoda. No entanto, diferentemente do que costuma acontecer com barn finds, Grafelman não pretente vender o carro, mas sim restaurá-lo e levá-lo para uma turnê pelos EUA. De preferência, rodando.
O DeLorean que parou no tempo por três décadas
Além de ser vermelho, o que por si só já o torna bem especial — todo DMC 12 saiu de fábrica com acabamento em aço escovado —, este DeLorean é uma verdadeira máquina do tempo. Não porque é capaz de ir para o passado ou para o futuro graças a um capacitor de fluxo, mas porque passou 31 anos esquecido em um galpão, coberto por uma capa, praticamente zero-quilômetro.
O carro foi comprado em 1982 por um americano que foi visitar uma concessionária com sua filha, que ficou encantada pelo DeLorean vermelho. Segundo consta, a fabricante de tintas DuPont teria pintado alguns exemplares novos do DeLorean para testar a reação do composto químico sobre o aço inoxidável (que tem propriedades diferentes do metal usado normalmente nos carros). Não há evidência de que a história seja real, e muito menos de que este seja um dos carros, mas o fato é que ele é vermelho desde zero quilômetro.
E ele rodou muito pouco: menos de 1600 km. Isto porque o homem sentia dores no joelho toda vez que entrava ou saía do carro, devido à abertura das portas asa-de-gaivota. Por isso, ele acabou encostando o carro em um galpão de sua fazenda entre 1983 e 2014, quando finalmente o anunciou no eBay e conseguiu vendê-lo.
O Ford GT40 abandonado no meio do entulho
O Ford GT 40 é simplesmente um dos carros de corrida mais lendários de todos os tempos. Não “apenas” por acabar com a hegemonia da Ferrari em Le Mans, vencendo quatro vezes seguidas entre 1966 e 1969, mas por ser muito bonito, muito potente e muito perigoso — como todo bom carro de corrida clássico deve ser. Incontáveis réplicas já foram fabricadas, o que só torna os exemplares autênticos que sobreviveram até hoje ainda mais valiosos.
Então dá para imaginar a sensação de encontrar um legítimo GT40 abandonado em um galpão, coberto por uma montanha de lixo e entulho, não é? Foi exatamente o que ocorreu com este carro em 2010.
Apesar de não ser vencedor de nenhuma corrida importante, o carro é simplesmente o mais raro GT40 que existe. Isto porque ele é o ultimo sobrevivente dos únicos três Mk1 que foram fabricados com a capa do motor do modelo seguinte, o Mk2. Ele também foi o último GT40 construído em 1966, o que o torna o último exemplar a usar um número de série da Ford. Todos os outros usam números de série da J.W. Automotive Engineering, do piloto John Wyer, que continuou usando os Mk1 mesmo depois que a Ford adotou o Mk2 para suas investidas no automobilismo.
O GT40 amarelo com capô preto foi pilotado por um cara chamado Salt Wather nos EUA, e em 1975 foi comprado por um bombeiro aposentado, que o usou nas pistas por dois anos. No entanto depois de um problema no motor e vários outros de saúde, o bombeiro encostou o carro e acabou nunca mais mexendo nele.
O carro foi encontrado em 2010 por um cara chamado Tom Shaughnessy, que conseguiu convencer o dono a vendê-lo depois de alguns anos insistindo. Ele não revelou o valor pago — só disse que foi “muito caro”. Faz sentido.