Se te perguntarem qual automóvel é a cara dos Estados Unidos, é provável que você responda algo como Chevrolet Corvette ou Dodge Viper. Se for um cara mais old school, talvez cite o Ford Mustang ou até mesmo algo mais antigo, como o Chevrolet Bel Air. Agora, saindo do espectro dos carros e englobando os utilitários, um candidato extremamente apto a este cargo é o Hummer H1, sem sombra de dúvida. Afinal, o que pode ser mais americano do que um SUV criado para defender os Estados Unidos da América no campo de batalha?
O Hummer H1 é a versão civil do HMMWV – sigla para High Mobility Multipurpose Wheeled Vehicle, que pode ser traduzido livremente como “Veículo com Rodas Multiuso de Alta Mobilidade”. Mas pode chamar de Humvee. Com 4,7 metros de comprimento, 2,2 metros de largura e mais de três toneladas, o Humvee foi concebido para transportar soldados por terrenos aparentemente intransponíveis, não quebrar nunca, e ainda aguentar munição pesada em algumas versões. O modelo de rua tem linhas bastante fiéis às do veículo militar, usando também o mesmo conjunto mecânico e mantendo praticamente a mesma capacidade off road. E, mesmo sendo mais leve que o Humvee, ainda pesa pelo menos 2.700 kg, passando facilmente dos 3.000 kg dependendo dos equipamentos.
Os norte-americanos, com suas rodovias largas e cheias de retões, suas garagens a céu aberto na frente de casa e suas enormes vagas de estacionamento, adoram o Hummer H1. Ele foi vendido entre 1992 e 2006 e fez relativo sucesso nos Estados Unidos. E, justiça seja feita: muitos americanos realmente usam seus Hummer para curtir trilhas pesadas.
Agora, você consegue imaginar um veículo destes fazendo sucesso no Japão, a terra dos kei cars? Nem a gente. E é por isso que não conseguimos entender como a Toyota achou uma boa ideia criar um “clone” do Hummer H1 para vender em sua própria casa. O resultado foi o Mega Cruiser, e ele era um veículo bem curioso.
Começando pelo nome: Mega Cruiser, referência ao icônico Land Cruiser – algo tão óbvio que chega a ser engraçado. “Ele é como um Land Cruiser, oras, só que mega“, imaginamos os japoneses responsáveis por batizar o veículo explicando a escolha.
Tal qual o Hummer H1, o Toyota Mega Cruiser também surgiu com o intuito de servir às forças armadas japonesas. A versão militar se chamava Toyota BXD 10 e, olhando de relance, pode ser facilmente confundida com um Humvee. Duvida? Então olha só:
Fora a grade dianteira, que traz a identidade visual dos SUVs clássicos da Toyota (Bandeirante, estamos falando com você), as linhas da carroceria são parecidíssimas, tal como as dimensões. Na verdade, o Mega Cruiser é um pouco mais longo: enquanto a largura era a mesma, o Toyota tinha quase 42 cm a mais de comprimento, chegando aos 5,09 metros, e 10 cm a mais no entre-eixos, chegando a 3,4 metros. O Mega Cruiser pesa, em sua versão civil (codinome BXD 20), 2.901 kg, enquanto a versão militar passa dos 3.000 kg . Com 40 cm de vão livre do solo, conseguidos com o emprego de componentes semelhantes aos do Humvee na suspensão, ele também é capaz de transpor corpos d’água de mais de um metro de profundidade.
A Toyota dizia que o Mega Cruiser tinha “capacidade impressionante de atuar em condições árduas, como trabalhos de salvamento durante desastres naturais”. E todos sabemos que o Japão é um arquipélago propenso a passar por este tipo de situação. Não demorou para que as forças de defesa japonesas (Japanese Self-Defense Forces, ou JSDF) ficassem interessadas, e o Mega Cruiser BDX 10 passou a ser usado para transportar soldados e armamento pesado por terrenos difíceis. A Toyota nunca jogou o Mega Cruiser de um helicóptero a cinco metros de altura para demonstrar a capacidade de sua suspensão, como o Humvee fez na Guerra do Golfo (por necessidade, e não por publicidade), ma não duvidamos que ele fosse capaz.
Fora dos Estados Unidos o Mega Cruiser tem seus fãs, que exaltam principalmente o motor quatro-cilindros turbodiesel de nada menos que 4,1 litros para entregar 155 cv a 3.200 rpm e 38,5 mkgf de torque a 1.800 rpm, acoplado a uma caixa automática de quatro marcha que levava a força para as quatro rodas através de três diferenciais – todos eles com autoblocante. De acordo com a fabricante, o rendimeto do motor turbodiesel era de mais de 10 km/L de combustível a uma velocidade constante de 60 km/h. Nada mau.
Agora, os japoneses não iriam fazer seu próprio Humvee se não fosse para melhorar algumas coisas: segundo um teste realizado pela revista alemã Autobild, o Mega Cruiser de rua era muito mais silencioso que o Hummer H1 – que tem fama de ser tão barulhento que é impossível conversar dentro dele.
Além disso, o diâmetro de giro do Hummer era de 16,2 metros, enquanto o Mega Cruiser só precisa de 11,2 metros para dar uma volta completa – em parte, graças ao esterçamento automático das rodas traseiras.
Outro detalhe bacana: em vez de eixos rígidos, como era de se supor, o Mega Cruiser usava braços triangulares sobrepostos reforçados nas quatro rodas. Era uma garantia de conforto extra a vítimas de acidentes e desastres que estivessem sendo transportadas dentro dele. E ainda proporcionava comportamento dinâmico bem mais estável no asfalto.
Os discos de freio ficavam junto dos diferenciais dianteiro e traseiro em vez de abrigados pelas rodas, o que reduzia a massa não-suspensa e também melhorava a eficiência de desaceleração ao enfrentar menos inércia do que em um arranjo convencional. E havia um sistema opcional de controle da pressão dos pneus: era possível alternar entre a 29 psi, a pressão normal, e 14,5 psi para andar na areia.
Com tudo isto, ainda era preciso estar com muita vontade de ter um SUV japonês gigante para comprar um Mega Cruiser. Isto porque o governo japonês prioriza veículos pequenos e econômicos na hora de definir as taxas a serem cobradas dos proprietários: quanto menos espaço se ocupa e menos combustível se consome, menos impostos se paga.
Repare na posição curiosa do rádio toca-fitas: do lado do motorista, no console central
Assim, além do preço elevado na hora da compra – 9,62 milhões de ienes, o que dava cerca de US$ 90 mil) – ainda era preciso levar em consideração o extra cobrado só para rodar com o Mega Cruiser nas ruas. E todo o sofrimento na hora de encontrar uma vaga ou garagem grande o suficiente.
A Toyota jamais disse quantos exemplares para uso civil foram fabricados entre 1995 e 2002, mas os exemplares que aparecem à venda de vez em quando geralmente custam perto do que valiam quando novos.
Agora, enquanto isso, na Rússia…