Há bastante tempo fizemos aqui no FlatOut uma lista (em duas partes, 1 e 2) com carros diferentes que tinham o mesmo nom. Como o Ford Maverick, que nos EUA e Brasil era um cupê de tração traseira e, na Europa, era um SUV da Nissan rebatizado e com os emblemas da Ford.
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Hoje vamos resgatar este tema, mas com um twist inóspito: vamos falar sobre carros que dividem o nome, mas são de fabricantes (e, muitas vezes, épocas e segmentos) diferentes. Alguns exemplos são bem conhecidos, mas outros acabaram meio que caindo no esquecimento, por várias razões.
Continental
O primeiro nome da lista é um dos mais notáveis: Continental – uma palavra que exala luxo só de ler. Mas… Bentley Continental ou Lincoln Continental?
O senso comum diz que o Lincoln veio primeiro – ele foi lançado em 1939 e, de lá para cá, teve dez gerações. O Lincoln Continental foi introduzido depois que Edsel Ford encomendou um carro para uso pessoal à Lincoln. Inspirados pelo filho do chefe, os projetistas da Lincoln imaginaram um carro de luxo com elementos europeus – como o estepe montado na tampa do porta-malas, que acabou ficando conhecido como “pneu Continental” (Continental tire, em inglês). Uma teoria, aliás, diz que o próprio nome Continental entrega a influência europeia no design do carro – no caso, em referência à porção continental da Europa.
O mesmo senso comum afirma que o Bentley Continental veio depois – e, de fato a fabricante britânica começou a vender seu Continental em 1952, 13 anos depois do Lincoln. O Continental da Bentley era uma versão especial de seu R-Type. Era um carro com pegada mais esportiva, e o título de automóvel de quatro lugares mais veloz do planeta graças ao seu motor seis-em-linha de 130 cv que o levava até os 190 km/h. Ele usava uma carroceria mais leve e tanto seu desenvolvimento quanto sua fabricação eram supervisionados pela Rolls-Royce – que, naquela época, era dona da Bentley.
Acontece que, plot twist: a Rolls-Royce já havia utilizado o nome continental antes – desde 1934, quando o Rolls-Royce Phanton tinha uma série especial chamada Continental. O Rolls-Royce Continental tinha câmbio mais longo, mais adequado para atingir velocidades maiores nas autoestradas da Europa continental, que não existiam no Reino Unido.
Ironicamente, a última geração do Lincoln Continental, lançada em 2017, foi muito comparada em estilo aos Bentley. A intenção da Lincoln era afastar o novo Continental do modelo de nona geração, que no fundo era pouco mais que um Ford Taurus com acabamento mais luxuoso.
Sierra
Para os entusiastas, o nome Ford Sierra remete imediatamente ao carro europeu de tração traseira ou integral que fez sucesso nas provas de turismo e um pouco menos de sucesso nos ralis. Sua versão RS Cosworth é nada menos que mítica – e originou o também mítico Escort RS Cosworth. O Ford Sierra foi lançado em 1982 e, apesar do início das vendas ter sido prejudicado pelo visual controverso, seu bom desempenho no automobilismo e as consecutivas reestilizações o ajudaram a ficar em produção até 1993.
Quando se trata da GMC Sierra, porém, estamos falando da versão da GMC para a Chevrolet C/K de quarta geração, lançada em 1988. As três primeiras gerações se chamavam GMC C/K. Quando a Chevrolet Silverado foi lançada nos EUA, em 1999, sua equivalente da GMC manteve o nome Sierra.
Vale mencionar que o nome Sierra já era usado pela GMC. No caso, desde a década de 1970, quando as versões mais caras e melhor equipadas do GMC Suburban recebiam o sobrenome Sierra.
