Eu estava automobilisticamente bem servido em meados de 2011. Tinha uma moto legal (uma Kawasaki Ninja 250 – ok, nada do outro planeta, mas como iniciante no mundo das motos, achava aquela mini-esportiva, vermelha e com uns toques pessoais, motivo de orgulho) e na condição de jornalista automotivo trocava de carro frequentemente. Numa semana me esbaldava de Audi RS 5, na outra tentava entender o por quê de alguém se submeter à convivência com um Celta todos os dias – e as duas situações me deixavam e ainda deixam feliz.
Até que num belo dia, após uma coletiva de imprensa num determinado hotel em São Paulo, o manobrista sai da garagem com algo que eu não via há muito tempo: um Omega em perfeito estado. E quem entra na caranga? Uma das minhas referências – a maior, certamente – no jornalismo automotivo. Me aproximo, dou uma olhada em volta, espio por dentro e imediatamente me apaixono. Por tudo: pela cor, pelos acabamento em madeira nas portas intactos, por aquele painel gigante, pelos botões nada discretos para os padrões de hoje, pelos bancos…
Faço algumas perguntas sobre a convivência com o carro, motor, equipamentos e o encanto vai crescendo com alguns detalhes talvez fúteis para quem não gosta de carros, mas pitorescos para quem os aprecia: ”este é um dos últimos produzidos, ainda em 1998, antes da chegada do australiano”, me conta o Fernando. Sim, é quase uma raridade. Até a decepção pela falta de ABS e airbag (“no fim de carreira, a GM depenou ou Omega e tirou alguns equipamentos”) logo é esquecida.
Bom, no fim das contas descubro que o Fernando estava, naquele exato momento, indo entregar o Omega. ”Estou sem tempo de cuidar do carro como ele merece e precisa. Fui medir o óleo outro dia e a agulha quebrou na minha mão. Aí foi a gota d’água”. E quem era o comprador? Um amigo em comum, veja só como a vida é bela. Na hora, liguei pro Ulisses e dei parabéns. E, óbvio, disse que se ele fosse vender o carro um dia – o que eu consideraria uma loucura – eu era o primeiro da fila. Ele não sabe, mas eu não tinha um tostão furado quando disse aquilo…
Alguns meses depois ele me liga, dizendo que teria que vender o Omega e perguntando se eu ainda tinha interesse. Continuava sem dinheiro pra comprar uma mobilete sequer, mas arrematei o Omega, claro.
Separação, rodas e mecânicos
Vou buscá-lo no trampo do Ulisses e já deparo com o primeiro desafio em mantê-lo original: no processo de restauração das rodas, a Saveiro que as levava para o conserto foi roubada. Com elas dentro, obviamente.
Andar de Omega com calota de Zafira não foi agradável. Para deixar a peregrinação atrás das rodas originais ainda mais difícil, descobri que pouca gente foi informada de que em 1998 a versão CD ganhou rodas exclusivas, e as que equipavam o Omega topo de linha até 1997 foram parar no GLS. Fui a inúmeras lojas após os cabras do outro lado da linha confirmarem que tinham as do GLS 1998… para chegar lá e descobrir que as rodas de fato eram de GLS, mas de 1997 pra trás. Portanto, aquele panfleto publicitário que eu peguei no Salão do Automóvel de 1998 serve muito bem, até hoje, pra esfregar na cara dos manolos “entendidos” que ousam dizer que as rodas do meu carro não são originais. Ando com ele no porta-luvas, just in case.
Rodas, enfim, encontradas e devidamente instaladas. Hora de desfilar, certo? Não. Nessa época eu estava semi-noivo e com prestação de apartamento pra pagar, me endividei. Dei um pulo maior que a perna, confesso. Ela me exigiu que um dos dois fossem embora, e com muita dor no coração vendi a Ninja. E o projeto de deixar o Omega o mais impecável possível foi suspenso. Encostei o carro na casa do meu pai e lá ele ficou.
Relacionamento desfeito, meu dinheiro só pra mim de novo e seis meses depois tiro a capa sobre o Omega e encontro um carro com pneus e bateria arriados, obviamente.
A partir daí, meu amigos, começou a aventura de manter um carro de 15 anos saudável como um zero km. Embora tenha hoje 73.452 km, algumas peças colapsaram seja por uso, seja pelo tempo de vida. Não pensem vocês que deixar um carro totalmente original, com seu 2.2 8V de modestos 116 cv e 20,1 kgfm de torque, é muito mais fácil ou barato que um projeto de aumentar performance. Só de peças – que vão de coxins do motor e câmbio, jogo de velas e mangueira de refrigeração a bandejas de suspensão, kit de embreagem e pneus – já foram mais de R$ 10 mil. Fora a tensão de não achar determinadas peças. Nos próximos posts vou detalhar alguns destes episódios para matar a curiosidade de quem sonha com um Omega.
Uma das vezes em que ele foi de guincho. Instantes depois, Doc Brown apareceria testando seu DeLorean
Não nego que de vez em quando bate a tentação de ocupar a sua vaga com um carro mais forte e novo, tipo um Civic Si. Mas tenho (acho que todos aqui temos) a mania tola de cultivar amor pelos nossos carros. E o que compensa essa aventura? Bom, há alguns motivos de orgulho, como o visual, o prazer de guiar um carro muito confortável, a sensação de ter um exemplar relativamente raro e – talvez a principal – ser dono do melhor e mais avançado, ao menos na sua época, automóvel fabricado no Brasil.
Por Rodrigo Mora, Project Cars #18