Se você acha que as ruas e rodovias em péssimo estado são exclusividade brasileira, saiba que infelizmente não estamos sozinhos nessa penúria. Os americanos também estão de saco cheio de rodar sobre asfalto pós-apocalíptico, e eles até aprovariam pagar mais impostos para resolver a situação.
O fato foi descoberto recentemente por , que revelou que 52 % dos americanos aceitariam pagar mais impostos sobre o combustível para ter rodovias, pontes e sistemas de trânsito melhores. Nos EUA há uma taxa na composição do preço do combustível destinada ao Highway Trust Fund (algo semelhante ao nosso CIDE Combustíveis), que é o orçamento público para investimentos na conservação da infra-estrutura viária.
Atualmente, em cada galão de gasolina abastecido (3,78 litros) os americanos pagam US$ 0,183 (R$ 0,41 ou R$ 0,10 por litro) para o fundo e a alíquota está congelada desde 1993, quando os carros eram bem mais beberrões — especialmente tratando-se dos EUA — e as obras custavam menos em relação à arrecadação.
A aceitação de um eventual aumento de impostos tem uma motivação racional: é melhor pagar impostos e ter estradas boas do que gastar dinheiro reparando o carro. Segundo o próprio relatório da AAA o americano gasta em média US$ 324 ( R$ 735) por ano em reparos de danos causados pelas más condições das rodovias — quantia equivalente à taxa de 1.770 galões de gasolina.
No Brasil, embora muita gente pense que o IPVA é o imposto destinado a essa finalidade, ele não tem destinação vinculada a um fim específico. Diferentemente do IPTU, que é um imposto análogo e geralmente usado para conservação e manutenção da infraestrutura urbana, a arrecadação do IPVA pode ser usada para consertar estradas e rodovias, mas também pode ser usada para quaisquer outras despesas públicas.
Atualmente, o único tributo pago pelos proprietários de veículos automotores que tem a arrecadação vinculada à conservação e manutenção da infra-estrutura viária é a Cide Combustíveis, que atualmente está zerada desde 2012 para conter o aumento dos combustíveis e, consequentemente, a inflação.
Nos últimos 11 anos, a alíquota já foi reduzida de R$ 0,50 por litro de gasolina para R$ 0,091 antes de ser zerada. A arrecadação estimada seria de R$ 420 milhões mensais, dos quais 71% iriam para o orçamento da União, e os outros 29% seriam distribuídos entre os estados e o Distrito Federal, em cotas proporcionais à extensão da malha viária, ao consumo de combustíveis e ao número de habitantes.
A solução proposta pelos americanos é interessante, e poderia ser aplicada com eficácia ao Brasil se não fossem alguns empecilhos. Nos EUA, por exemplo o sistema tributário é mais enxuta e eficiente, e é US$ 3,36 o galão (cerca de US$ 0,88 ou R$ 1,99 o litro).
Uma solução semelhante poderia ser adotada no Brasil, mas nas condições atuais o simples retorno da Cide já faria o preço do litro da gasolina subir 5,3%, passando dos R$ 3,10 em média, e isso não seria garantia de qualidade da infra-estrutura, pois a taxa pode ser destinada a programas ambientais e também a subsídios à compra de combustíveis. Esta última parte é especialmente agravante, pois atualmente a cobrança da Cide não supriria as perdas da Petrobras com o subsídio dos combustíveis, quanto mais para destinar recursos à manutenção de rodovias.
Além disso, o próprio IPVA aliado ao licenciamento anual e ao seguro obrigatório tornam o custo de manter um carro já razoavelmente elevado no Brasil. Nos EUA paga-se uma única licença anual, que varia de acordo com a região onde o veículo é registrado, e pode ser baseada no valor do carro (como o IPVA), no porte do carro, na quilometragem rodada por ele ou no índice de emissões.
Também faltam incentivos à produção e à compra de carros mais eficientes por aqui. Carros elétricos ainda não têm descontos e isenções tributárias, e carros mais eficientes e/ou menos poluentes não recebem benefícios.
Outro problema, bem mais sério, é a influência do preço dos combustíveis no preço dos bens de consumo em geral, uma vez que boa parte do transporte de cargas é feito por rodovias. E assim fica claro que a ausência de um planejamento de longo prazo — tanto para a questão do preço dos combustíveis quanto da manutenção das ruas e rodovias — nos deixa diante de um problema difícil de solucionar. Você aceitaria pagar a gasolina mais cara para ter rodovias melhores?