Suburban
Falando em Suburban, o SUV da Chevrolet também divide seu nome com outro carro. O GM veio primeiro – en 1935, a Chevrolet começou a fabricar o Carryall Suburban, furgão com chassi de picape que, como o nome dizia, deveria “carregar tudo” (carry all, em inglês) – uma família de quatro pessoas e toda a sua bagagem, sem aperto. O conceito permaneceu praticamente inalterado de lá para cá, com exceção de que o Chevrolet Suburban atual tem espaço para sete pessoas e toda a sua bagagem. E também oferece muitos itens de conforto e conveniência, enquanto o primeiro Suburban tinha a proposta de ser básico e barato.
O Plymouth Suburban, lançado em 1949, não era tão diferente. Ele também oferecia bastante espaço interno para uma família e toda sua tralha, mas era uma perua feita sobre um chassi de carro – e não sobre uma picape. Mais do que isto: foi o primeiro Plymouth deste tipo a ter a carroceria feita toda em metal. Antes dele, a fabricante só tinha opções com madeira na carroceria (as conhecidas woodies).
GTO
Este é possivelmente o caso mais famoso da lista. Ao menos três carros diferentes e icônicos têm o mesmo nome: GTO. E o significado também é o mesmo Gran Turismo Omologato – um carro de competição homologado (e modificado) para rodar nas ruas.
O primeiro carro a usar este nome foi a Ferrari 250 GTO, que teve pouco mais de 30 unidades produzidas entre 1962 e 1964. Ela era, de fato, um carro de competição que podia rodar nas ruas – tinha carroceria de alumínio, interior aliviado e um V12 de três litros debaixo do capô.
O Pontiac GTO foi lançado, coincidentemente, em 1964 – graças à visão e à insistência de John DeLorean, que muito antes do escândalo do DMC-12 era engenheiro na Pontiac. Ele conseguiu convencer a cúpula da fabricante que colocar o maior motor da linha em seu menor carro não era uma ideia absurda. E não era mesmo: era genial.
DeLorean assumia inspiração para o nome GTO era a Ferrari 250 GTO – ele gostava da ideia de associar o carro às corridas de turismo na Europa, mesmo que na prática o muscle car tenha se tornado um mito nas arrancadas. E GM não teve problemas com a Ferrari ao registrar o nome, simplesmente porque GTO é uma marca registrada da FIA, e não da Ferrari.
Em 1990 a Mitsubishi lançou seu GTO – o nome que o lendário 3000GT tinha no Japão, e só não foi utilizado na Europa e nos EUA porque a consultoria da fabricante achou que os clientes mais detalhistas fossem implicar com o nome GTO, tão bem representado pela Ferrari e pela Pontiac, em um carro japonês. Que falta de auto-estima, não?
E mais: o nome GTO já havia sido usado pela Mitsubishi em 1970, quando a marca lançou uma versão do Galant (que há 50 anos era um cupê compacto de tração traseira) chamada Galant GTO. E a inspiração assumida também foi na Ferrari 250 GTO.
Lancer
O Mitsubishi Lancer é um carro absolutamente lendário graças a sua história no WRC. O especial de homologação Lancer Evolution teve dez gerações fabricadas entre 1992 e 2016 e deu origem a uma rica cena de tuning e preparação. Mas o nome Mitsubishi Lancer foi usado pela primeira vez lá em 1973, e ele nasceu como um mero intermediário entre a linha de kei cars da Mitsubishi e o Galant.
O nome Lancer, porém, não foi exclusividade da Mitsubishi – que sequer foi a primeira a utilizá-lo: já em 1955 a Dodge colocou o sobrenome Lancer nas versões cupê de seus modelos Coronet e Royal, prática que foi mantida até 1959.
O primeiro carro chamado batizado apenas Dodge Lancer veio pouco depois, em 1961 – uma versão rebatizada do Plymouth Valiant, com acabamento mais sofisticado e preço mais alto. Não durou muito tempo: no fim de 1962 o Dodge Lancer passou a se chamar Dodge Dart.
Mas não foi a última vez que existiu um Dodge Lancer: em 1985 o nome foi trazido de volta para uma versão rebatizada do Chrysler LeBaron GTS – um hatchback de quatro portas com tração dianteira que até teve uma versão da Shelby com motor turbo de 175 cv e barras estabilizadoras mais grossas, mas definitivamente não é lembrado como o Lancer da Mitsubishi.
Sebring
Entre os exemplos mais obscuros desta lista está a dupla de Sebring – um Maserati e o outro da Chrysler. O primeiro foi um cupê lançado em 1962, feito especificamente para o mercado norte-americano sobre a base do Maserati 3500GT – o conjunto mecânico era exatamente o mesmo, composto por um seis-em-linha de 3,5 litros e 235 cv mais um câmbio manual de cinco marchas (um BorgWarner automático de três marchas era opcional). A carroceria, porém, era completamente diferente, com um design mais americanizado feito sob medida pela Carrozzeria Vignale.
Seu nome era inspirado na dobradinha da Maserati nas 12 Horas de Sebring de 1957, com Juan Manuel Fangio e Stirling Moss nas duas primeiras posições. Foram feitas 593 unidades, todas de forma artesanal, entre 1962 e 1969.
O Chrysler Sebring também foi batizado em referência às 12 Horas de Sebring, mas não em homenagem a uma corrida em específico, e sim ao circuito na Flórida. Mas, diferentemente do que acontece com o Maserati, o nome Chrysler Sebring não se refere a um único carro: diferentes modelos usaram este nome entre 1995 e 2010, entre cupês, sedãs e conversíveis. O primeiro deles, aliás, era uma versão de duas portas, cupê ou conversível, do carro que conhecemos no Brasil como Chrysler Stratus.
500
Esta é uma exceção por conta da grafia distinta: Fiat 500 e Ford Five Hundred – assim mesmo, por extenso. O primeiro é sem dúvida o carro mais conhecido: trata-se do popular subcompacto que a Fiat lançou inicialmente em 1936 – o famoso “Topolino”, que era um dos menores carros do mundo na época.
Este foi fabricado até 1955 e, dois anos depois, veio o “Nuova 500”, que é considerado o mais clássico dos 500. Lançado em 1957, ele provou-se extremamente popular por seu design simpático, pelo baixo preço e pela frugalidade na hora de consumir combustível. Anos mais tarde, virou artigo vintage de boutique, e sua fama levou a Fiat a colocar no mercado, em 2007, o atual 500.
O Ford Five Hundred, por sua vez, foi um carro de vida bem curta. Lançado em 2004, ele tinha a pretensão de substituir o Ford Taurus de quarta geração (aquele que era todo oval e é razoavelmente conhecido no Brasil). A inspiração para seu nome eram os clássicos Galaxie 500 e Fairlane 500, vendidos entre as décadas de 1950 e 1970.
Embora tenha sido bem recebido pelo público, o Ford Five Hundred mudou de nome quando foi reestilizado em 2007 – a pedido de Alan Mulally, CEO da Ford na época, o sedã voltou a se chamar Ford Taurus.
Century
Encerrando esta lista temos o Buick Century e o Toyota Century. O primeiro foi um ícone norte-americano por décadas – lançado em 1936, ele foi um dos primeiros modelos da Buick a ultrapassar as 100 mph (160 km/h), e por isto recebeu o nome Century. Ele teve seis gerações ao longo dos anos, em diferentes segmentos, sendo que a última delas – vendida entre 1997 e 2005 – compartilhava sua plataforma com o Chevrolet Impala da mesma época.
Já o Toyota Century é o mais caro e luxuoso de todos os Toyota. Lançado em 1967, ele foi batizado em homenagem ao centenário de Sakichi Toyoda, que nasceu em 1867 e foi o fundador da Toyota Industries. A proposta do carro era simples: oferecer aos mais ricos da sociedade japonesa – incluindo o presidente e o imperador – um sedã de luxo fabricado localmente que não devesse nada às ofertas estrangeiras, como Rolls-Royce, Bentley ou Mercedes-Benz Pullman.
O Century só teve três gerações: a primeira, produzida entre 1967 e 1997; a segunda, que durou até 2017, e a atual. A segunda geração foi, por muito tempo, o único Toyota com motor V12.